Janeiro é outro jogo

OPINIÃO26.01.202305:30

Parte importante dos lucros do futebol profissional deve ter como destino a formação

NUM ano atípico, abriu-se a janela de inverno para as transferências internacionais na Europa. Novas contratações inauguram a fase de transferências a meio da época de 2022/23, fechando a janela no último dia do mês. O Mundial serviu também para descobertas de talento e circulação de muitos milhões. Surgiram oportunidades de futuro e também possibilidade de enfraquecimento de adversários diretos, sem o mesmo poder de compra. Em diversas situações, são inúmeras as pretensas contratações, embora muitas se desfaçam sem brilho.

Momento importante que deveria exigir análises rigorosas para impedir eventuais negócios, por vezes difíceis de descodificar, particularmente nas diversas situações que conduzem a fracionamentos de verbas avultadas, com possibilidades de acrescentar valor. Os milhões, venham de onde vierem, têm de ser escrutinados com transparência, sem subterfúgios que podem sempre acontecer. As Big Five são o maior mercado qualificado, embora o capital a circular merece cuidada e especial atenção, porquanto já não se ouve falar muito do fair play financeiro… A compra e venda de clubes tornou-se um hábito que alastra e que pode subverter a intensidade de apoio dos adeptos.

Com as mudanças de paradigma desta época, a Europa deve unir-se para valorizar as competições, resistindo a promessas tentadoras que podem criar fraturas profundas na realidade do jogo. O que distingue o futebol dos outros negócios é sua dimensão, a identificação dos adeptos com os clubes, a paixão pelos símbolos, a lealdade e reconhecimento para com os jogadores e treinadores. A mística do futebol transforma os clubes em algo de fábula, que agrega gerações e constrói universos próprios. Viver um jogo, como adepto, é experiência inesquecível. Os excessos críticos fazem parte do ambiente, alternando vitórias ou quedas, em cada semana, sempre com lealdade, com união dos que correm nos relvados, dos que aplaudem e cantam sem parar. Como universo ímpar, tem sido atacado de diversas formas, particularmente com dúvidas sobre investimentos, suspeitas de corrupção e injustiças sobre quem não atinge as metas ambicionadas. O futebol nunca será uma loja de artigos diversos, uma atividade de rotina, mas sempre um espaço de sonho ou pesadelo, com renascimentos contínuos após uma derrota.

A criação de uma forte entidade reguladora do mercado de transferências, serviria para controlar realidades financeiras com transparência. Desse modo, combate-se a fraude fiscal, defende-se a verdade desportiva e controlam-se as incompatibilidades. Há uma tendência que por vezes levanta questões pertinentes sobre a circulação de capitais, que dão impressão de fuga para a frente, num drible estranho, constante, criando, por vezes, queda abrupta. E nesse momento, percebem-se as trágicas consequências. Em vez de procurar estabilidade e competitividade que atrai público e receitas importantes, evitem habilidades e esquemas que podem ser elogiados no momento, mas que vão deixar um rasto de desespero e fuga de responsabilidades. Num jogo, além da administração e direção, somente os jogadores, treinadores e staff, constroem momentos inesquecíveis. Ainda hoje, adultos com idade avançada, trocam ideias com jovens, construindo a imortalidade de muitos jogadores.

A memória no futebol tem um valor muito elevado e terá sempre reconhecimento e admiração. Por isso, quando vemos esquemas estranhos, pressões que são injustas, erros constantes e falta de diálogo, precisamos de gente com frontalidade, conhecimento e saber, sem oportunismos destrutivos. Que o futebol vença a luta imprescindível contra esquemas prejudiciais, para continuar a ser a inteligência em movimento. Sugestão: uma parte importante dos lucros do futebol profissional devem ter como destino a vertente da formação, pois aí se prepara o amanhã.


LIGA 

OFC Porto foi a Guimarães defrontar o Vitória local, num jogo muito intenso, com demasiados cartões amarelos, numa partida com muitas faltas, na qual os azuis e brancos procuraram controlar o ritmo e o adversário, sempre a lutar sem dar tréguas. FC Porto venceu com mérito e com um golaço de João Mário. O Arouca, a lutar pela zona das competições europeias, mais uma vez goleou e, desta vez, o Portimonense. O Sporting só aos 95´ conseguiu marcar o golo da vitória, numa grande penalidade contra o Vizela, e o Braga conseguiu superar o Paços de Ferreira, também com uma grande penalidade aos 98’. O Benfica foi aos Açores vencer os locais por 3 golos sem resposta. A surpresa maior foi o Gil Vicente ter ido vencer, com mérito, o Casa Pia, em fase menos positiva, no Estádio Nacional. O Marítimo marcou no início e superou o Estoril. Em Famalicão, o empate com o Rio Ave fica a dever-se à defesa de uma grande penalidade pelo guarda-redes de Vila do Conde, perto do fim do jogo. O Boavista controlou a primeira parte e marcou, mas o Chaves cresceu na segunda parte e empatou. 
 

CURIOSIDADES

A famigerada Chicotada Psicológica é usual no futebol, em todos os países. Portugal não foge à regra. Todos a reconhecem como necessidade, na maior parte dos casos. O futebol sempre serviu e serve de comparações com o universo da política. Assim como o Presidente da República é figura principal da Nação, num paralelismo simbólico, o líder de um clube/SAD é o seu Presidente. Só ele, em caso do clube se manter em zonas de risco, sem qualidade de jogo, sem atrair adeptos, em situação de perder possibilidades de chegar ao título, de descer de divisão ou ficar fora das competições europeias, deve tomar decisões eficazes na esperança de melhorar a classificação e dar garantias de maior segurança. Deve demitir o Manager (correspondente na política ao Primeiro Ministro), escolhendo outro com maior capacidade e currículo com provas dadas, para construir modelo melhor e mais seguro. Desse modo, com nova e distinta metodologia, confia-se que o novo mister, seja capaz de assumir toda a responsabilidade, com autonomia absoluta, para comprar e vender, substituir e despedir, com decisão autónoma. É sua função motivar os jogadores (tal como ministros, secretários de Estado e staff) para reverter uma classificação que já provou a incapacidade da equipa e, essencialmente, da liderança. Muitas vezes, são diversas as semelhanças da política com o futebol. Por isso, a competência, seja em que área for, nunca pode ser desprezada por escolhas infelizes e inadequadas. Só desse modo se podem evitar desastres anunciados e regressar a um modelo de funcionamento vencedor. E se há coincidências, no futebol são momentos, na política é destino de vidas que merecem o máximo de atenção para conquistar o futuro. O desempenho dos altos cargos políticos, com visibilidade na Europa e no Mundo (incluindo também UEFA e FIFA) ainda não consegue atingir o brilhantismo dos jogadores e treinadores portugueses. Embora se possam detetar raras semelhanças.
 

TAÇA DA LIGA

NO Estádio Dr. Magalhães Pessoa, em Leiria, a Final Four foi preparada com todos os cuidados, para ser uma grande festa. Na primeira meia-final defrontaram-se o Arouca e o Sporting, com a vitória dos leões (1-2), após uma arbitragem muito infeliz. No dia seguinte, foi a vez do FC Porto jogar com o Académico de Viseu, num confronto entre dois amigos e antigos colegas de equipa, duas referências do nosso futebol: FC Porto venceu o Académico de Viseu por 3-0, num jogo disputado, dando oportunidades a alguns jovens de grande qualidade. A final terá lugar no sábado (28), entre Sporting e FC Porto.
 

CONTRIBUTOS

É urgente aumentar o tempo útil de jogo: nos lances em que a bola sai fora das linhas de jogo e reentra em jogo, o tempo deve continuar, pois todos os estádios têm os jovens apanha-bolas que as colocam rapidamente em jogo; no caso de substituições, lesões, festejos de golo e ação do VAR, o tempo deve parar. No Catar, testou-se e bem a alargamento de tempo útil de jogo, com prolongamentos superiores a 10 minutos para compensar perdas de tempo. O International Football Association Board (IFAB) está a mudar o futebol, pensando na possibilidade das comunicações entre o VAR e o árbitro serem transmitidas na instalação sonora dos estádios, sempre em direto. Essa sugestão vai ser testada nos próximos 12 meses, a começar no próximo Mundial de Clubes, em Marrocos. Em debate, também estão a ser pensadas medidas para impedir casos de violência contra árbitros, jogadores e treinadores nos escalões de formações e no futebol amador, para o qual será criado um grupo de trabalho para tomar medidas, após o diagnóstico.
 

SEM DIVULGAÇÃO

AComunicação Social divulgou que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) alterou normas dos seus estatutos, para poder continuar a receber verbas do Estado, num montante de aproximadamente 2,2 milhões de euros/ano, podendo desse modo candidatar-se à renovação do Estatuto de Utilidade Pública, exigido pelo Instituto do Desporto e Juventude, para poder continuar a ter o direito de receber verbas provenientes do Estado. Essas alterações, sem divulgação pública, foram aprovadas na última Assembleia Extraordinária. São vários os clubes mais modestos, nos quais os jogadores vivem momento difícil, não recebendo salários, com as SAD/clubes que não garantem sustentabilidade, antes aventureirismos que vão minando a sobrevivência dos clubes e o prejuízo dos atletas. Apesar do Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol (SJPF) acionar o Fundo de Garantia Salarial, os reduzidos montantes para cada jogador só ajudam nas urgências. É imprescindível, no início de cada campeonato, exigir as condições que garantam o cumprimento dos orçamentos. O futebol precisa de estabilidade, de rigor e nunca de promessas que desaparecem antes do meio dos campeonatos. As SAD/clubes devem ter obrigação de apresentar garantias reconhecidas, para evitar que jogadores fiquem em condições inaceitáveis. A FPF e a Liga devem impedir esses episódios lamentáveis, que degradam a imagem do nosso futebol e causam problemas graves a jogadores e suas famílias. Com lucros vultuosos, a FPF já deveria ter investido num órgão que garantisse a possibilidade de evitar essas faltas de pagamento de ordenados, até ao fim de cada época. Isso está nas mãos da FPF e da Liga.
 

REMATE FINAL 

— Sérgio Conceição, no final do jogo em Guimarães afirmou: «Não há campeões de inverno. Há o título de campeão de inverno para quem vence a Taça da Liga, mas o campeão é conhecido em maio (…) A equipa continua competente, temos feito um bom trajeto na Champions, mas houve coisas que não correram tão bem e esse é o primeiro passo para melhorar (…) Estes jogos ganham-se desta forma, às vezes sem nota artística».