Queres falar de penáltis?

O que estou a dizer é que hoje quero falar contigo de outras coisas...

TENS a certeza que queres falar de penáltis? Por mim tudo bem, mas primeiro quero falar-te do que sente um pai que tem um filho a um palmo de distância física, mas preso num outro universo de forças superiores às próprias forças. Um muro que tardas em conseguir derrubar, sem saber se por ele não deixar, se por não saberes como.

Tens a certeza que queres falar de penáltis? Por mim tudo bem, mas primeiro quero falar-te do que sente um pai quando olha para trás e percebe, chocado, que se desviou da rota traçada e que todas as pegadas gravadas no chão são provas dos seus erros e ausências.

Tens a certeza que queres falar de penáltis? Por mim tudo bem, mas primeiro quero falar-te de segundos que se tornam minutos, os minutos em horas, as horas em dias e estes em semanas, meses e anos. Triturados em farinha fina que foge pelos dedos.

Tens a certeza que queres falar de penáltis? Por mim tudo bem, mas primeiro gostava de te ouvir sobre como derrubar muros, atalhar caminhos ou prender em punhos cerrados os segundos, minutos, horas, dias, semanas, meses e anos.

Tens a certeza que queres falar de penáltis? Atenção, não quero que penses que não valorizo estares aborrecido com o árbitro. Nem estou a insinuar nenhuma crítica às tuas prioridades. O moralismo é vírus que nunca me infetou, por uma questão de personalidade e aversão ao ridículo. Manifesto-me  incompetente, por absoluta ausência de autoridade, na tarefa de dar lições de moral.

Tens a certeza que queres falar de penáltis? Por mim tudo bem e podes até evocar Arrigo Sacchi, para quem «o futebol é a mais importante das coisas menos importantes». Não concordo, peca por defeito. Mais depressa subscrevo o que disse Bill Shankly, para quem «um jogo de futebol não é uma questão de vida ou morte, é muito mais do que isso». Tem razão o antigo jogador e treinador escocês. Um jogo de futebol é caráter, é sacrifício, é união, é sonho, é glória, é beleza. E isso é muito mais do que apenas estar vivo.

Meu caro, no fundo o que te estou a dizer é que, hoje, quero falar contigo de outras coisas.

Tens mesmo a certeza que queres falar de penáltis?