Sérgio Conceição e o FC Porto: o fim de uma era (alimentada por vacas magras)
Sérgio Conceição nos festejos da Taça de Portugal na época passada (foto: IMAGO)

Sérgio Conceição e o FC Porto: o fim de uma era (alimentada por vacas magras)

NACIONAL27.05.202420:15

Onze troféus e sete épocas depois, técnico vai deixar o FC Porto; Deixa rasto de 'master classes' táticas e também de emotividade em excesso e inúmeras expulsões

O virar de página confirma-se no Dragão. Sérgio Conceição vai mesmo deixar o FC Porto. Em sete temporadas, o técnico conquistou 11 troféus. Tem apenas um outro no currículo, a Taça da Bélgica, ao serviço dos belgas do Standard Liège.

Nas sete temporadas anteriores a Conceição, um ciclo iniciado curiosamente por André Villas-Boas, em 2010/11, com o pleno de campeonato, Taça de Portugal, Liga Europa e Supertaça, os dragões arrecadaram menos um, apenas dez.

Além do atual presidente, passaram ainda pelo banco portista Vítor Pereira, Paulo Fonseca, Luís Castro (interino), Julen Lopetegui, Rui Barros (interino), José Peseiro e Nuno Espírito Santo.

O mérito dos três títulos de campeão, quatro Taças, três Supertaças e uma Taça da Liga que Conceição encaminhou para o museu é maior sobretudo pelo constante desinvestimento no grupo de trabalho, consequência do avolumar das dificuldades financeiras. Não é à toa que todos reconhecem que fez muito com pouco.

Onde estão as estrelas?

O plantel de 2010/11 dava-se ao luxo de ter Radamel Falcao, Hulk, Otamendi, João Moutinho, Cristián Rodríguez, James Rodríguez, Guarín e Raul Meireles, entre outros.

Vítor Pereira, que seria bicampeão nas duas temporadas seguintes embora nem por isso um nome consensual nas bancadas, ainda contou com Danilo, Alex Sandro, Mangala, Lucho González e Jackson Martínez, embora tenha perdido Falcao na segunda temporada. Bem longe do nível de qualidade a que se baixou esta época, também decorrente das dificuldades de construção da defesa – o prolongar da carreira de Pepe tem ajudado a atenuar a situação – e do meio-campo, com uma dupla nova no duplo-pivot, que até acabou por se consolidar e ser das mais interessantes da Liga: Alan Varela afirmou-se primeiro, Nico confirmou depois todo o talento que se lhe reconhece. No entanto, tal não invalida que se possa entender que foi mais um plantel feito ongoing do que propriamente alvo de planeamento criterioso.

Sérgio Conceição foi, mais uma vez, capaz de unir todas as pontas soltas, porém, desta vez, a cola não foi suficiente para resistir à maratona de um campeonato, ainda que fosse possível recuperar a sua coesão de tempos a tempos. O 5-0 ao Benfica, os duelos com o Arsenal, obrigando ao desempate por penáltis, ou os anteriores, apesar das derrotas, com o Barcelona, e agora a final da Taça com o Sporting. Nunca o FC Porto entrou derrotado para uma partida, fosse qual fosse o rival.

A consolidação do FC Porto europeu

A competência viu-se várias vezes antes, fosse qual fosse o momento, nas competições continentais. Foram duas presenças nos quartos e três nos oitavos de final da Liga dos Campeões em sete presenças. Numa delas caiu nas pré-eliminatórias com os russos do Krasnodar e, depois, nos 16 avos da Liga Europa. Na restante, não passou a fase de grupos.

Na próxima temporada, o FC Porto não começará na prova milionária e sim na Liga Europa, o que tem de ser considerado não só atípico como momento de fragilidade do clube, já incapaz de ser levado a outros patamares pelo modelo de sempre. Nunca Conceição arrancou para uma competição secundária continental desde que chegou para treinar os portistas.

Estratega e emocional

A passagem do técnico pode ser caracterizada em outras duas vertentes: a capacidade de montar estrategicamente as suas equipas a fim de anular os seus pontos fortes – fantástica a forma como eliminou a Juventus em 2021 com dinâmicas criadas a partir do 4x4x2 então habitual – e a irascibilidade no banco, que levou a 25 expulsões, a última no Jamor.

O seu comportamento durante os encontros estará de certa forma também ligado a esta saída, com a direção de Villas-Boas a querer certamente apostar numa imagem diferente, mais tranquila, dos seus principais rostos. Ao mesmo tempo, com tanto trabalho feito, também será isso que o impedirá de assinar por um gigante europeu. E, assim, ano após ano, Itália parece destino mais ou menos previsto para o imediato ou para mais tarde.

Também é preciso não esquecer que a presença de uma estrutura bem identificada para o futebol lhe retiraria o protagonismo que assume habitualmente na formação do seu plantel.

Nunca será pela competência que Sérgio Conceição não continua no FC Porto. A conquista da Taça perante um Sporting que durante o ano sempre pareceu muito superior e se apresentava faminto por uma dobradinha que não conquistava há 22 anos é apenas mais uma prova. Se é que desta precisava.