O futebol e o Governo

OPINIÃO06.01.202103:00

Para além de decisões imperfeitas, da ausência de diálogo, há gestos que dizem muito. No último jogo da época anterior, na final da Taça de Portugal, os mais altos cargos da Nação estiveram presentes. Contrastando com essa presença habitual na temporada presente, em Aveiro não compareceram: o Presidente da República, o primeiro-ministro (em quarentena), o ministro responsável pela tutela do futebol, assim como o secretário de Estado da Juventude e do Desporto. O futebol, que tem uma contribuição de relevo para o PIB, não lhes mereceu a devida atenção! A pandemia criou uma situação de catástrofe também para o desporto. Para além da ausência das entidades oficiais na Supertaça, ficou provado como encaram as áreas da sua responsabilidade: essa não presença comum confirma as dúvidas. Foi testada a presença reduzida de público nos estádios, sem problemas. Depois dos testes, pararam sem justificação. A UEFA aceita uma percentagem reduzida de espectadores nos estádios com regras definidas. Em Portugal falta a coerência ou a competência? O presidente do FC Porto afirmou: «Sinceramente, eu julgo que já não há secretário de Estado do Desporto. Estou convencido disso, não me lembro de o ver, houve uma final da Supertaça onde estavam os dois maiores clubes portugueses, onde sempre estiveram governantes no futebol…»

Será que as vitórias do FC Porto causam assim tão má disposição? O presidente do FC Porto manifestou a dúvida sobre o teste-piloto com público no estádio, no jogo no Dragão com o Olympiakos, para a Champions, que não teve a devida sequência, tanto mais que tudo correu muito bem, sem problemas e afirmou: «Só tem uma explicação, estavam à espera que houvesse problemas para poder justificar a atitude que tinham tomado.» Como diz o povo, «saiu-lhes o tiro pela culatra» e em vez de frontalidade, recolheram-se ao silêncio. Se foram permitidos espetáculos em salas recheadas de público e se os testes-piloto para o futebol decorreram sem problemas, qual a razão de condenar o futebol a uma situação diferente das outras atividades com público? Haverá objetivo mais focado?  

Liga

Num universo de pouco mais de um terço do campeonato, é oportuno identificar pormenores para aprofundar ou corrigir, analisar alterações significativas na classificação, destaque de jogadores que se evidenciaram e outros aspetos. Após liderança do Benfica e do FC Porto, o Sporting mantém-se em primeiro. É certo que das equipas de topo é a única sem desgaste porque cedo foi eliminado das provas europeias e portanto com tempo para recuperação e estruturação do seu modelo. A jornada mais concretizadora foi a primeira (29 golos) e a que teve menor número de golos foi a 10.ª (15 golos). Os clubes que disputam o título são quatro, mesmo após o último resultado do SC Braga em Alvalade, pois falta muita prova. O FC Porto, envolvido em várias frentes, num percurso com mais competições e menos tempo de recuperação (prestes a entrar em nova fase de densidade competitiva) tem sido reconhecido como exemplar. O quinto lugar com acesso às provas europeias, a partir da nona jornada, é ocupado pelo Vitória de Guimarães, seguido de perto pelo Paços de Ferreira. FC Porto é a equipa com mais golos marcados (31). Portimonense, Farense, Boavista, Belenenses SAD, Tondela, e a surpresa pela negativa do Rio Ave, apresentam dificuldades para saírem dos lugares de risco da descida de divisão, podendo alterar rapidamente, pois do oitavo lugar para o fundo da tabela, a diferença pontual é escassa. O SC Braga foi a Alvalade para vencer, criou oportunidades e o empate ao intervalo não traduziu a realidade do jogo. Sem lamentar falhas de jogadores essenciais, o SC Braga no segundo tempo voltou a criar oportunidades, porém o Sporting acabou por ser mais eficaz e vencer. Nos Açores, o jogo de domingo, Santa Clara com Benfica, foi adiado para segunda-feira, pelo estado do relvado após chuva intensa. No dia seguinte, Santa Clara empatou a 1 golo, após Benfica ter marcado em primeiro. Com este resultado Benfica passa para terceiro na classificação.

Prémios, esquecimentos e mudanças urgentes

1 - As galas para distinguir os melhores do século e do ano proliferam e, no Dubai, Cristiano Ronaldo e Jorge Mendes, nas respetivas categorias, são presença assídua.

Mais um evento mediático cujo objetivo é privilegiar investimentos, valorizar ativos, sem acrescentar algo importante ao futebol. Para além das categorias premiadas há sempre lapso esclarecedor. Os clubes existem porque há presidentes. São esses que também contribuem para o futebol como fenómeno global. Na lista dos vencedores, nunca é incluída a categoria de melhor presidente do século e do ano. Será para evitar distinguir o mais titulado e reconhecido do mundo, sem rival à altura: Jorge Nuno Pinto da Costa?

2 - «Um centímetro fora de jogo não é fora de jogo», afirmou o presidente da UEFA em março de 2020. A UEFA comprometeu-se a alargar linhas que servem para a análise do fora de jogo para se conseguirem mais golos. Época de 2020/2021 seria a época para corrigir decisões que desvalorizam princípios das leis de jogo. Cada competição escolhe o nível de rigor do sistema VAR. Linhas largas são consideradas melhores porque a sua colocação é subjetiva (mão humana, sem rigor tecnológico) por isso, as cirúrgicas injustiças e incoerências. O presidente da UEFA confessou que lances de bola na mão são problema complexo sem uniformização eficiente. Um jogo que se deseja vivo, com ritmo intenso, fluído, acabou por se transformar em pausas sistemáticas, alegrias que viram em frustrações, por uma decisão que afinal continua a depender completamente do fator humano. Preciosismos acabam por ser justificações técnicas para outras aventuras…

Mais uma corrida, mais uma viagem!

Serão mais de 5200 km que o FC Porto vai fazer nos próximos 41 dias. A viagem começou em Guimarães (29/12), recebeu Moreirense (03/01), vai a Famalicão (08/01), joga com Nacional da Madeira (12/01), joga no Dragão com Benfica (15/01), vai a Leiria disputar meia-final da Taça da Liga com Sporting (19/01). Se for apurado para final da Taça da Liga, joga essa final ainda em Leiria (23/01) e se não for apurado, joga no Algarve com Farense (24/01 - caso jogue a final este jogo fica adiado), recebe no Dragão o Rio Ave (31/01), vai ao Jamor para jogar com Belenenses SAD (03/02) e conclui esta volta ao mundo na cidade dos Arcebispos contra o SC Braga (07/02). Uma viagem com cerca de 5.200 km em 41 dias é tarefa grandiosa, tanto mais que a seguir jogará a eliminatória da Champions com Juventus (17/02 em casa e 09/03 em Turim, com mais uns 1.900 km). O conceito de recuperação deve ter tirado férias… O FC Porto será um dos campeões a ganhar muitas milhas para viagens futuras, embora a enorme exigência criada pelo calendário competitivo revela bem o risco e a falta de ponderação a que são sujeitos os elementos indispensáveis ao futebol. Mas os campeões nunca desistem e procuram sempre mais e melhor, sem desculpas de mau pagador e dando o máximo em todas as ocasiões. O futebol carece de planificação adequada e não de sobrecargas que se tornam injustas, desiguais e potenciadoras de lesões.

Remate final

Valdano escreveu: «O futebol é infinito, mas em cada certo tempo elegemos uma palavra para encerrar a sua complexidade. Há um tempo foi a palavra atitude, depois foi a vez da intensidade e agora trata-se de competir. Pode perder-se por quatro a zero, mas se a equipa competiu, não há espaço para qualquer censura.»

Curiosa a sua apreciação sobre o português Trincão, após comentar que alguns dos jovens craques que surgem parecem revelar medo da baliza: «Pisam a bola, levantam a cabeça e tocam para o lado.»

Sinais de angústia que a formação deveria ter aperfeiçoado. Aguarda-se por um grande golo do talentoso Trincão que permita superar convincentemente a dúvida.