Schmidt é o melhor reforço
É esperto como uma águia, por isso quer investir no Campeonato e na Liga dos Campeões. Depois tentará abrir a porta da Taça. É esta a sequência lógica
C ONTA-NOS a história recente do futebol português que tem sido muito difícil a relação do Benfica com o Sporting de Braga. Nada tem a ver com a transferência não concretizada de Ricardo Horta para a Luz. Refiro-me apenas aos resultados entre os dois clubes desde há quatro épocas, e desse ponto de vista manda a prudência moderar o entusiasmo da família benfiquista.
Para os adeptos dos grandes clubes não existe meio termo entre o querer ganhar tudo ou a desilusão profunda, quando sem razão alguma se discute as pessoas, os objetivos, os projetos e, num instante, o que estava bem passou a estar mal. É assim mesmo, motivo pelo qual esta visita da águia à capital do Minho deva ser encarada com cautelas redobradas por se tratar de um daqueles jogos em que, dizem os treinadores, na ausência de ideia mais sedutora, tudo pode acontecer. Para qualquer observador interessado pelas estatísticas e a análise dos números, em termos de atribuição de favoritismos no jogo de amanhã, o prato do SC Braga pesa mais. Porquê? Por ter vencido o Benfica (2-0) na final da Taça de Portugal, em maio de 2021, e nas última quatro edições do Campeonato registar também vantagem nas vitórias, com quatro contra três da águia:
2019/2020 - SC Braga, 0-Benfica, 4 (4.ª jornada) e Benfica, 0-SC Braga, 1 (21.ª);
2020/2021 - Benfica, 2-SC Braga, 3 (7.ª) e SC Braga, 0-Benfica, 2 (24.ª);
2021/2022 - Benfica, 6-SC Braga, 1 (11.ª) e SC Braga, 3-Benfica, 2 (28.ª);
2022/2023 - SC Braga, 3-Benfica, 0 (14.ª).
Adureza destes números não envergonha o favoritismo que, neste caso, deve ser atribuído ao Benfica, mas adverte para a certeza de um opositor forte, reforçado, com legítimas ambições em estar presente na final do Jamor e cujo treinador deve ter saturado a paciência do presidente bracarense depois das invenções feitas em Alvalade, diante do Sporting, que lhe custaram a segunda goleada da época, a perda do segundo lugar na classificação do Campeonato e, como consequência direta, o risco de comprometer a última via de acesso direto à Liga dos Campeões. Se isto se confirmar, António Salvador não lhe perdoará.
Roger Schmidt é esperto como uma águia
Os adeptos do Benfica devem estar preparados não só para a eventualidade de o jogo poder não correr de feição, mas também para a importância de, em qualquer circunstância, manterem firme a confiança no processo de mudança que está a ser operado por Rui Costa e não começarem a escaqueirar com as ladainhas do costume o que tanto trabalho está a dar na reconstrução.
A Taça de Portugal é importante, claro que sim, mas se me é permitida a opinião, em caso de dúvida, há que definir prioridades. Nesta fase de transição, em que tudo está a acontecer depressa e bem, o objetivo número um deve apontar à conquista do ‘38’, objetivo que ficou encalhada em 2019/2020, quando o ‘cozinhado despedimento’ de Lage deu lugar ao ‘catastrófico regresso’ de Jorge Jesus.
No ano da sua entrada em cena, ser campeão nacional é o objetivo supremo de Roger Schmidt e não foi por acaso que, de modo a colocar um ponto final na saída de Enzo Fernández, declarou que «queremos ser campeões com estes 24 jogadores». E disse mais: «É um tema encerrado e desejo-lhe felicidades no Chelsea. Agora fico concentrado nos jogadores que cá estão.»
O treinador alemão está a revelar-se o melhor reforço de Rui Costa. É inteligente, pensa pela sua cabeça e foca-se naquilo que, segundo ele, é verdadeiramente importante. O resto não passa de conversa à qual liga muito pouco, por ter confessado que a língua portuguesa é difícil de aprender.
É esperto como uma águia, por isso investe no Campeonato e na Liga dos Campeões, que dá riqueza, prestígio e valorização, além de lhe permitir acelerar o projeto de recuperação do estatuto de excelência na UEFA de que o clube foi detentor de pleno direito até à década de noventa do século passado.
Por cá, Roger Schmidt quer entrar pela porta do Campeonato e depois tentar abrir a da Taça. É esta a sequência lógica. Não estou a desculpar um eventual fracasso do Benfica, tão pouco a vaticinar um sucesso do SC Braga, mas ambos os cenários são possíveis, tal como o seu contrário.
Vença quem vencer, a vida continua, sem azias, de preferência, porque mais bizarro do que a declaração do treinador do FC Porto, feita depois do jogo com o Vizela («deve ser inédito uma equipa que ganhou os últimos quatro títulos nacionais ser tão massacrada como nós somos»), é a sinuosa campanha noticiosa movida ao Benfica, apesar de a sua equipa de futebol não ganhar títulos nacionais vai para quatro anos, embora dê sinais iniludíveis de poder voltar a ganhá-los daqui a quatro meses. Para a Liga, o SC Braga também ganhou quatro vezes ao Benfica nas últimas quatro épocas. Afinal, será coincidência ou isto anda tudo ligado? O ‘massacre do quatro’, da autoria de Sérgio Conceição, brevemente nos cinemas.