Rui Costa não pode falhar

OPINIÃO24.01.202305:30

Primeiro recuperar o hábito de ganhar títulos, depois chegar ao fim do campeonato e dar aos milhões de benfiquistas a prenda que esperam dele

E STÁ concluída a primeira volta do campeonato e a classificação não deixa dúvidas sobre a superioridade do Benfica. Foi a equipa que melhor futebol praticou e por isso ganhou mais vezes. Virar a página com quatro pontos de vantagem sobre o segundo é bom, embora insuficiente para abrandar no ritmo competitivo, pois há exemplos recentes em que vantagens mais robustas por esta altura de nada valeram no final.

A paragem provocada pelo  Mundial do Catar foi uma espécie de tábua de salvação a que os mais próximos perseguidores se agarraram na esperança de verem ressurgir-lhes uma águia distraída e com isso poderem encurtar distâncias. Investiram desalmadamente num microciclo de jogos que, em rigor, até correu mal a Roger Schmidt. Derrota em Braga e empate no dérbi, ou seja, em seis pontos possíveis amealhou apenas um, mas quiseram os deuses que, apesar desse sobressalto, tivesse passado o seu cabo das tormentas com relativa segurança. Os rivais que tanto mal lhe desejaram acabaram também eles por ser penalizados nos seus percursos. O FC Porto marcou passo com o Casa Pia e o Sporting capitulou nos Barreiros.

O Benfica não pode esperar. É esse o problema de Rui Costa e o desafio de Roger Schmidt. O presidente, neste ano um de mandato, sabe que lhe falta tempo para fazer o que tem de ser feito, e começou a ser feito, nomeadamente no critério de seleção de valores de modo devolver a identidade triunfadora a quem veste a camisola da águia. Por outro lado, o treinador sabe também que lhe exigem resultados independentemente da qualidade do plantel, a qual, como é notório, poucas parecenças tem já com a realidade que se lhe deparou no verão passado.

Ter de recuar até agosto de 2019 para descobrir o último troféu conquistado pelo Benfica é um exercício difícil de fazer por qualquer adepto benfiquista, mas é a verdade. Não há como fugir, nem perder tempo com vagas lamuriantes tão ao gosto dos que falam muito e dizem pouco, mas perturbam o ambiente. 

O S emblemas rivais criticam o Benfica pelas aquisições que fez e vai continuar a fazer, até conseguir um quadro de estabilidade no plantel, que lhe permita o necessário nivelamento qualitativo para cada posição. O que não quer dizer que aspire a um plantel de estrelas, tão-somente a um cenário de equilíbrio em que quem vá a jogo se sinta pressionado pela sombra do suplente que fica no banco e quer entrar. Uma competição normal em qualquer clube de dimensão europeia e que o Benfica  quer reaver, depressa, em respeito pela sua história. Por isso se explica a opção Gonçalo Guedes, um jovem da casa e com o espírito que se pretende.

O Benfica precisa de  correr mais do que todos os candidatos ao título por se sentir obrigado a chegar ao fim no primeiro lugar, aparentemente um objetivo normal, dado estar a falar-se do clube português mais vezes campeão nacional (37) e que mais Taças de Portugal venceu (25). O problema é que, por razões que não enxergo, nos últimos anos parece ter perdido a ambição de ganhar. Pior ainda, perder quase se transformou numa inevitabilidade aceite pela família benfiquista, preocupada e resignada por não saber como interpretar e travar essa estranha tendência. Mas Rui Costa sabe e imagino a sua ansiedade por estar consciente de não poder falhar nesta luta gigantesca, primeiro recuperar o hábito de ganhar títulos, depois chegar ao fim do campeonato e dar aos milhões de benfiquistas a prenda que esperam dele.


BRAGA A SOMAR 

O SC Braga foi quem mais beneficiou no regresso ao ciclo normal da Liga: em quatro jornadas obteve quatro vitórias (Benfica, 3-0; Santa Clara, 4-0; Boavista, 1-0; P. Ferreira, 2-1). Conseguiu o pleno, subiu ao segundo lugar, respira saúde e António Salvador, na cerimónia do 102.º aniversário do clube, não podia ser mais claro na sua intervenção:

«Sabemos estarem reunidas as condições estruturais e humanas para alcançarmos todos os nossos objetivos e cumprirmos todos os nossos sonhos.»

O treinador bracarense deve ter entendido o significado da mensagem e deve saber que o seu presidente não costuma brincar em serviço. Artur Jorge tem de recolocar o SC Braga na Liga dos Campeões. Abaixo do terceiro lugar será uma época fracassada.

Por outro lado, aquela derrota humilhante em Alvalade (0-5) António Salvador não vai esquecê-la porque queria muito estar esta noite, em Leiria, na Final Four da Taça da Liga, no lugar do Sporting.

No luso universo dos clubes de pequena e média dimensão são os treinadores que se queixam das condições de trabalho que gostariam de ter e não têm. No caso do SC Braga sucede o inverso, é o presidente a chamar a atenção de técnicos e jogadores que as condições que o clube lhes proporciona só os chamados grandes podem oferecer. O que eleva o grau de responsabilidade de Artur Jorge, forçado a pensar e a decidir como um grande.