3 abril 2024, 21:58
João Sousa: «Sinto-me realizado»
Vimaranense abordou os primeiros momentos enquanto jogador reformado, em conferência de imprensa
A evidência caiu-me em cima com a força de uma entorse no tornozelo direito
Quando era mais jovem tinha alguma competência para jogar à bola. Não era apenas vaidade, eram os outros que também o reconheciam nos torneios e jogos em que participava com amigos em Chelas — atenção Sam The Kid, estamos juntos: Chelas, não Marvila.
Tínhamos lá no bairro uma equipa bem talentosa, diga-se como nota de rodapé, mas o tempo encarregou-se de nos fazer a todos descer à realidade e não foi um processo fácil. Para mim certamente que não foi — começar a perceber que imaginava tudo na minha cabeça, a jogada perfeita, mas que as pernas depois não obedeciam nesse sentido e o que antes eram instantes passavam a ser eternidades entre o momento em que os pensava e os executava.
A gota de água foi querer correr para a frente e haver uma força misteriosa que me abraçava e puxava para trás.
Mesmo assim fiz vista grossa à evidência, mas ela caiu-me em cima com a força de uma entorse no tornozelo direito que se ouviu de uma ponta à outra do campo no Restelo. Disse adeus sem glória.
Penso muitas vezes em voltar a jogar, mas tenho medo de me aleijar novamente e também medo de ficar muito desapontado com o rendimento, inevitável.
Ao meu nível e com boa dose de presunção, percebo os atletas de alta competição quando caminham para o final da carreira. É que na essência somos todos iguais, muda apenas o contexto e o que está à nossa volta. É difícil para todos admitir que acabou, que é o the end, que c’est fini. E muito mais difícil por isso é acertar no timing certo para sair por cima, quando ainda estamos a ganhar, ou pelo menos não a perder sempre.
Há dias, por exemplo, saiu de cena o melhor tenista português de todos os tempos, que na parte final da carreira talvez não tenha dado a devida importância aos sinais, mas que mereceria, certamente, um reconhecimento bem diferente de Portugal e dos portugueses neste ponto final: João Sousa. Despediu-se com derrotas em singulares e pares no Estoril Open deste ano, depois de entre outros marcos importantes ter conquistado quatro títulos ATP 250 (Kuala Lumpur em 2013, Valência em 2015, Estoril Open 2018 e Pune em 2022) e atingido — coisa nunca vista ou repetida — um 28.º lugar do ranking mundial. Fez o seu último jogo da carreira no passado dia três de abril, mas o momento foi, lamentavelmente, uma nota de rodapé no desporto português.
Não sou nem nunca fui entusiasta da modalidade, mas se cresci também a olhar para ela foi muito por causa de João Sousa.
Não será o melhor timing do mundo, mas aqui vai: obrigado, João.
3 abril 2024, 21:58
Vimaranense abordou os primeiros momentos enquanto jogador reformado, em conferência de imprensa