Reflexão natalícia

OPINIÃO23.12.201923:37

Esta podia ser uma crónica igual a tantas outras, que falaria sobre o impacto positivo da época no espírito natalício de todos nós. Podia ser também uma mensagem de esperança, paz e alegria, pedindo o melhor de cada um, a cada um. Podia ser tudo isso e muito mais, mas... não é.
Sendo certo que é importante termos presente a essência do que nos move nesta quadra, é também importante que percebamos, em matéria de futebol, onde estamos e para onde queremos ir.
Na parte que me toca, a da arbitragem, o papel é ingrato, porque estive lá dentro muitos anos e sei bem o que é errar sem maldade. Hoje, a minha função exige-me exatamente o mesmo: análise imparcial, independência e liberdade. Liberdade para dizer o que penso, baseado na lei e na experiência acumulada.
Essa liberdade - que é tranversal e caminha, solta, pelo caminho que percorre - tende a ter os seus momentos de aperto, porque não raras vezes sente uma espécie de pressão camuflada que a tenta limitar. É tipo uma cortina de fumo invisível que parece querer abafar ou balizar a opinião, pedindo-lhe, sem pedir, que se renda a uma qualquer forma de status quo vigente.
Obviamente que essa nuvem negra vem de fora e nunca se vê. Mas não sendo palpável, mostra que ainda há quem não esteja habituado à modernice que é haver alguém de alma arejada, que responde, apenas e só, à sua consciência.
Essa liberdade permite-me, por exemplo, afirmar aquilo que é óbvio para todos: em termos de arbitragem, as coisas não têm corrido bem. Têm sido cometidos alguns erros feios, graves e até inexplicáveis. Erros que a tecnologia tem agora a obrigação de evitar ou atenuar, o que só não acontece por falta de sensibilidade, experiência, competência e, por vezes, de coragem de alguns dos seus agentes. Infelizmente, alguns desses erros (os mais mediáticos) têm sido o mote que tantos precisam para a vitimização, para o desvio de atenções e para o fomentar de guerrilhas que nada têm a ver com arbitragem ou, sequer, com futebol. Incomoda-me que nos ponhamos a jeito para sermos a arma de arremesso de uns contra outros.
A outra parte da reflexão que esta liberdade permite é a de lançar uma pergunta final: será que, na verdade, o nosso futebol merece arbitragens melhores? O mesmo futebol que tem estádios vazios e que divide receitas televisivas de forma tão desequilibrada e incongruente? O mesmo futebol que aprova um calendário com pausas prolongadas, que poucos percebem, entendem e aceitam? O mesmo futebol que insiste em ter casos de polícia a amontoarem-se nas prateleiras da justiça? O mesmo futebol que se distancia, cada vez mais, da competitividade internacional e que se move, internamente, por um campeonato de dois ou três e pouco mais? Então o mal do nosso futebol assentará, na realidade, nos erros de árbitros e VAR ou não há aqui matéria para elevarmos a discussão para outro patamar? Não é para quem quer. É só para quem pode... e nem todos podem.
Boas-festas.