Homem rico, livre e disponível
A partir de agora o ruído não é mais o Man. United mas o clube para onde ‘el comandante’ vai jogar a seguir
OManchester United comunicou em nota oficial o divórcio com Ronaldo «por mútuo acordo» e a Seleção passou a ter um jogador livre (e certamente mais aliviado) nos seus quadros, a dois dias da estreia no Mundial. Por tudo o que aconteceu nos últimos quatro meses, ainda bem que as partes desavindas decidiram separar-se de forma civilizada. O Man. United é um grande clube, dos maiores do Mundo, e não podia sujeitar-se à continuação desta pouco edificante novela nos jornais, quiçá nos tribunais (há muita gente em Inglaterra que concorda com as críticas que o português fez ao clube na entrevista a Piers Morgan). O mesmo se diga relativamente a Cristiano, que é uma lenda viva do desporto e tem uma imagem a defender.
Lá se falou outra vez de Ronaldo - oh, coitado - mas não acredito que os outros jogadores da Seleção portuguesa, ao fim de tantos anos a levarem com o mesmo, se sintam desconsiderados ou ofendidos no amor-próprio. A explicação é tão simples que nem devia trazê-la aqui. Mas trago. Ronaldo tem mais atenção do que os colegas todos juntos porque é uma estrela planetária e vive num patamar de notoriedade/popularidade inalcançável para jogadores normais. Eu até diria que o patamar onde Cristiano se movimenta é único no desporto atual. E isso acontece por outro motivo muito simples: ele fez por isso. Se algum dos colegas de Cristiano na Seleção se sente melindrado com o facto de o capitão continuar a ser o centro de todas as atenções, pois tem bom remédio: faça o que ele fez nos relvados, que é maneira garantida de chegar a esse patamar.
Livre, fabulosamente rico e disponível, Cristiano inicia o seu último Campeonato do Mundo sem clube. Para ele o Catar é um desafio, mas também uma montra. Porventura a rampa de lançamento para o penúltimo clube na carreira. A partir de agora, o tema não é mais o United, mas o clube para onde El Comandante vai jogar a seguir. Quer isto dizer que Ronaldo, goste-se ou não dele, continuará a ser o centro de todas as atenções. Oh, coitado.
Cristiano Ronaldo, 37 anos, está ao serviço da Seleção Nacional no Mundial do Catar, agora já sem ligação ao Manchester United
LOURA COM ÓCULOS
GIANNI INFANTINO tem nome de supositório infantil e diz que sofreu na infância por ser ruivo e sardento. Hoje é calvo e diz palermices - sofremos nós. Annie Leibovitz é americana, loura e usa óculos, não se sabendo se alguém na escola lhe chamava c’átrolhos. Fotógrafa e retratista famosa, companheira da escritora e filósofa Susan Sontag até à morte desta, Annie tornou-se uma espécie de papisa fotográfica do showbiz americano e a retratista oficial de tudo o que é celebridade (não importando o motivo nem o mérito). Acompanho o trabalho dela há muitos muitos anos (na Rolling Stone, onde começou e fez o shot que a imortalizou - John Lennon e Yoko Ono abraçados, poucas horas antes de ele ser assassinado por um desequilibrado mental à entrada de casa em New York; e na Vanity Fair de Graydon Carter onde realizava os sumptuosos (e caríssimos!) portfolios anuais dedicados a Hollywood - tenho-os todos. Toda a gente conhece aquele famosíssimo retrato de Demi Moore grávida e nua - é dela; tal como o da comediante Whoopi Goldberg mergulhada numa banheira cheia de leite - é dela; tal como a do boss Bruce Springsteen (de costas) na capa do LP Born in the USA - é dela.
Annie juntou uma dupla de peso à longa lista de celebridades em que se incluem, por exemplo, a Rainha de Inglaterra, Michael Jackson e Bill Gates. Ela fotografou Messi e Cristiano, frente a frente, a jogarem xadrez em cima de uma mala de viagem signé Louis Vuitton. É a foto do Mundial do Catar, aconteça o que acontecer, e as pessoas nem se vão lembrar que aquilo é publicidade. Um retrato forte, surpreendentemente intimista, esteticamente belíssimo; naturalmente destinado a ficar icónico na memória coletiva (espalhou-se como fogo pelas redes sociais e garantiu a Ronaldo mais dois milhões e seguidores no Instagram em apenas dois dias).
«Juntar» (entre aspas, sim, que ela fotografou-os separadamente) as duas estrelas maiores do planeta futebol, quiçá os dois maiores rivais desportivos de sempre, é mais um feito na longa carreira da Leibovitz (tem 73 anos). Lembro-me dos retratos fortes que ela fez a Lance Armstrong e Serena Williams. Comparados com este, parecem fotos de rodapé.
E lá se falou outra vez de Ronaldo. Oh, coitado.
Mbappé e Giroud na festa do golo francês
O CAMPEÃO VOLTOU
ONTEM a Austrália começou por ser atrevida com a França (picou logo aos 9’) mas depois sentiu na pele toda a potência e versatilidade do campeão mundial que, mesmo desfalcado de vários pesos pesados (nomeadamente Benzema, N’Golo Kanté e Pogba), mostrou que tem argumentos para tentar o bi no Catar. A solidez de Rabiot, a inteligência de Griezmann, o instinto matador de Giroud (igualou os 51 golos de Thierry Henry com os bleus) e, acima de tudo, a técnica, a velocidade e o repentismo desse fabuloso futebolista que é Kylian Mbappé.
Ui. A França meteu medo no dia em que a aura de Messi, na estreia do seu quinto Mundial, foi suplantada pela magnificência do golo da vitória saudita, apontado por Salem Al Dawsari, um ilustre desconhecido até ontem; no dia em que a fama de Robert Lewandowski como finalizador letal foi suplantada pela agilidade do não menos famoso Guillermo Ochoa (37 anos) que, na estreia do seu quinto Mundial, assinou uma defesa para a imortalidade, seguramente cantada por 130 milhões de mexicanos. A Argentina caiu com estrondo e deixou no ar uma inesperada imagem de impotência. Teve 51 minutos para recuperar do golpe (1-2) e não foi capaz. O próximo jogo, no sábado com o México de Ochoa, passou a ser uma final. Nova derrota e adiós.
Para terminar. Estou a gostar muito dos adeptos que acompanham a nossa e as outras seleções. São todos tão parecidos naquela emoção e entrega que se vê perfeitamente que é genuína! E ainda dizem que o futebol não aproxima os povos. Claro que aproxima. Vejam os indianos, tão próximos de todos. E não acreditem se ouvirem que alguns deles já foram vistos a emocionarem-se com camisolas e bandeiras de seleções diferentes.
PS — Sugestões de personas para Gianni Infantino encarnar nos próximos dias: tanoeiro; eletricista; forcado; louro; polícia sinaleiro; meliante; Dâmaso de Salcede; ladrilhador; drag-queen; vigilante de exames; spider-man; supositório infantil; Lance Armstrong; Tony Silva; babysitter; prisioneiro de Azkaban; bandarilheiro; Jeff Bezos; guerrilheiro checheno.