Saber estar

OPINIÃO19.05.202107:00

Quem não conseguir o título deve reconhecer o facto, aceitar com naturalidade e tentar vencer na próxima época

NA vida como no desporto, há momentos bons e menos bons. A imprevisibilidade é um património que o futebol integra e que nos motiva, todos os dias, para tentar atingir sempre o melhor. Nas vitórias é natural que se manifeste alegria e contentamento, sem desrespeitar ninguém. Por outro lado, quem não conseguir o título deve reconhecer o facto, aceitar com naturalidade e tentar vencer na próxima época.
O que se passou nas imediações do Estádio de Alvalade, nas ruas e rotundas de Lisboa não foi uma imagem feliz de consagração, mas a revelação de um Estado impreparado e pouco competente. O futebol acabou vítima e não protagonista. Quem não consegue prever e antecipar, não pode governar.
Sem regras, nem espaços delimitados com distanciamento definido e máscaras (notaram-se muitas esquecidas), esperemos não ter acordado o monstro que nos aprisiona há muito tempo. Como se pode perder o Norte e as responsabilidades essenciais? A DGS? Portugal merece mais, a começar pela segurança e responsabilização das pessoas. Falta capacidade de liderança com rumo.
 

BOA DECISÃO

PEDRO PROENÇA, Presidente da Liga, decidiu não abrir as portas dos estádios ao público, na última jornada da época. Antes do jogo do título, apresentou sugestão interessante mas não aceite e que poderia ter evitado as consequências que ocorreram. Desta vez, mais uma boa decisão, pois não poderia ser utilizado para branquear erros inadmissíveis de diversas instituições. Defender o futebol implica criar plano para derrotar a violência. É urgente criar regras, procedimentos e hábitos que prestigiem o jogo e devolvam a segurança, sem menosprezar o clubismo, dentro dos limites imprescindíveis. O futebol pode criar mais-valias para quem souber manter o fair-play e penalizar duramente quem o atacar. Só com regras rígidas e procedimentos coerentes se pode desenvolver o futebol, como espaço de emoção mas também da razão e da responsabilização.
 

«O que se passou [...] foi a revelação de um Estado impreparado e pouco competente»

LIGA JORNADA 33

COM o título decidido, falta saber quem mais desce de divisão, quem vai ao play-off e a outra equipa a subir à primeira liga. O Estoril Praia volta à Liga principal, onde esteve vários anos. Há diversas equipas nacionais que se apuram para as competições europeias (diretamente ou com pré-eliminatórias), as duas últimas classificadas descem automaticamente para a Liga 2, o antepenúltimo classificado da Liga e o terceiro da Liga 2 disputam o play-off descenso, a duas mãos. Agora é o momento do tudo ou nada, daí a exigência de uma arbitragem concentrada, competente e serena.
O Paços de Ferreira foi derrotado em casa pelo Gil Vicente. O Braga venceu o Moreirense. O Boavista ganhou ao Portimonense e deu passo importante para tentar manter-se nesta Liga. O Farense derrotou o Tondela e conseguiu uma esperança até ao fim. O clássico Benfica - Sporting, com implicações na obtenção do segundo lugar, foi um jogo de muitos golos (4-3), vencido pela equipa encarnada, que acabou por só conseguir o terceiro lugar; o Sporting, ao perder o jogo, não conseguiu acabar a competição sem derrotas. O Rio Ave, em zona de risco, lutou bastante, resultado a zero na primeira parte, mas o FC Porto, na segunda parte, foi mais eficaz, goleador e confirmou segundo lugar; o Rio Ave teve um início de época muito exigente, com várias pré-eliminatórias complexas (incluindo recurso a prolongamento e mais 24 pontapés de grande penalidade no jogo que esteve empatado a dois golos e no qual o Milan falhou menos um penálti e ganhou: 8-9), que anteciparam o início da época com muito esforço e sem tempo de recuperação, o que condicionou capacidade de preparar a época. O Famalicão, com notória subida de rendimento, venceu o Nacional, já com descida de divisão anunciada. O Belenenses SAD perdeu em casa do Santa Clara. O Marítimo empatou em Guimarães.
 

MEMÓRIAS DO CAMPEONATO

N ÃO faltaram apontamentos de destaque, com factos reais.
1. Jorge Jesus considera que o futebol português vive um clima de impunidade, no qual as competências jurídicas se dividem entre as de foro desportivo e tribunais civis.
2. Hugo Miguel e o VAR, em Moreira de Cónegos, ficaram para a história com erros de dimensão planetária. Inesquecível. Mas houve mais casos também decisivos e com influência no resultado.
3. Em todas as épocas, Sérgio Conceição obteve para o FC Porto um total igual ou superior a 100 golos: é obra!
4. Rúben Amorim, na sala de imprensa do Estádio da Luz, afirmou: «( Jorge Jesus) Deu-me os parabéns. Disse que estava à espera para me dar os parabéns pessoalmente. Desejei-lhe boa sorte para a final da Taça.»
5. Carlos Carvalhal assumiu a mudança de sistema na primeira parte. Na segunda parte retificou, melhorou, mas no seu entendimento «os jogadores jogaram o seu jogo e não o jogo da equipa». O Braga contestou ainda a hora da final da Taça de Portugal em Coimbra: pretendia mais cedo (19 horas) mas a FPF decidiu antecipar, apenas meia hora (20.30 horas)!
6. Os comentadores da BTV manifestaram contentamento pela derrota do Nacional no jogo com o Benfica, da 32.ª jornada, e afirmaram que esse jogo foi «mais um prego no caixão». Manuel Machado, treinador do Nacional, com a tranquilidade que lhe é reconhecida, respondeu de forma irónica e precisa.
7. Será que o humorista Ricardo Araújo Pereira pode ser suspenso por confraternizar com o adversário? 
 

E O DESPORTO?

Osecretário de Estado da Juventude e Desporto revelou as suas convicções: «Espero que não se repita e quero aproveitar para fazer novamente um apelo. As manifestações são naturais em tempos normais, mas este é um tempo de exceção. A responsabilidade tem de estar à altura deste momento (…) Se cada um não fizer a sua parte, as coisas ficam mais complexas», afirmou em Braga. E será que cada um, inclusive o SEJD, está a fazer a sua parte?
Foi mais uma época terrível, complexa e com a pandemia num ataque cerrado. Faltou às tutelas entender o sacrifício dos jogadores e treinadores, com visitas assíduas, ao longo das semanas, informando-se das realidades de cada clube, das dificuldades a superar e faltou também a capacidade para perguntar, ouvir e resolver, na medida do possível. Deixar os acontecimentos unicamente à sorte e aos apelos nunca será estratégia de desportistas. O problema inicial tem sido mesmo esse: o enorme desconhecimento do universo do desporto.
 

REMATE FINAL

Naturalmente, o título de campeão nacional de futebol é sempre uma enorme conquista, tanto mais que só sofreu uma derrota a dois jogos do fim da prova. Por outro lado, é de realçar a coragem do também jovem treinador, ao lançar tantos jovens talentos que souberam criar uma equipa coesa, confiante e lutadora até ao fim de cada jogo. Os campeões revelam a sua marca e o seu mérito, numa intensidade competitiva constante. Mereceram bem os parabéns, pelas provas dadas em campo!

O escritor Álvaro Magalhães, a propósito da UEFA, FIFA e Superliga, escreveu: «Quanto a superligas elitistas, ao tempo que a UEFA as faz, se tivermos em conta o modelo inicial da Taça dos Campeões Europeus, que era jogada pelos campeões de cada país (…) Por isso que ninguém se iluda: a Superliga segue dentro de momentos, uma outra, claro, mais bem desenhada por gente menos ansiosa e com mais miolos, pois é essa a consequência lógica e inevitável do processo em curso (…) Aquela revolta dos jovens adeptos do Liverpool foi uma manifestação residual, quase folclórica, que só serviu para despertar a melancolia de velhos ideais românticos. Até o slogan deles (’Criado por pobres, roubado por ricos’) estava errado, pois foi exatamente ao contrário, o futebol  moderno foi criado  pelos ricos e, mais tarde, apropriado pelos pobres (os trabalhadores das fábricas na era industrial). Embora os adeptos sejam a base em que assenta o portentoso edifício do futebol, tudo se passa longe do seu curto alcance.»

Parabéns ao Sporting que venceu, pelo segundo ano consecutivo, o título de campeão europeu de hóquei em patins.