Bobby Charlton: o cérebro dos 'Wingless Wonders' campeões do mundo de 1966
Bobby Charlton sagrou-se campeão do mundo em 1966 (Foto: PA Images/IMAGO)
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Bobby Charlton: o cérebro dos 'Wingless Wonders' campeões do mundo de 1966

INTERNACIONAL21.10.202317:05

Morreu a maior lenda do futebol inglês aos 86 anos

Bobby Charlton foi a grande figura da Inglaterra campeã do mundo de 1966. Marcou três golos, um primeiro ainda na fase de grupos diante do México, e um bis a Portugal (2-1), na meia-final de Wembley, que colocou a seleção dos 'três leões' no jogo decisivo diante da Alemanha. O médio do Manchester United era quem ligava todas as pontas de um ataque curiosamente sem extremos, numa tática verdadeiramente inovadora de Alf Ramsey.

Ramsey era um realista, mas gostava sobretudo de construir a sua própria realidade. Ele que, em 1953 e em Wembley, tinha marcado, de penálti, na derrota diante dos 'Mighty Magyars', a geração de ouro da Hungria, por 6-3, acreditava que os adversários tinham feito golo em todos os remates à baliza. Não era verdade e o ‘Jogo do Século’ iria mesmo mudar a mentalidade britânica, que percebia finalmente estar atrasada em relação ao resto do mundo, mas a sua filosofia enquanto treinador ainda demoraria anos a ser moldada.

No Ipswich, que começou a treinar em 1955, aproveitou a lentidão do extremo Jimmy Leadbetter para pedir-lhe que baixasse no terreno e começasse a receber a bola da defesa, libertando o espaço que anteriormente ocupava para o avançado-centro Ted Phillips. O Brasil tinha sido campeão mundial em 1958 com o 4x2x4 e era esse sistema com um twist: a antecipação do papel de Mario Zagallo quatro anos depois, no Chile – partia de início de um posicionamento mais baixo, ao contrário do que tinha acontecido na Suécia, em que era um extremo que baixava para equilibrar –, em que foi bem mais médio do que avançado. A dinâmica que Ramsey pretendia também se apoiava no pragmatismo: a jogada de ataque ideal tinha três passes: «Quantos menos fazemos menos hipóteses temos de errar», dizia.

Subiu os Blues da terceira à primeira divisão e festejou o título de campeão em 1961/62. Foi nomeado selecionador e, depois de uma digressão pela América do Sul, percebeu que o 4x2x4 ainda conseguia ser eficaz perante equipas menores – diante do WM os dois avançados-centro colocavam em xeque os três defesas, e o esquema era ao mesmo tempo muito mais sólido defensivamente –, mas já não diante dos mais fortes.

No Mundial de 1966, surgiram então os Wingless Wonders (as ‘maravilhas sem asas’), ainda que nos primeiros jogos Ramsey tenha feito ainda alinhar um extremo perante seleções mais fracas. Nos quartos de final, diante da Argentina, perante a lesão de Jimmy Greaves entregou a titularidade a Geoff Hurst, um avançado menos espetacular, mas capaz de ganhar a bola no ar e conservá-la. Era mais uma peça do seu complexo puzzle. Hurst marcou, a Inglaterra venceu 1-0 – num dos confrontos mais violentos da história do futebol, que teve a expulsão de Antonio Rattín aos 36 minutos e levou os jornais ingleses a titularem em letras garrafais: ‘Animals’ (‘Animais’) – e nunca mais deixou o ‘onze’, sendo decisivo na final.

O combativo Nobby Stiles era o mais defensivo do meio-campo e encarregava-se das marcações individuais: ‘secou’ Eusébio nas meias-finais. Alan Ball era inesgotável e subia e descia na direita. Martins Peters era criativo no ataque, mas ao mesmo eficaz a defender, e começou a fazer o mesmo desde a esquerda. 

Bobby Charlton, o mais fantasista que um futebolista britânico desse tempo poderia ser, ligava todas as peças. Ambidestro, recebia, corria com a bola, driblava, passava-a, organizava e chegava à área para fazer golos, mostrando sempre ser cirúrgico nesse momento. O 4x2x4 transformou-se num 4x3x3 estreito, ou melhor, no 4x1x3x2. No centro desse tridente, que era na realidade o centro de tudo, estava Bobby Charlton.

INGLATERRA (final Mundial de 1966) - Gordon Banks; George Cohen, Jack Charlton, Bobby Moore e Ray Wilson; Nobby Stiles; Alan Ball, Bobby Charlton e Martin Peters; Geoff Hurst e Roger Hunt