A palavra que resume os maus momentos do Benfica em Milão (e não só)
O que se passou no Giuseppe Meazza foi apenas mais um exemplo de algo transportado desde o início da época
Pressão. Esta é a palavra que resume os maus momentos do Benfica esta época. É uma equipa que gosta de pressionar e reagir forte à perda, e, se há falhas aí, ainda tem conseguido passar entre os pingos da chuva sobretudo em contexto português. No entanto, o ambiente Liga dos Campeões apresenta-se mais contundente e, especialmente, capitaliza ainda mais o desconforto que existe (se existe) quando se é pressionado. A versão encarnada 2023/24 sofre dos dois males: só a espaços, a águia consegue ‘abafar’ os rivais; e, quando pressionado de forma efetiva e agressiva, o seu processo ofensivo ‘implode’ e torna-se fatal para o defensivo.
Em Milão, os encarnados conseguiram uma boa primeira parte, é verdade. Mérito pela forma como se apresentaram em campo, com personalidade e, acima de tudo, tomadas de decisão simples de circulação de bola, tentando aproveitar a transição para causar problemas ao Inter. E conseguiu-o. No entanto, partiu de uma falsa ideia de conforto. Os italianos baixaram a linha de pressão para perto do meio-campo, precisamente para atrair os jogadores do Benfica, recuperar aí a bola e sair em transição. Foi a sua estratégia para a primeira parte. Na realidade, Trubin não teve muito trabalho porque nessa fase, ainda com muitos metros até à baliza do ucraniano, os últimos homens conseguiram reagir.
Os problemas chegaram no segundo tempo. Com o 0-0 a jogar perante o seu público – que fez obviamente a sua parte –, Simone Inzaghi ordenou que a agressividade aumentasse e a pressão fosse mais alta e incisiva. E o Benfica deixou-se engolir quase sem estrebuchar.
Quando a pressão aumenta, os jogadores encarnados têm tendência a querer livrar-se da bola depressa de mais ou de forma mais displicente. Escrevi aqui na segunda-feira que o Inter não se expõe muito na pressão e os que os ‘gatilhos’ estão identificados num jogador de costas ou na bola a cair no lateral, por exemplo. E foram premidos. O golo ‘nerazzurro’ surge num momento de construção tranquila do Benfica. Bastou uma má definição de Morato no passe para Bernat, que obrigou o espanhol a recuar, a ter de se desequilibrar para impedir que a bola saísse e estivesse, ainda por cima, com o pé preferencial tapado, obrigado a ter de jogar para dentro. A bola foi recuperada e também, como era previsível, Dumfries já tinha arrancado. Otamendi falha na antecipação do fora de jogo (embora não fosse fácil) e o passe do neerlandês é também de ‘escola’ – como vários outros na segunda parte; lembram-se do que falhou Lautaro Martínez? –, para trás. Thuram fez o resto.
Quantas transições o Inter conseguiu depois de maus passes de Di María, João Neves – tem tanta coisa boa, é talvez o maior defeito que tem de anular –, Kokçu, Aursnes e Rafa? De más decisões. Foi aí que residiu o problema. Na verdade, o Benfica não se deixou adormecer, foi o Inter que agendou o despertador para depois do intervalo. E agora recuperava a bola muitas vezes a meio do meio-campo contrário, para pânico da última linha dos portugueses.
É verdade que muito se vai falar do alegado penálti sobre David Neres e da falta sobre Otamendi na jogada do golo, mas a segunda parte da partida torna qualquer argumento irrisório. Há necessidade urgente de trabalhar a saída sob pressão e as dificuldades atuais só se explicam com o foco quase total de Roger Schmidt na sua identidade, ou seja no ter bola e atacar, e no recuperar a bola e atacar. Há adversários para os quais não bastam ligeiros retoques, precisam de ser pensados com mente mais aberta. O Inter é um deles, haverá muitos mais.