Golo na própria baliza

Golo na própria baliza

OPINIÃO09.03.202305:30

Estamos no momento certo para preparar, com o devido tempo, uma nova época com mais dignidade e excelência no futebol

Ovoto de silêncio de Sérgio Conceição, que reagiu assim a queixa da Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF), é a estratégia mais adequada para impedi-lo de percorrer uma espécie de caminho da infelicidade e alimentar as guerras que destroem o futebol. 

A liberdade de expressão constitui tanto um direito como uma obrigação. Quando uma qualquer entidade sai em defesa de um dos seus membros, para tentar castigar ou limitar o poder de opinar com fundamentos de quem criticou, fica a ideia do desconhecimento do diálogo democrático. A prepotência é algo que não tem cabimento em nenhum país civilizado. Só faltava agora que uma associação de árbitros pensasse que está acima de todos os outros participantes no futebol! Não pode perder-se o acompanhamento dos tempos. O treinador do FC Porto, como o fazem muitos milhares de portugueses, manifestou a sua opinião livremente, mas há sempre quem pretenda insistir em tema esgotado, tal- vez com interesse na criação de polé- micas: há gente que prefere a ameaça ao diálogo - feitios! Penso que  todos concordam que, naturalmente, existem diferenças de opinião sobre os mesmos factos. O que é estranho, por alguns pormenores de eventual incapacidade da tecnologia do VAR, com humanos a utilizá-la e interpretá-la, por que não conseguir-se sempre a decisão que respeite o protocolo em vigor?

 O fundamentalismo destrói valores e a possibilidade de entendimento e não se pode permitir que, seja quem for, se dedique a alimentar um clima de guerra de forma inconsistente. É certo que a queixa da APAF, sem fundamento, acaba por revelar quem é incapaz de dialogar e, sistematicamente, julga que amedronta líderes competentes. Quem apresentou queixa sem fundamentos válidos, perde todo o sentido e deveria ser sancionado pela má imagem que causa ao futebol. Qualquer cidadão, a quem for apresentado um sistema infalível que garanta a verdade desportiva, mesmo com decisões inconciliáveis sistemáticas, deve ter o direito de protestar, já que os resultados não confirmam as promessas do investimento feito.

Basta um erro humano evidente para colocar em causa como se pode falhar, ou como para situações idênticas o VAR apresenta decisões opostas (que o digam os jogadores de Vizela e FC Porto). Queixas sistemáti- cas, como se não fosse possível discordar da APAF, deixa a impressão de nadador aflito por falta de capacidade de respiração! Que o VAR representa, genericamente, um progresso indispensável, estamos de acordo, mas as decisões contraditórias para casos idênticos arriscam a subversão dos resultados.

Fica ainda a convicção que o desacordo de opinião é mais específico. O VAR é muito importante para salvaguardar os resultados e a verdade desportiva, mas os árbitros nomeados para a tecnologia não o podem fazer por vontade própria, mas por exigência da função (o VAR até tem adjunto, mas para quê?). O Presidente da APAF, numa exaltação de defesa da seriedade dos árbitros nacionais, acabou por concordar que há «processos a melhorar…» no funcionamento do sistema, pois há falhas humanas que têm superar-se com urgência, por influenciarem os resultados: quem for prejudicado deveria merecer respeito e até um pedido de desculpas público.

Sérgio Conceição, como treinador prestigiado que é, inclusive na Champions, tem o direito de manter o silêncio e de não fazer a antevisão do jogo como protesto pela queixa sem sentido da APAF, por respeito a ambos os clubes. É a atitude mais adequada, por deixar alguns a falar sozinhos. Assim, mais tarde ou mais cedo, ninguém os ouvirá e, um dia, terão de ser aplicadas sanções a quem deixa no ar suspeitas de subversões, curiosamente quase sempre para os mesmos destinos. Vivemos em democracia e as polémicas sistemáticas implicam que as tutelas têm de resolver, com celeridade, o clima de desconfiança que polui o ambiente.

Sérgio Conceição e Pinto da Costa, respetivamente, treinador e presidente do FC Porto, foram os alvos de queixa, mais uma das tantas sem fundamento nos ventos que sopram sempre para o mesmo lado. Já passou o tempo das arbitrariedades e, se a direção de uma associação de árbitros persiste na estratégia, os seus membros devem defender os pares e evitar que os habituais que provocam polémicas sem sentido poderão sentir-se fora de prazo. A ausência de árbitros portugueses no Mundial ficou a dever-se a quem? E fica uma reflexão: a quem serve esta queixa?


LIGA NACIONAL

Ofutebol português tem de evoluir a vários níveis para valorizar as competições, acrescestando-lhes prestígio, jogos intensos e sem todas as polémicas que nos desqualificam internacionalmente. Precisamos de uma Liga forte, com mais tempo de jogo e menos suspeições, com uma renovação qualificada dos árbitros, de modo a que entendam o jogo e evitem tantas paragens e tempos mortos.  

O facto relevante recente tem a ver com o treinador do Benfica, suspenso por um jogo. Os vizelenses, ainda devem estar perplexos por o VAR decidir lances controversos sem apelar à visualização do árbitro principal. Na Luz, o Benfica venceu o Famalicão com naturalidade. Em Cha- ves, o clube local recebeu o FC Porto, num jogo muitos disputado e intenso. No final da primeira parte, os dragões venciam por dois golos. Na segunda, o Chaves reduziu de grande penalidade, mas Taremi assistiu com classe Martínez, que não falhou oportunidade tão soberana para aumentar o marcador. Infelizmente, a arbitragem não esteve à altura, facto que vem sendo um hábito recorrente, tantas foram as falhas de difícil compreensão.

Já em Portimão, o Sporting, com diversas opções iniciais novas, ainda desperdiçou um penálti, mas foi feliz numa finalização de Paulinho, que saiu do banco e resolveu o jogo. O Vizela foi vencerao Estoril, folgadamente, confirmando a sua qualidade. O Braga venceu em casa o Rio Ave e o Guimarães ganhou nos Açores. A faltarem 11 jogos para o fim da Liga, o máximo que tem de exigir-se é erros das arbitragens. Uma falha pode subverter a verdade e criar injustiças intoleráveis.


CHAMPIONS 

OBenfica, após a passagem da meia hora, controlou o jogo e marcou cinco golos e sofreu apenas um dos belgas. A diferença de valor das duas equipas ficou bem patente, com um global de sete golos para os encarnados e apenas um para o Club Brugge. O Benfica apurou-se naturalmente para os quartos de final da Liga dos Campeões.


ALTERAÇÕES COMPETITIVAS

COM as alterações previstas pela UEFA para a temporada 2024-2025, para formato novo na competição (a Champions passará a ter mais clubes: 36 numa fase inicial da prova, com pontos corridos, antes de outra fase, do tipo mata-mata), com mais jogos, mudanças que satisfazem os emblemas mais poderosos do futebol europeu (resposta final à ideia de criação de uma Super- liga?), Portugal tem de proceder a ajustamentos competitivos.

A Taça da Liga vai mudar de formato, em função das exigências de um modelo competitivo com mais jornadas nas provas europeias. Essa competição deverá passar a ser disputada apenas pelos quatro melhores classificados de2023/2024, unicamente numa Final Four. Somente o Vitória de Guimarães apresentou uma fórmula alternativa, que considerava a participação de oito clubes. O figurino da Taça de Portugal, diz-se, também poderá sofrer alterações significativas, mas ainda não há qualquer definição pormenorizada. A questão coloca-se: as competições nacionais arriscam perder valor?


JUSTIÇA

Ésempre de lamentar quando um clube, para mais um dos grandes, com prestígio internacional, se vê envolvido em esquemas que podem prejudicar todo o futebol português. O Benfica confirmou que a SAD foi acusada de «fraude fiscal». O processo decorre normalmente, com o direito do exercício de defesa. Esta acusação envolve a SAD e a Benfica Estádio, mais dirigentes atuais e do passado.

Simultaneamente, o Ministério Público investiga 12 jogos por suspeita de (eventuais) crimes de corrupção desportiva. Provando-se as irregularidades, que sejam castigados todos os que envolveram o clube nestas situações ilícitas! Alguns dirigentes importantes do passado recente reclamam justiça e proteção do clube. Saco Azul é a designação atribuída pelas autoridades à investigação. Um paradoxo em termos de cor dos equipamentos...

A investigação do Ministério Público procura movimentos de elevado valor monetário e outras benesses atribuídas em determinados jogos. Averigue-se a verdade e conclua-se se existiram (ou não) irregularidades. Também estarão a ser avaliados árbitros e VAR, em jogos precisos, facto importante para esclarecimento cabal da situação, de forma e eliminar suspeições e agir em conformidade.

O nosso futebol precisa, urgentemente, de uma renovação de modelos e comportamentos, de rigor, diálogo, transparência e qualificação. Só desse modo se pode alicerçar um projeto que seja para todos e acabe com lutas sem sentido pelo poder. Todos os clubes merecem o mesmo tratamento. Contudo, isso obriga a iniciar uma fase nova, onde os árbitros sejam defensores do futebol e exista uma garantia de igualdade de condições, comportamentos e transparência.

Tornar a nossa liga mais competitiva, arbitragem imparcial e respeito pelo futebol, além de contribuir para a sustentabilidade do jogo, inibe o ocultismo e as atitudes que não podemos tolerar mais. O tempo não volta atrás, temos de prestigiar o futebol com trabalho, competições justas e árbitros a contri- buírem com rigor para um futebol sem jogadas de bastidores e planos que impeçam que o jogo se transforme num espaço de conflitos nas bancadas e nos acessos aos recintos desportivos. E estamos no momento certo para preparar a época nova com dignidade e excelên- cia. Não há alternativa: ou mudamos radicalmente ou nunca vamos conseguir melhorar as nossas competições. A escolha é nossa!


REMATE FINAL

— Sérgio Conceição, no final do jogo em Chaves, disse: «Por vezes, não se pode tocar violino, to- ca-se bombo. Foi a vitória desse mesmo realismo que tivemos neste jogo. Fomos uma equipa competitiva e todos os jogadores trabalharam muito para esta vitória. O mérito é deles».

— Faleceu o fantástico goleador da França, Juste Louis Fontaine, único jogador a marcar 13 golos num Mundial:  Suécia-1958.

— A Académica de Coimbra, vencedora da primeira Taça de Portugal (1938-39), voltando a conquistar a segunda Taça de Portu- gal em 2011-12, caiu numa situação que entristece o nosso País. Foi um símbolo de liberdade e talento. Porém, com dívidas elevadas, corre o risco de descer abaixo da Liga 3. Que o sonho consiga reerguer a Briosa!