REPORTAGEM Gil Vicente-Amarante: tal como num casamento, a paixão pode não ser suficiente
O Amarante joga hoje em Barcelos para a Taça de Portugal e o espírito é de honrar o Campeonato de Portugal.
É mais um capítulo bonito na história da Taça de Portugal, provavelmente o maior repositório de emoções no futebol português, uma prova que é capaz de colocar frente a frente duas equipas improváveis, tal como este Gil Vicente e Amarante. O primeiro milita no escalão principal do futebol português e o outro está três degraus abaixo, no Campeonato de Portugal. Não se deixem enganar pelas aparências, é que este Amarante é a única equipa imbatível entre as quatro divisões e lidera a Série B, uma das mais competitivas do futebol português.
«Quem acompanha o Campeonato de Portugal, principalmente a Série B, sabe que é dos mais difíceis. Tem nove equipas da AF do Porto, três de Aveiro e uma de Braga, que é o Vitória B. São 14 equipas e no fim descem cinco», conta-nos Renato Coimbra, treinador do Amarante, que não esconde o entusiasmo - muito controlado - por jogar, pela primeira vez, contra uma equipa da I Liga.
«É motivador. Sabemos que as nossas possibilidades são reduzidas, mas elas existem no futebol. Vai depender muito do que o Gil Vicente nos deixar fazer. São três divisões que nos separam. Vamos dar o nosso melhor e desfrutar. É um sentimento de festa», refere o técnico de 42 anos.
O entusiasmo amarantino é refreado pela obrigação, num espírito transversal desde a equipa técnica até aos jogadores: dignificar o clube (e a cidade) e manter o foco no Campeonato de Portugal.
«O Amarante não vai ganhar a Taça de Portugal. O nosso objetivo passa pelo apuramento para o play off de subida. Sendo este um jogo diferente, tentar torná-lo que seja mais um. Quanto à motivação, é o jogo mais fácil que tenho enquanto treinador, os jogadores estão mesmo com muita vontade de o jogar. Vão ter uma visibilidade diferente, temos jovens jogadores que vão aproveitar para se valorizar».
Uma paixão que se vê
O treinador Renato Coimbra sobreviveu à mudança de presidente no clube, quando Ricardo Ribeiro assumiu o cargo em julho do ano passado. O segredo do sucesso passa por não mexer muito no plantel e não mudar otreinador. Os resultados estão à vista: o Amarante é agora o único clube invencível nos quatro principais campeonatos (da I Liga até aos Campeonatos de Portugal), depois de o Santa Clara ter perdido com o Mafra no fim de semana passado. Mais, o Amarante é líder da Série B com oito pontos de vantagem sobre o S. João Ver, segundo classificado.
«A paixão pode não ser suficiente» para vencer o Gil Vicente, diz-nos Ricardo Ribeiro, mas isso pouco parece importar ao dirigente amarantino, acreditando que grande parte do país vai apoiar o Amarante a partir das 19h15 em Barcelos.
«A quarta divisão encontra-se com a primeira. Vamos usufruir ao máximo deste jogo. Queremos muito dignificar as equipas do Campeonato de Portugal, penso que muitas equipas deste país vão estar com o Amarante e pelo sentimento do futebol amador, por isso, vamos ser muitos em Barcelos. Não vamos para lá derrotados, há uma pequena percentagem, mas chega a ser extremamente difícil. A realidade é outra completamente diferente, a paixão não é suficiente e as armas são diferentes».
Ricardo Ribeiro sabe que este é o «jogo mais fácil de gerir» porque os jogadores não precisam de motivação para defrontar uma equipa da I Liga e com todo o mediatismo anexado. O presidente tem uma certeza. «Não estamos nos oitavos de final da Taça de Portugal por sorte».
Esta é a segunda vez que o Amarante está nesta fase da Taça de Portugal. Na temporada 2015/16 também conseguiu a proeza de atingir os oitavos de final.
«O trunfo é a união tremenda. Esse é o nosso craque»
Diogo Vila, capitão do Amarante, e João Filipe fazem parte da dupla defensiva do Amarante que tem a missão de travar a ofensiva gilista. Existe um «sonho» no balneário, mas beliscado pela realidade.
«Claro que sonhamos, sempre, mas estamos conscientes do que vamos ter pela frente. Estar na próxima fase transcenderia o sonho… O trunfo é a nossa união tremenda, esse é o nosso craque», disse o defesa de 33 anos que conta com duas participações no estrangeiro. Na época 2011/12 esteve ao serviço dos cipriotas do AEK Larnaca e entre 2019 e 2021 esteve no Luxemburgo a jogar pelo Etzella.
Dez anos mais novo é João Filipe, central, que fez toda a sua formação no Amarante e com uma curta passagem pelos sub-23 do Leixões, e recorda que a expressão ’tomba gigantes’ foi inventada por alguma razão.
«Todos os anos há tombas-gigantes… a mentalidade para nós é diferente quando olhamos para uma equipa de um escalão superior. Temos as nossas armas, são bem diferentes das deles Existe sempre aquele bichinho de pensar na vitória, mas temos os pés assentes na terra».
João Filipe, que também trabalha no setor imobiliário em part-time, confessou-nos que o sonho era mesmo «jogar num estádio dos ‘três grandes’, caso ultrapassem o Gil Vicente, que ocupa o 14.º lugar da Liga.