Benfica As contas que passam pela cabeça de Roger Schmidt
O Benfica está a preparar a época de 2023/2024 com o sentido de responsabilidade de quem tem consciência do que vale o apuramento para a Liga dos Campeões de 2024/2025, que será disputada num novo formato, mais rentável, e no que respeita a Portugal com apenas um acesso direto garantido, o do campeão, estando reservada ao 2.º classificado a Via Cruxis das pré-eliminatórias e play-offs, que permitirão, ou não, um lugar à mesa dos ricos.
Vencer o próximo campeonato nacional garantirá, a quem o conseguir, um desafogo financeiro que aumentará, de forma quiçá irrecuperável, o fosso para a restante concorrência nacional. Sem se tratar de um all in dos encarnados, porque quem quiser futuro e um projeto sustentável tem de manter as contas equilibradas, é inegável estarmos perante uma agressividade no mercado suscetível de encher de ilusões a nação benfiquista. Depois de Otamendi, Kokçu e Gonçalo Guedes, Di María é a cereja no topo de um bolo onde ainda faltam algumas fatias, nomeadamente mais um guarda-redes (fala-se do brasileiro Bento, que se algum dia vier a ter metade da importância que o Manuel Galrinho teve no Benfica será uma aposta mais do que ganha) e de um defesa esquerdo, sendo público o interesse no jovem húngaro Kerkez. E está por saber se algum dos previsíveis titulares (António Silva, Gonçalo Ramos) não vão ser assediados para sair, e qual será a política de vendas/dispensas do Benfica, especialmente no que respeita a Gilberto, João Victor, Lucas Veríssimo ou Musa.
Mas, desde já, e com os dados existentes, o que irá na cabeça de Roger Schmidt?
Não haverá muitas razões que sustentem, na nova temporada, uma alteração de modelo ou filosofia por parte do treinador alemão do Benfica. Provavelmente, com um plantel mais profundo e bem apetrechado, Schmidt poderá recorrer mais ao banco de suplentes, ao contrário do que sucedeu na época do 38 em que usou, na prática, apenas 16/17 jogadores, entre os 32 que se sagraram campeões. Não deixará, porém, de manter a exigência de equilíbrio e a certeza de compromisso defensivo, independentemente dos nomes em causa.
Guarda-redes
Assim, tomando como ponto de partida uma equipa montada em 4x2x3x1, vocacionada para pressionar alto e de olhos sempre postos na baliza contrária, Vlachodimos, um alemão (no que respeita à formação futebolística) que joga pela seleção da Grécia, partirá sempre em vantagem. Este estatuto de titular ninguém lho deu, foi ele que o conquistou ao longo de quatro temporadas, cada uma melhor do que a anterior, numa evolução que apenas encontra entraves no jogo com os pés. Precisa de uma concorrência mais apertada, que o mantenha em alerta e, ao mesmo tempo, dê garantias de ser capaz de lutar pela titularidade. Samuel Soares, um bom valor, nesta fase da carreira precisa de sair para jogar e crescer, com aquilo que irá fazer de bem e de mal.
Defesa
Na defesa, o centro estará entregue, à partida, a António Silva e Otamendi, cuja renovação foi (pelo menos para mim) uma grande surpresa, e ao mesmo tempo um símbolo de força persuasiva de Rui Costa. Sobre António Silva, apenas uma nota: depois do finca-pé feito pelo Benfica quanto à cláusula de Enzo Fernández, não é crível que António Silva possa sair abaixo dos 100 milhões tabelados...
Na direita, Alexander Bah, adaptado ao Benfica e excelente intérprete das ideias de Roger Schmidt, não oferece dúvidas, que estão reservadas para a continuidade de Gilberto e para um possível substituto. Na esquerda, de onde saiu um dos pesos-pesados da equipa, Álex Grimaldo, influentíssimo no título ganho e na boa performance na Champions, reside a principal dificuldade dos encarnados. Sem que Kerkez tenha saído de cena, vários nomes foram já aventados, mas duas coisas parecem certas e seguras: a primeira é que não será fácil substituir o valenciano formado em Can Barça; a segunda é que o Benfica precisa de abrir os cordões à bolsa, porque estamos perante uma posição-chave na filosofia de jogo de Schmidt, que gosta de projetar os laterais e trazer os médios-alas para o jogo interior.
Meio-campo
A partir daqui, as dúvidas adensam-se, e Schmidt vai passar a enfrentar aquilo a que na gíria se chama de problemas bons, mas que na prática são um duro teste à liderança do treinador e à coesão do balneário. Por exemplo, em relação aos dois que jogam à frente da defesa, quem serão os escolhidos entre Florentino, João Neves, Aursnes e Chiquinho, a que pode ainda juntar-se Kokçu? Serão Aursnes e João Neves os eleitos, ficando Florentino reservado para uma fase posterior, em que seja preciso acalmar o jogo? Ou, para não tirar espaço a Rafa (ou Neres, ou Di María), essas posições serão ocupadas pelos ex-Feyenoord, Aursnes e Kokçu? Francamente, ninguém estará a ver o norueguês, que conquistou o Terceiro Anel e o turco, de inegável qualidade, por quem o Benfica pagou bom dinheiro, fora do onze-base de Roger Schmidt.
E nas alas, como será? Candidatos, não faltam: a começar por João Mário, um dos líderes da equipa, que foi instrumental para a concretização do 38; passando por David Neres, até agora o único abre-latas da equipa; por Fredrik Aursnes, que fez boa parte da época encostado à esquerda, por Ángel Di María, ainda um dos melhores do mundo em lances de um-contra-um em espaços diminutos; e por Gonçalo Guedes, que gosta de jogar a partir da esquerda para o meio. Dá-se um doce a quem acertar no que vai na cabeça de Roger Schmidt...
Ataque
Partindo do princípio de que haverá três médios de ataque nas costas de um ponta de lança, quem serão os escolhidos? À partida, João Mário, Neres e Di María podem jogar em qualquer das alas, e a este trio junta-se Gonçalo Guedes e até, como já se viu, Aursnes. Mas Rafa, se for caso disso, também conhece bem esses terrenos, e deve intuir que neste plantel, embora uns sejam, à partida, mais titulares que outros, ninguém vai ter lugar cativo.
Provavelmente, Roger Schmidt vai ser apologista de permutas constantes entre os três jogadores que apoiarem o ponta de lança, o que requer muita inteligência tática. Mas indo para uma sintonia ainda mais fina, quem jogará, mesmo tendo em conta as aludidas permutas, nas costas do ponta de lança, posição até agora ocupada, grosso modo, por Rafa? É que, além de Rafa, há mais candidatos a esta posição. A David Neres e Gonçalo Guedes, juntam-se dois pesos-pesados Kokçu e Di María, que de certeza que não foram contratados para ficar a aquecer o banco. O que sugere uma competição feroz pela posição, sabendo-se que, na hora da verdade, Roger Schmidt não pode apresentar mais do que onze jogadores na formação inicial...
Falta falar do ponta de lança, que, além da inerente vocação goleadora, tem um papel decisivo em toda a manobra defensiva da equipa. Qualquer das três opções mais fortes - Gonçalo Ramos, Petar Musa e Gonçalo Guedes - é capaz de desempenhar essa missão, mas não se vê que, a não ser em ocasiões de necessidade/desespero, o Benfica se transforme numa equipa de 4x4x2 clássico. Garantido Guedes, que estará operacional mais tarde que os companheiros, resta saber o que dirá o mercado em relação a Gonçalo Ramos, alvo de cobiça de vários clubes ricos, e qual o sentimento de Musa, internacional pela Croácia, que tem reclamado mais minutos.
O que se segue
Tal como A BOLA noticiou quando revelou as posições que Rui Costa queria ver reforçadas, falta, nesta altura, a contratação de um guarda redes - e é Bento Krepski, do Athlético Paranaense, o principal candidato a integrar o plantel - e de um defesa esquerdo, e nesse particular a via de Kerkez não estará esgotada. A partir do preenchimento destas posições, o Benfica só voltará ao mercado caso algum dos jogadores que compõem o seu quadro vier a ser transferido, e na base de substituição direta. Caso contrário, e ainda estamos na última semana de junho, o Benfica tem a casa quase arrumada.