O futebol

OPINIÃO08.04.202207:00

Em 2010 Mourinho também «jogou feio» em Barcelona mas venceu a Liga dos Campeões!

OReal Madrid nunca tinha vencido o Chelsea. As duas equipas voltaram agora a encontrar-se, depois de na época passada o emblema inglês se ter imposto nas meias-finais da Champions, com total de 3-1. Nas quatro partidas anteriores, uma delas na Supertaça Europeia de 1998 (1-0 para o Chelsea), o melhor que o Real conseguiu foram dois empates. Desta vez, o diabo voltou a vestir a camisola 9 merengue e, como já o fizera no último jogo, com o PSG, o magistral Benzema assinou três golos e desfez os blues em pleno relvado de Stamford Bridge, bem no centro de Londres.

O atual campeão europeu talvez esteja ainda a tentar perceber o que realmente lhe aconteceu e que furacão foi aquele que lhe assolou o próprio estádio, mas, pelo sim, pelo não, talvez seja importante lembrar também que a equipa do alemão Thomas Tuchel, despedido em Paris, glorificado em Londres, acabou, no último fim de semana, arrasada, igualmente em casa (derrota, para a Liga, por 4-1), pelo modesto Brentford e aos pés, ainda, do ressuscitado Christian Erikssen, o internacional dinamarquês a viver agora uma incrivelmente luminosa segunda vida.

Aos 34 anos, e quando cumpre a 13.ª época (!!!) no Real Madrid, Benzema atinge a melhor performance de sempre, com 37 golos nos 36 jogos que leva de temporada, e, no mínimo, está, em termos de impacto (com 11 golos nesta Champions), ao nível de outro 9 fabuloso como é o polaco Lewandowski, do Bayern de Munique (que leva 12 na presente edição da maior prova de clubes).
Que mais se pode dizer? Que nos últimos 115 minutos que Benzema fez para a Champions marcou nada menos do que SEIS golos (praticamente um golo a cada 20 minutos…), e logo ao PSG e Chelsea.
Se há estatísticas realmente interessantes no futebol, são estas. Não é a posse de bola, número de remates, cantos, foras de jogo ou número de faltas. Com todo o respeito por quem pense o contrário.

NO futebol, como em qualquer outro jogo, não há um só caminho para se atingir o sucesso, por muito que nos custe, como amantes do espetáculo, ver como o Atl. Madrid saiu do relvado do Manchester City sem ter conseguido finalizar um único ataque. Lembro-me (eu e os leitores, certamente) de como José Mourinho preparou o Inter de Milão para superar, em Camp Nou, o Barcelona, em 2010, e chegar à final da Champions, que voltaria, naquele ano, a vencer.
Sim, é verdade que também Mourinho fez então na cidade condal o que Simeone levou o Atlético de Madrid a fazer, agora, em Manchester, com o City - praticamente duas linhas de cinco jogadores no meio campo defensivo para travar a esperada superioridade do adversário.

Curiosamente, Mourinho e Simeone acabaram por perder os jogos pelo mesmo resultado (0-1), mas enquanto Mourinho acabou, ainda assim, muito feliz e com a passagem à final assegurada graças à vitória que trazia da 1.ª mão (3-1, em Milão, sobre esse mesmo poderoso Barcelona), Simeone ainda está a desenhar estratégia para inverter a eliminatória com o City de Guardiola.
Vejamos, no entanto, a coisa pelo outro lado: todos nos lembramos desse Inter de Mourinho tão excessivamente defensivo em Camp Nou, mas poucos se lembram, pelos vistos, da extraordinária exibição da equipa da equipa de Mourinho na 1.ª mão, e da clara superioridade do Inter sobre aquele lendário Barcelona (vitória, como disse, por 3-1).

Muitos criticam, ainda (como eu próprio, às vezes, confesso), o futebol de Simeone, e somos capazes de o acusar de antifutebol ao vermos o jogo que o Atlético de Madrid fez esta semana perante o atual campeão inglês. Mas, porventura, já ninguém se lembra (ou quer lembrar-se…) do que Simeone já deu ao Atlético de Madrid. E deu muito.
Creio que na Europa nenhum clube de topo tem o mesmo treinador há tantos anos como está Diego Simeone no Atlético madrileno (vai na 11.ª temporada!!!). E a história já não se apaga: 2 Ligas espanholas, 2 Ligas Europa, uma Supertaça europeia, uma Taça do Rei, uma Supertaça espanhola, e a presença em duas finais da Liga dos Campeões.

Talvez por isso, Pep Guardiola guarde tanto respeito a Simeone, e em lugar de criticar o jogo do Atlético de Madrid ou acusar o treinador adversário fosse do que fosse (como faríamos, facilmente, em Portugal), Guardiola limitou-se a afirmar que perante um adversário com estratégia assim, torna-se «muito mais difícil; não há espaço para atacar».
O mesmo Guardiola que já tinha defendido Simeone, acusado, entre nós, os latinos, de pôr o Atlético a jogar o que dizemos ser um «futebol feio». «Mas o que é isso de jogar feio?», perguntou Guardiola, dando, ao mesmo tempo, um exemplo. «A minha equipa venceu 1-0 em Old Trafford [o rival United] e o Bernardo Silva gastou cinco minutos junto à marca do pontapé de canto. Isso não é feio; faz parte do jogo!»
O que a História regista são, antes de tudo, resultados, e Guardiola sabe que por muitos elogios que lhe dediquem (com toda a justiça) a verdade é que o seu Manchester City (provavelmente, a par do PSG, o mais rico clube do mundo) não tem ainda uma única Liga dos Campeões!

Há 12 anos, o Inter de Mourinho conseguiu uma, apesar da sempre tão lembrada, e tão criticada, estratégia que Mourinho aplicou no tal jogo em Barcelona. Mas a História não poderá esquecer o sucesso de Mourinho e daquele Inter.
O que certamente já ninguém quer saber é se esse mesmo Inter, ainda agora, 12 anos depois, por exemplo, foi francamente melhor do que o Liverpool, nos oitavos de final da prova (grande exibição em casa e derrota por 0-2, boa exibição fora e vitória, insuficiente, por 1-0!). Foi melhor mas perdeu. Paciência.
Assim sendo, o que passa é a mensagem de que o Liverpool do senhor Klopp é que é uma máquina - e às vezes, na verdade, não é, como não foi com o Inter, apesar de ter acabado por seguir em frente. Que é mesmo o que interessa. Seguir em frente!
Sem ludibriar, sem enganar, sem falsear, mas podendo, cada um, usar a estratégia que melhor lhe pareça servir o objetivo da equipa que treina. O jogo também é isso.

POR ter ido jogar para o PSG, Messi não deixou evidentemente de ser o prodigioso futebolista que sempre foi no Barcelona. Parece, simplesmente, muito menos feliz na capital francesa, e isso não pode deixar de se refletir. Ele é, aliás, a prova evidente de que, para um jogador de futebol profissional, basta não se sentir inteiramente feliz para não conseguir jogar realmente o que pode e sabe. Falo do futebol, mas podia falar de outra coisa qualquer, sendo que talvez no futebol a questão seja mais evidente, porque o futebol exige o que menos natural é no Homem, jogar uma bola com os pés.

Apesar de jogar com craques como Neymar ou Mbappé - o jovem que será, porventura, o melhor futebolista mundial do momento -, a verdade é que Messi, por mais voltas que o PSG vá dando, não consegue brilhar como sempre conseguiu no Barcelona, e nos 28 jogos já feitos esta época pelos multimilionário parisienses (por entre as dificuldades provocadas por problema ósseo no joelho esquerdo), Messi apontou apenas oito golos, apesar das 11 assistências. Realmente pouco para o talento e classe de Messi, fortemente criticado e acusado de tudo e mais alguma coisa após a eliminação do PSG na Liga dos Campeões aos pés do Real Madrid.
Ainda assim, e compreensivelmente, não falta quem apoie Messi, sobretudo no país de origem (ao contrário do que sucede, por vezes, com Ronaldo, em tantas ocasiões, inacreditavelmente mais criticado no próprio país do que fora dele!...).

Apesar da surreal quantidade de dinheiro que o PSG lhe paga, é agora que se sente menos feliz na cancha, como os argentinos chamam ao campo de jogo, que Messi mais precisa naturalmente do carinho dos seus, e ainda recentemente, o nosso bem conhecido Pablo Aimar (que saudades de o ver na Liga portuguesa…), ídolo de infância do próprio Messi, teve esta tirada: «Como um dia disse Kobe Bryant [a estrela da NBA dramaticamente desaparecida em 2020], que jogava os jogos, sobretudo no final da carreira, a pensar nos que o veriam ao vivo apenas uma única vez, a mim também me parece que Messi joga um pouco a pensar naqueles que talvez o possam ver jogar ao vivo apenas uma vez.»
O elogio, a simpatia e o carinho de Aimar encaixam bem, evidentemente, na admiração que o mundo do futebol (e não só) deve ter por Messi. Por muito dinheiro que ganhem (e ganham, na verdade, o que alguém decide pagar-lhes!!!) os futebolistas não são de ferro e muito menos respondem ao insert coin (meta a moeda) a que nos habituámos nos jogos de feira. O que Messi já deu ao futebol, e o que já nos deu a todos nós, os que amam o jogo, é inesquecível. Não lhe façam funerais; façam-lhe homenagens!

PS: Confesso que era para ter escrito sobre o Benfica-Liverpool mas, sem qualquer arrogância, desisti. Não houve penálti sobre Darwin? O Liverpool ganharia sempre o jogo mesmo que Benfica fizesse, eventualmente, o 2-2? Bom, creio não ter argumentos. Há alguém, no seu perfeito juízo, que não reconheça a força do Liverpool, que nas últimas três vezes que visitou o Estádio do Dragão, por exemplo, fez 14 golos?!...