Pontapés de baliza. O que mudou?
As novas alterações às leis de jogo já entraram em vigor no início da época mas, bem antes disso, eram já do conhecimento público. Foram várias as plataformas online e os órgãos de comunicação social que deram disso a devida nota.
O certo é que, como é normal, as dúvidas só começam a surgir quando as situações acontecem na prática. Dentro do terreno de jogo. Em pleno relvado.
Uma das muitas mudanças que ocorreram foi relativa ao procedimento do Pontapé de Baliza (previsto na Lei 16).
Até ao final da época passada, a bola só entrava em jogo quando, depois de pontapeada, saía por completo da área de penálti (vulgo grande área), para dentro de terreno de jogo. Ora, não raras vezes, essa premissa potenciava a prática de anti-jogo, aquilo que, há vários anos, o International Board tem tentado abolir. Era comum vermos defesas a tocarem na bola antes desta sair da área apenas para levar o árbitro a ordenar a repetição do respetivo pontapé. Espertinhos.
Precisamente para (tentar) evitar esse e outros subterfúgios, a partir de agora deixou de ser obrigatório que a bola saia da área, ou seja: o pontapé de baliza considera-se executado a partir do momento em que a bola é pontapeada e se mova claramente. Na prática, quando for tocada e role.
Em tese, isso permitiria maior fluidez ao jogo, visto que qualquer jogador adversário - que tem que estar obrigatoriamente fora da área até o pontapé ser executado - podia, logo aí, pressionar o defesa. Para além de terminar com a malandrice defensiva da perda de tempo, a alteração tentou imprimir mais dinâmica à partida, originando, quiçá, eventuais alterações táticas. Mas esta coisa de mudar as regras funciona como uma espécie de pescadinha de rabo na boca: por cada coisa que se construa, há quem seja célere a desconstrui-la e de forma inteligente. Sem ferir a lei, mas explorando as suas fragilidades ou lacunas. É assim no futebol e na vida. Ontem, hoje e sempre.
Vem isto a propósito de termos visto, ultimamente, uma nova espécie de pontapés de baliza: o GR levanta a bola para a cabeça do defesa (a bola entrou corretamente em jogo, porque foi pontapeada e moveu-se claramente) e este devolve-a ao colega, que a agarra.
Para que conste... tudo certo. Tudo legal. Apesar de cheirar a ludibriar o espírito da lei, a verdade é que esta é explorada sem ilegalidade, mesmo no que se refira a um possível atraso deliberado. Se um jogador levantasse a bola para a sua cabeça para a poder atrasar ao seu guardião (ato isolado de um só atleta), aí sim, haveria conduta antidesportiva, punida com cartão amarelo e pontapé livre indireto (mesmo que o GR não a agarrasse). Neste caso, a jogada envolve dois jogadores (GR e defesa), em duas jogadas distintas (pontapé de baliza executado e devolução de bola com cabeceamento), sem que nenhuma regra fosse atropelada.
Não sei se a ideia terá grandes vantagens práticas: executar o pontapé curto ou longo será sempre uma opção e, com a bola nas mãos, o GR passa a dispor dos tais 6 segundos para a despachar (penso que, por força disto, os árbitros serão mais intransigentes na contagem desse período). Mas a verdade é que, assim, resolveu-se o risco de jogar curto e perder a bola em zona altamente proibida.
O mesmo acontece em relação aos pontapés livres (Lei 13) favoráveis à equipa defensora na sua área de penálti: a bola também passou a entrar em jogo assim que é pontapeada e se mova claramente. Pode ser que o IFAB, que não contava com esta, mexa na coisa mais cedo ou mais tarde. Até que isso aconteça, a legalidade deste tipo de reposição é inatacável. Somos de uma criatividade incrível para umas coisas. Se fôssemos assim para tudo o que é realmente valioso no futebol, ninguém nos parava...