Treina o Benfica e ajudou a calar 7.800 franceses em Paris
João Eduardo Marques, adjunto de Jota González nas águias, integra também a equipa técnica do Egipto
PARIS – Os Jogos Olímpicos podem ser muitas coisas. E às vezes até podem parecer um mundo paralelo. Por exemplo, os Jogos Olímpicos podem proporcionar os encontros mais estranhos nos lugares mais improváveis.
Como encontrar Magnus Wislander num daqueles raios-x pelos quais todos os credenciados para estes Jogos têm de passar para aceder a qualquer arena desportiva ou centro de imprensa.
Mas se não é de todo anormal cruzar-se com grandes figuras atuais e passadas do desporto, uma vez que se trata do maior evento desportivo do mundo, o episódio pode tornar-se rapidamente surreal.
Afinal, nas imediações de um pavilhão de andebol, a menos de uma hora do arranque de um jogo que se espera escaldante, entre França e Egipto, seria normal que Magnus Wislander, «melhor andebolista do século» estivesse ali para assistir a esse jogo.
Nada mais errado!
«Jogo de andebol? Qual jogo de andebol?», atira-nos sorridente o sueco de 60 anos, quando o sondamos para uma conversa depois da partida.
«Hoje vim ver o ténis de mesa. Temos um tipo [Truls Moregard] de 22 anos que eliminou o chinês líder do ranking mundial [Wang Chuqin]. Foi uma grande surpresa e um feito incrível. Vou ver o jogo dele que começa daqui a pouco», acrescenta, seguindo na direção da arena do ténis de mesa, umas centenas de metros ao lado, no complexo denominado Paris Sul.
Como se diz «escândalo» em francês?
Nós seguimos o nosso caminho também.
Porque Jogos Olímpicos também pode ser haver um português na equipa técnica da seleção do Egipto. E é uma conversa com João Eduardo Marques, esse treinador que também é adjunto da equipa principal do Benfica, que nos leva ali.
E como os Jogos Olímpicos podem ser surpreendentes, antes dessa conversa quase assistimos a um escândalo! Ao quase desmoronar do que parecia um plano perfeito.
A seleção francesa joga em casa e vem da conquista do Europeu, em janeiro. E encara este torneio olímpico como a possibilidade de proporcionar uma despedida perfeita a Nikola Karabatic. O jogador de 40 anos, para muitos o melhor jogador de todos os tempos, vai encerrar no final dos Jogos uma carreira recheada de títulos. Pela seleção, são quatro europeus, quatro mundiais e três ouros olímpicos.
Mas algo de estranho se passa. Porque são os Jogos Olímpicos. Os franceses perderam os dois primeiros jogos e uma derrota afasta-os dos quartos de final.
Ah, mas isto são os Jogos Olímpicos! Por isso, depois de ter estado o jogo todo a perder, a equipa da casa tem pouco mais de 10 segundos para empatar. E o silêncio impera entre quase 8.000 pessoas. Ninguém parece sequer respirar até que a seleção francesa empata o jogo no último segundo. E ainda sonha. Sim, ainda sonha! Aliás, é bem audível o eco desse sonho naquelas bancadas no momento do golo decisivo e nos 15 minutos seguintes.
A conviver com as maiores estrelas
Por falar em sonho! Voltemos ao que nos levou ali…
Após o jogo marcamos encontro na zona mista. E é ali que o leiriense de 31 anos fala sobre aquilo que está a viver há mais de uma semana.
«Está a ser uma experiência incrível. É um sonho que tinha desde sempre, de poder estar aqui nesta competição. Está a ser muito bom, tanto pela parte competitiva, como estar na Aldeia Olímpica», descreve.
João nem teve muito tempo para pensar naquilo que está a viver neste momento. O convite para integrar a equipa técnica do país que é uma das maiores potências do andebol mundial surgiu há poucos meses.
O jovem foi adjunto de dois treinadores espanhóis no Benfica, primeiro Chema Rodríguez, e depois Jota González, e foi este segundo que sugeriu o nome do assistente ao amigo que lidera o Egipto.
«O convite surgiu em abril, ficou acertado em maio, quando fui fazer um estágio com a equipa ao Cairo, e a partir daí foi sempre a trabalhar para estar aqui. Foi inesperado, mas felizmente aconteceu», orgulha-lhe o treinador que vai voltar ao Benfica após a experiência olímpica.
As funções de João estão bem definidas. Ele é analista, além de terceiro treinador, tendo a tarefa de estudar tudo sobre os adversários para depois apresentar à equipa. Para o jogo que acabou há poucos minutos, por exemplo, trabalhou durante um dia e meio, já em Paris, a juntar ao trabalho que já tinha feito antecipadamente sobre os cinco adversários da fase de grupos.
«São muitas horas a ver vídeos para que a equipa esteja o mais bem preparada possível para o jogo», descreve, sorridente, ele que já vai ter mais trabalho, uma vez que os egípcios já asseguraram um lugar nos quartos de final e certamente têm um olho nas medalhas.
Fora da competição, aquilo que está a marcar mais o português nesta experiência parisiense é o ‘convívio’ com as maiores estrelas do desporto mundial.
«É um sonho estar perto de tantos desportistas. Dos melhores desportistas do mundo. Poder conviver e estar perto deles é incrível», descreve.
«Nos primeiros dias cruzei-me com o Alcaraz, o Nadal, o Djokovic e o Murray. Entretanto começou a chegar a malta do atletismo e já vi o [Marcell] Jacobs, campeão olímpico dos 100 metros e vários atletas norte-americanos», acrescenta.
Quem ainda não apareceu à vista de João Eduardo Marques foi Magnus Wislander. Mas pode ser que isso aconteça caso o Egipto defronte a Suécia nas próximas fases da competição.
Isto, claro, se não houver um jogo de hóquei na relva, polo aquático, ou um combate de esgrima para ver.
Afinal, isto são os Jogos Olímpicos.