Futebol e Governação, uma analogia

OPINIÃO28.01.202121:00

O negócio controla o futebol. Veremos o que se vai passar nos próximos tempos

N O futebol, o treinador é o líder e principal responsável pelo desempenho da sua equipa. Na governação, essa função de liderança é ocupada pelo primeiro-ministro.
Neste caso, em que o adversário é o Covid-19, o governo falhou. As derrotas não se explicam, assumem-se com as suas consequências e exigem esforço para vencer. Nas equipas de futebol que dirigi (clubes ou seleção), nos resultados negativos identifiquei-me sempre como o responsável. Após resultado negativo, fazia rigorosa análise dos factos e procedimentos individuais e coletivos, discutia com os membros da equipa técnica as razões e causas dos erros cometidos e decidia as estratégias, para corrigir e evitar repetições das falhas.
No governo, o processo deveria ser idêntico: análise profunda, deteção e discussão das origens, dos efeitos prejudiciais e responsabilidades, definição de rumos para corrigir falhas (que foram enormes) para nunca mais acontecerem e ainda os planos de emergência para situações idênticas.
Mantendo a analogia, o líder tem de mudar de rumo ou então ser substituído juntamente com a sua equipa, porquanto o resultado aponta para um desastre anunciado, se não for atempadamente corrigido.
 

Liga

O Paços de Ferreira foi vencer o Marítimo e revela fase de confiança na luta por lugar europeu, em confronto permanente com o Vitória de Guimarães. Na Luz, o Benfica recebeu o Nacional e marcou golo, controlando a posse da bola; no reinício, o Nacional empatou, manteve organização defensiva bloqueando eficácia do Benfica que perdeu dois pontos para o líder. O FC Porto, em Faro, entrou forte, cedo marcou golo e criou oportunidades que não conseguiu concretizar, conquistando os 3 pontos. O Farense apresentou futebol que merece melhor classificação. O Braga venceu um Gil Vicente organizado e mantém o 4.º lugar. O Sporting foi ao Bessa vencer, sem dificuldade, um Boavista sem ligação, inseguro e a precisar de pontos com urgência. 
 

‘Final Four’ - Taça da Liga

C OM a vitória do Braga sobre o Benfica, na segunda meia-final, o clube minhoto apurou-se para defrontar o Sporting na final do torneio. Jogo disputado num relvado muito pesado e com chuva constante. Braga organizado, Sporting controlando o meio-campo e marcando o golo que valeu o título, ao terminar a primeira parte. O Braga manteve o modelo, teve oportunidades de golo, mas o Sporting continua com eficácia finalizadora e rapidez de processos. Arbitragem difícil, com várias falhas. A expulsão dos dois treinadores deveria merecer outra atitude mais tranquila e pedagógica. Sporting vencedor de mais uma Taça da Liga. Parabéns ao vencedor e honra ao vencido.
 

Reflexão oportuna 

J URGEN Klopp levantou questões pertinentes. Abordou o ritmo intenso do quotidiano que limita a reflexão. Afirma que uma derrota pode colocar em causa um projeto estruturado, porque são as emoções que decidem continuidades. Valoriza as vitórias no futebol sem perder a transparência e credibilidade. Defende que é possível e desejável construir projetos sustentáveis que promovam o jogo e a sua envolvência, reforçando lucros e prestígio. Expulsar do futebol a mentira, a calúnia, a conflitualidade intencional, implica assumir compromissos com os jogadores e com a estrutura, num clima de verdade, para impedir desconfianças que afastam vitórias. A imagem positiva e reconhecida com admiração é o rumo para a estabilidade. Cumprir a palavra supera resultados momentâneos menos favoráveis, alicerça bases seguras e motiva para tentar sempre o máximo. Assim se enraíza imagem de seriedade de um clube que será sempre grande. Klopp, com a frontalidade dos campeões, afirma que à volta do futebol, a mentira, a habilidade manhosa, as intenções obscuras, são adversários a derrotar. Destaca como equipas mais valiosas as dos EUA, porque entende que o desporto é regulamentado com mais rigor, confiança e profissionalismo.
Critica quem não paga salários e tenta obter vantagens ilícitas. Testemunho importante, preciso, de um grande campeão. O que se passa no futebol português, e com maior risco no Campeonato de Portugal, carece de apoio urgente e de uma FPF solidária, porque felizmente com posses.
 

Florentino Peréz, presidente do Real Madrid e mentor do projeto galáctico dos merengues

A angústia da fuga para a frente

F LORENTINO Pérez, presidente do Real Madrid e um dos grandes precursores da inflação das transferências e contratos de jogadores, vem agora afirmar: «Nada voltará a ser igual. A pandemia mudou tudo. Tornou-nos mais vulneráveis e o futebol não escapa. Precisamos de fórmulas que o tornem mais competitivo e emocionante.» Concordância absoluta. Porém, a solução que deseja é uma mudança pela qual vem lutando, que visa a criação da Superliga Europeia, a competição fechada para os 18 clubes mais ricos da Europa. Agora, defende cortes salariais, quando foi ele o criador dos galácticos, numa mudança de paradigma que transformou jogadores de futebol em personagens mediáticas da moda e da publicidade. Essas fugas para a frente, têm o mesmo destino: mais importante que o critério do valor desportivo é o da dimensão financeira dos clubes. Assim se tenta impedir as possibilidades de um simples David vencer um enorme Golias, como só o futebol ainda permite. Os mestres da inflação pretendem agora dar uma imagem de poupança; ou será estratégia calculista? A pandemia causa graves problemas a todos. Os clubes que pretendem viver numa competição à parte, com garantia de sustentabilidade, como marcas de luxo, tentam reforçar alicerces que resistam a tudo. O início começou com os coeficientes de golos (1 golo nas Big Five vale 2, em Portugal 1,5 e noutros países 1). O mesmo se passa com o número de clubes nas competições europeias, de acordo com os rankings da UEFA. O poder mede-se não pelos títulos nacionais, mas pelas regras que favorecem equipas que atraem maior atenção e que vendem mais transmissões televisivas, favorecendo um negócio imparável de apostas. O negócio controla o futebol. Veremos o que se vai passar nos próximos tempos! 
 

FIFA proíbe Superliga Europeia

N A semana passada, após reunião com as seis confederações continentais (UEFA, Conmebol, AFC, CAF, CONCACAF e OFC), a FIFA proibiu a criação de uma Superliga Europeia.
Assim se impedem os sonhos de clubes milionários em participar numa competição fechada, para obterem verbas fabulosas, concorrendo com as provas existentes e partindo de posições privilegiadas. A FIFA confirmou que nunca será reconhecida uma tal competição. Qualquer clube ou jogador que participe numa prova desse tipo não poderá participar em alguma competição organizada pela FIFA ou respetiva confederação.
As confederações continentais aceitam o Mundial de Clubes da FIFA como a única competição de clubes a nível global e, por sua vez, a FIFA aceita as competições clubísticas organizadas pelas confederações como as únicas competições de clubes continentais: reciprocidade e cumprimento dos princípios de mérito desportivo, de solidariedade, de promoção e despromoção, como alicerces do futebol, consagrados nos respetivos estatutos. É dentro das quatro linhas que se constrói a história imparável do futebol.
 

Remate final

Valdano escreveu: «A natureza do futebol foi sempre a mesma: popular, sentimental, indomável…Mas por estes dias há divergência entre os adeptos, porque o futebol está a pisar a fronteira entre um antes e um depois. E no jogo de contrastes que sempre agradou ao futebol, precisamente na semana em que Florentino Pérez se reunia com Andrea Agnelli para delinear a Superliga, o Real Madrid caía na Taça do Rei frente ao Alcoyano (…) Em Alcoy vivemos um desses momentaços aos quais nunca nos acostumaremos e que alimentam duas teorias antagónicas. Os amantes do antes vão rir-se da Superliga e perguntar se o Alcoyano será convidado a participar.»