Sem surpresa

OPINIÃO06.04.202206:55

O Liverpool ganhou com naturalidade um jogo de sentido único interrompido por uma fífia de Konaté que Darwin não perdoou. Mas o Benfica teve sempre medo…

TERMINADOS os primeiros 90 minutos do período de «suspensão da descrença benfiquista», como escreveu ontem o colunista Vasco Mendonça, podemos dizer que o Benfica, derrotado por margem clara (1-3), mantém ainda assim a esperança de chegar às meias-finais. Uma esperança ténue, muito ténue mesmo, mas ainda assim uma esperança. Ninguém esquece que em 2006, contra todas as previsões, o Benfica foi a Anfield ganhar por 2-0. Falta dobrar o cabo das tormentas de Anfield, o que nunca será fácil (e a história nem sempre se repete…), mas pelo menos os adeptos encarnados têm mais 90 minutos para esquecerem a realidade doméstica e sonharem com a possibilidade de qualquer coisa entusiasmante. Perder em casa com o Liverpool é um resultado normal, que não envergonha ninguém, e sempre acrescento que há mais quatro equipas a quem aconteceu o mesmo na presente campanha europeia: FC Porto (1-5), Atlético Madrid (2-3), Milan (1-2) e Inter (0-2). Todas, enfim.

O jogo foi estranho, mas acabou ganho pela melhor equipa. Ao intervalo a vantagem do Liverpool (2-0) parecia pequena. Durante 45 minutos a mancha amarela espraiou-se pelo relvado submergindo pelo caminho o encarnado (progressivamente desmaiado) das camisolas benfiquistas. Tão grande e tão vincada foi nesse período a supremacia da equipa inglesa que não ficou muita coisa por dizer. Não houve inferno da Luz, não houve o Benfica europeu do Barcelona e do Ajax, não houve papoilas saltitantes, não houve sequer suspense. Uma primeira parte terrível em que o Liverpool passou por cima do adversário como um porta aviões arromba um cacilheiro que inadvertidamente se atravessa no caminho.
 

Everton e Konaté em ação no jogo que provou a superioridade do Liverpool


A segunda parte começou praticamente com uma fífia infantil do central Konaté, bem aproveitada por Darwin (1-2), e durante 15 ou 20 minutos pairou no ar a sensação de um novo Ajax (2-2) embora, sejamos honestos, do ponto de vista tático o jogo tenha continuado igual, já que o Benfica nunca alterou o seu perfil híper cauteloso - bloco muito baixo, dez jogadores atrás da linha da bola e… fé em Darwin. O estádio aqueceu, o público puxou e Darwin, sempre ele, continuou a forçar a surpresa, com velocidade e carradas de energia. Mas o Benfica nunca chegou a tentar mandar no jogo e quando quis já não tinha forças. Demasiado pouco para o que a noite pedia e o Liverpool, que pareceu algo titubeante nos dez minutos a seguir ao golo de Darwin, não demorou muito a perceber que o Benfica continuava com medo e voltou a tomar as rédeas do jogo com a naturalidade de quem está habituado a mandar. O resto resume-se a maturidade e experiência. Que os ingleses têm de sobra. Os adeptos encarnados vão passar o resto da semana a lamentar que o árbitro não tenha punido o toque de Van Dijk a Darwin (pareceu-me penálti) e ninguém vai mencionar as várias oportunidades que o Liverpool desperdiçou por imperícia ou por causa de Vlachodimos. Quando Diogo Jota, nos descontos, falhou o 4-1, a Luz, quase silenciosa, parecia rendida. Nenhuma tragédia, nenhum drama. O Liverpool é efetivamente de outro patamar.
 

MEIA-FINAL A FUGIR

OBenfica vai a Anfield tentar arrancar a sua primeira meia-final na Champions League perante um Liverpool que tem um pé e meio lá… e é um habitué das etapas decisivas desta competição. Das oito equipas em prova o Benfica é o único que nunca passou dos quartos de final (o Villarreal chegou às meias em 2006, pela mão de Manuel Pellegrini…). A última vez que as águias chegaram a uma meia-final nos Campeões ainda existia URSS. Foi há 32 anos (21 de março de 1990), no modelo antigo. Nesse dia os encarnados venceram na Ucrânia (estádio Meteoro, em Dniepre) a então equipa soviética do Dniepr Dniepropetrovsk por 3-0, com golos dos brasileiros  Lima (bis) e Ricardo Gomes; já agora, o onze benfiquista: Silvino; José Carlos, Ricardo Gomes, Aldair e Veloso; Jonas Thern; Vitor Paneira, Valdo e Hernâni; Lima e Magnusson; ainda jogaram Diamantino e Pacheco. O treinador era o grande Eriksson e o Benfica chegou às meias-finais com seis vitórias em seis jogos: Derry City (2-1 e 4-0), Honved (2-0 e 7-0), Dniepr (1-0 e 3-0). Depois veio o Marselha, Vata manuseou o assunto e o Benfica foi à final com o Milan dos holandeses. Em Viena. Bons tempos!
 

CITY: CUSTOU MAS FOI

JOGO de sentido único no Ethiad com o Atlético a defender durante 90 minutos e o City a mandar imperialmente no jogo. O bonito golo de Kevin de Bruyne fez a diferença mas não espelha de nenhuma maneira a diferença entre as duas equipas. No caso do Atlético, mais uma vez custou ver jogadores como João Félix e Griezmann amarrados a funções de marcação como dois bons gladiadores. Mágoas do Cholismo. Relativamente aos jogos de hoje, temos a repetição da meia-final da época passada entre Chelsea e Madrid em Stamford Bridge, já sem o multinacional Roman Abramovich na tribuna de honra. O campeão em título contra o eterno campeão europeu num duelo faíscante sem favorito claro. O Chelsea já viu melhores dias, mas na Europa é sempre sólido e dificil de dobrar. Do Real Madrid, como de Carlo Ancelotti e Karim Benzema, é sempre de esperar tudo - inclusivamente algo que nos deixe de boca aberta. Já o Villarreal-Bayern vale por aquilo que o submarino de Unai Emery conseguir fazer do poderoso tanque que tem pela frente. Nunca subestimar os espanhóis, mesmo os que parecem minorcas.