Quem o feio ama...

OPINIÃO11.09.202004:00

Mister & Filhos

Sempre admirei as famílias unidas, amigas e grandes (bem sei que agora se chamam numerosas, mas ainda não me habituei às novas bulas politicamente correctas). Mas há limites. Ou melhor, não há. Mas deveria haver. Por exemplo: se um menino filho do presidente de um qualquer clube  tiver jeito, ou julgar ter, para ser intermediário (que a nova terminologia em voga insiste em chamar de empresário) deve poder transacionar livremente os valiosos activos que integrem o portfólio da sua carteira onde, quando e conforme muito bem entender. Com uma única e singular excepção: não no clube do papá, não no clube do papá. Por ser ilegal? No limite, sim, também por isso, mas sobretudo porque é feio. E, portanto, não parece bem. Nada bem.

E quem diz presidente pode dizer também treinador. Ainda me lembro bem da anterior passagem de Zidane pelo Real Madrid e do ridículo que rodeou a convocatória dos seus filhos. Claro que também aqui nada houve de ilegal. Mas se procurarmos hoje pela carreira dos rapazes podemos medir o quão ridículo foi o técnico francês. Que não deixa de ser bom treinador por ser bom pai. De resto, é essa  a natureza destas coisas: «Quem o feio ama, bonito lhe parece.» Dito isto, a equipa do FC Porto B dispensava bem a contratação dos préstimos de Rodrigo Conceição, que assim se junta no Dragão ao seu irmão Francisco, tanto mais que certamente não teria qualquer dificuldade em encontrar clubes condignos e à altura do seu talento.

Uma prodigiosa academia chamada Tombense

SE há coisa em que o Brasil pode sucumbir por excesso mas jamais por falta é o número de clubes de futebol. E o fenómeno incrementa exponencialmente se multiplicarmos o universo de todos esses clubes pela galáxia de atletas. Serve isto para atestar o quão difícil é a tarefa de garimpar preciosidades no meio de tamanho mundo de vulgaridades. Daí que não se possa deixar de relevar a (quase) absurda coincidência de o FC Porto ter seleccionado - seguramente após apertado escrutínio - o defesa-central João Marcelo, proveniente do Tombense e destinado, em princípio, para a equipa B, e o avançado Evanilson, com o fim de ser o goleador máximo do onze principal.

Expliquemo-nos: apesar de actuar ao serviço do Fluminense, os direitos económicos do jovem avançado pertenciam ao Tombense, que o tinha então emprestado ao histórico clube carioca. E foi exactamente com o Tombense Futebol Clube, da cidade de Tombos, no estado de Minas Gerais, presentemente a disputar o Campeonato Mineiro, que o FC Porto negociou a aquisição de Evanilson.

O atacante que joga de chapéu

Aqui há uns bons pares de anos, por alturas da sua metamorfose de actor banal em extraordinário realizador de cinema, o grande Clint Eastwood disse de si próprio que só tinha duas expressões: com chapéu e sem chapéu. O mesmo não poderá Evanilson dizer, pois que dos oito golos marcados com o emblema do tricolor nenhum foi obtido através de um cabeceamento. Quanto ao mais, tudo converge no sentido de se poder esperar muito deste jovem artista. Tem é de ter cabecinha.

Ponto de ordem

Comecemos então pelo princípio. Como já é da praxe, todos os anos o FC Porto contrata um guardião. Precise ou não. Desta vez calhou-nos o Cláudio Ramos. O que quer dizer um dos três melhores portugueses na posição. E ainda por cima sem custos de transferência. Logo, nada a opor. Foi indiscutivelmente uma boa decisão. Outra quase tradição da casa é a aquisição de um defesa-direito. E lá veio Carraça. Também a custo zero. É jogador já maduro mas que só há pouco tempo faz o posto. Aceite-se que venha para suplente e que nalgum momento peculiar possa vir a ser útil. Já para o lado oposto da defesa chegou dos Açores o nigeriano Zaidu. Apesar de pouco experiente é muito veloz. Inclino-me a crer que poderá vir a ser uma versão duplicada (mas com melhores dentes...) de Cissoko. Mesmo que o melhor marcador da equipa na época transacta não venha a sair.  O que nos conduz directamente ao ataque: ter cinco pontas de lança e nenhum deles ser capaz de se assumir como artilheiro dos Dragões não é só estranho: é intolerável. Daí não se estranhar a contratação do excelente Taremi e do prometedor Toni Martínez. E por mim chegavam. Por isso, nem eu nem ninguém esperava a vinda de Evanilson, que é ainda uma incógnita. Má, mesmo muito má, foi a venda a prazo de Vítor Ferreira, por 20 milhões, a fazer lembrar a saída de Rúben Neves, como se estivera em saldo. Já a venda de  Fábio Silva por 30 milhões (e não 40, pois 10 ficaram logo para os intermediários), considerando o seu histórico e o paralelo com a cedência de André Silva, se afigura como fazendo todo o sentido. Mas, enfim, o verdadeiro balanço só poderá ser concluído quando as portas de entradas e saídas se cerrarem.

A bola e o sítio

Novak Djokovic, tenista número 1 do ranking mundial, foi desqualificado nos quartos de final do US Open por ter acertado, involuntariamente, claro, com uma bola no pescoço da juíza de linha, que até ficou com falta de ar, coitada. Tão drástica e dramática decisão ainda levou vários minutos a ser tomada mas ditou mesmo a expulsão do tenista sérvio do Grand Slam dos EUA. Agora talvez também a juíza que não quer incorrer no risco de apanhar com outra bola de ténis se devesse mudar para diferente disciplina, como por exemplo passar a oficiar em provas de lançamentos do peso, do disco, do dardo e do martelo.

E agora se este caso se torna moda, por exemplo no futebol, onde não são raras as situações, nomeadamente nas barreiras formadas na marcação de livres, que levam os futebolistas a colocarem as mãos, por razão e instinto de protecção, sobre uma parte do corpo anatomicamente ainda mais sensível do que a garganta?