A ignorância da leie os ignorantes!...

OPINIÃO15.02.202305:30

A decisão do caso Paulinho não é apenas uma decisão inatacável à luz do direito administrativo. É uma decisão em consonância com o Estado de Direito em que vivemos

N ÃO sou eu que o digo, mas o artigo sexto do Código Civil: «A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.» Porém, a ignorância por parte de pessoas menos cultas e esclarecidas, tal ignorância pode ser compreensível e servir até de atenuante. De resto, hoje em dia, mesmo os mais letrados, e até juristas, não serão capazes de alegar que conhecem todas as leis e que não cometem, efectivamente, erros por desconhecimento da lei.

O que não é admissível é a ignorância determinada por mandriice ou conveniência de objectivos, em qualquer caso, um comportamento intelectualmente não sério.

Posso aceitar que comentadores pagos para dizer baboseiras, que dão audiência, façam gala dessa ignorância só para atacar o parceiro e dizer que o seu clube é mais ético que o outro. Não admito que jornalistas queiram entrar nesse saco. 

O jornalista tem o dever de informar e não de desinformar. E para dar cumprimento a esse dever tem a estrita obrigação moral de se informar, de averiguar, de estudar a matéria e não de dizer coisas erradas e sem sentido ético. E, se assim não actuar, não tem autoridade moral para falar em comportamento ético ou da falta dele, e falar do que não sabe para concluir sobre a justiça sem justiça, que pode ser um título apelativo, mas que é vazio de argumento racional.

Não: a decisão do caso Paulinho não é apenas uma decisão inatacável à luz do direito administrativo. É uma decisão em consonância com o Estado de Direito em que, pelo menos, teoricamente, vivemos, como tanto gostam de dizer certos jornalistas, mas apenas quando lhes convém. Aberração será falar do que se não sabe ou não se percebe, e maior aberração ainda será dizer que Estado de Direito não deve interferir nas especificidades do desporto de alta competição. No desporto de alta competição, como em qualquer outro sector da sociedade, o direito de se defender antes de ser punido, é um princípio geral de um Estado de Direito próprio de um país civilizado.

O respeito pelo exercício do contraditório e dos prazos para o exercício do mesmo é fundamental numa sociedade civilizada. No caso Palhinha não se respeitou o contraditório e alteraram o regulamento estabelecendo-se prazos para o exercer; no caso Paulinho não se respeitou o prazo para o seu exercício. Deu-se com uma mão e tirou-se com a outra, e há quem ache que quem reaja a isto não tem um comportamento ético ou usa de um subterfúgio. Que se ignorem as leis é compreensível, como se disse; que se ignore o que é a ética é inaceitável.

Por isso, termino com um convite: leiam os dois acórdãos e vejam que não é preciso sequer ser estudante de direito para perceber que os casos são diferentes e decididos com fundamentos diferentes. E, no fim, espero que tenham a humildade de pedir desculpa, porque a maior falta de ética é faltar à verdade!
 

Paulinho pôde jogar o clássico depois de o Sporting ter recorrido aos tribunais


O VENTO QUE PASSA 

Aminha primeira nota é de saudade de um tempo que não volta: fará amanhã oito dias que me foi dado assistir a uma homenagem a Adriano Correia de Oliveira, que me marcou profundamente na minha juventude universitária e que ainda hoje recordo quando exprimo a minha opinião oralmente ou por escrito. Lembro-me sempre daquela tarde de convívio na Faculdade de Direito de Lisboa com cânticos dele e do Zeca Afonso, que permanece na minha memória visual, tal a influência que teve para o resto da minha vida, além de emoção que me assalta sempre que ouço aquela extraordinária bandeira de liberdade que é a ‘Trova do vento que passa’, da autoria de Manuel Alegre, interpretada pelo Adriano Correia de Oliveira.

Com efeito, aquela estrofe final - «mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não» - tem-me servido de guia de vida desde então e não encontro motivo nenhum para me desviar, mesmo que hoje se viva em novo tempo de servidão ou um tempo novo de servidão, onde a liberdade de opinião é posta em causa pela necessidade de sobreviver!...

Tenho convivido bem com a liberdade de pensamento e expressão do mesmo, pese alguma incompreensão pela minha frontalidade e sinceridade, que algumas vezes me trazem dissabores. Os últimos tempos têm sido difíceis pela contradição que existe entre liberdade de opinião e a inconveniência social, que, algumas vezes, protege determinados valores, para mim também essenciais.

Poderia, como muitos fazem, andar pelas redes sociais, escondido no anonimato, para não assumir a responsabilidade do que digo ou do que faço. Nunca consegui fazê-lo e não será agora, nesta idade, que vou mudar! Prefiro a luz do dia, com a minha cara e a minha assinatura. É por isso que, em breves momentos de desânimo, logo trauteio com a minha voz de cana rachada, mas firme: há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não!
 

UM MARCO NA MINHA HISTÓRIA DE VIDA

AGORA, a minha simples, mas sincera homenagem -  e já com enorme saudade - vai para um Amigo falecido no Domingo passado que marcou profundamente a minha vida dos últimos vinte e cinco anos: MANUEL ROCHA.

Manuel Rocha foi um príncipe da comunicação social, cuja história fica profundamente ligada à história da Radiotelevisão Portuguesa e, designadamente, ao projecto do Canal Memória, justamente o que vai faltando a muita gente, não tanto por deficiência física, mas antes por deficiência mental, que não concebe que se recorde o passado como forma de construir o futuro.

Manuel Rocha foi, de 1994 a 1996, Director de Informação da RTP e, um dia, convidou para jantar, num Hotel de Lisboa, a mim, ao Fernando Seara e ao Guilherme Aguiar para nos expor o seu projecto de um programa de imagens, entrevista e debate, com três representantes (escolhidos por ele) dos três grandes clubes, Sporting, Benfica e Porto. Assim nasceu o Jogo Falado, primeiro gravado na RTP 2 e, mais tarde, em directo, na RTP 1 -  programa pioneiro no género e que causou grande impacto e audiência elevada, passe a imodéstia...

Esse programa veio a ser replicado na SIC Notícias, em 2003, com o nome de Dia Seguinte, mas com os mesmos intervenientes, e onde me mantive durante dez anos (Abril de 2013).

Eu não conhecia Manuel Rocha, se não de nome, e, pelo que acima  disse, tornou-me numa figura da televisão, para o bem e para o mal. Devo, pois, ao Manuel Rocha a notoriedade que ganhei no espaço público durante estes anos. Em paralelo cresceu uma grande amizade entre ele e sua mulher, Fátima Campos Ferreira, a minha mulher e eu. E tudo correu sempre bem,  mesmo com as provocações afectivas entre um portista e um sportinguista.

Mas Manuel Rocha não ficaria por aqui e, em 2008/2009, lança-me um desafio para ser Presidente do Special Olympics Portugal, braço do Special Olympics Internacional -  organização internacional, com origem nos Estados Unidos, criada para apoiar as pessoas com deficiências intelectuais, e desenvolver a sua autoconfiança, capacidades de relacionamento interpessoal e sentido de realização, através da prática de diversas modalidades desportivas.

Aceitei o convite, o que surpreendeu muita gente, mas, como disse várias vezes, era altura de apoiar os deficientes intelectuais farto que estava dos intelectuais cheios de deficiências!...

Foram dez anos gratificantes no apoio a esses jovens e menos jovens, carentes de um simples gesto de afecto ou de uma palavra de incentivo. Aprendi muito e tornei-me, pelo menos na minha apreciação, um homem melhor, que passou a relativizar certas contrariedades da vida.

Foi com o coração cheio de gratidão que me despedi ontem do Manuel Rocha, como o fizeram muitas e muitas pessoas, que quiseram estar com a família e com a minha querida Amiga Fátima de Campos Ferreira, uma grande jornalista, sua companheira e primeira admiradora.

O Bispo Auxiliar de Lisboa chamou-nos a atenção que a chave para entrar lá em cima será poder responder à pergunta sobre que fizemos na terra pelos outros? Manuel Rocha: por mim podes responder que marcaste uma parte de minha vida nestes últimos vinte e cinco anos, e que te estou muito grato por isso. A Fátima testemunhará isso até ao dia em que te for agradecer pessoalmente.