Futebol, a maior romaria
Daqui por algumas horas haverá novos forasteiros para o arraial da Luz e todos os caminhos vão dar à estátua de Eusébio
AO vermos aquela pinha humana no campo dos Arcos, em Vila do Conde, de gente apertada num espaço para uma pessoa e tinham que caber pelo menos duas, todos apertados como nas grandes romarias ou como nas noitadas do São João. Mas não há sofrimento, os pés sem calos e os empurrões nas costas é como se fossem abraços…
O futebol é uma festa e tem a força e fé que o povo tem pelos seus santos. Por isso caminham, esfalfam-se, gastam às vezes o que não podem, mas o ‘santinho’ do jogo da bola é que vale todos os sacrifícios.
Daqui por algumas horas haverá novos forasteiros para o arraial da Luz. A estrada entre Porto e Lisboa e as estradas doutros quadrantes deste Portugal levarão todas ao mesmo destino, a envolver a figura de Eusébio, naquela sua inimitável estátua a brilhar no estádio benfiquista, e os vestidos de azul e branco chegarão a par duma multidão encarnada no vestir e no emblema na lapela, afobada, sim, para ver o seu Gonçalo Ramos a fazer um golito, a que o arco de dragões se dedicará a fazer figas, apostando no seu Taremi.
Vai ser festa a lembrar os dois santinhos populares - do Porto ou de Lisboa - o São João e o Santo António.
Mas não é intenção do cronista dar opinião sobre o que se passou no namoro com a bola no Estádio dos Arcos, que poderia ter redundado num arco da velha para os benfiquistas, lá isso podia...
Vemos futebol há mais de três quarteirões de anos.
Esta sexta-feira todos os caminhos vão, realmente, dar à Luz
Somos dos tempos idos em que havia os campeonatos regionais, e se jogavam, por isso, três jogos entre os dois mesmos clubes no mesmo dia (domingo), defrontando-se de manhã as segundas categorias, à uma da tarde as reservas, e pelas 15 horas a chamada primeira categoria, as estrelas principais da companhia.
Quando o velhinho Salgueiros visitava Matosinhos, logo pela manhã, os carros eléctricos despejavam a gente de Paranhos, que tinham ainda de andar dois ou três quilómetros para chegarem ao Campo de Santana.
Carregavam-se bandeiras, mas essencialmente suava-se com o peso dos cestos levando o almoço, já que às 10 horas havia o jogo das segundas e, depois, toca a sentar e abrir o tacho do arroz e dos bolos de bacalhau, sem esquecer o tinto ou branco para empurrar e dar força para apoiar o Anselmo ou o Paulista.
Mais tarde, quando na I Divisão, onde esteve 24 anos, tendo até jogado uma eliminatória da UEFA, sendo eliminado pelos franceses do Cannes, que tinha a despontar um rapazinho chamado Zidane, o Salgueiros teve também os célebres Barrigana, Carvalho e Porcel, quando estes foram expulsos do FC Porto pelo treinador Yustrich. Também vestiram a camisola salgueirista e assumiram a tão cantada alma, futebolistas como Deco, Miklos Fehér, Marco Caneira, Edmilson, Iliev, Silvino e outros, tal como treinadores como Vítor Manuel, Filipovic, Mário Reis, Carlos Manuel e Norton de Matos entre tantos e tantos outros.
A Alma Salgueirista, que trazia sempre consigo, animando a falange de apoio, o chamado Salgueiral, homem do povo, com a sua viola e, quer o Salgueiros perdesse ou ganhasse, ia marcar presença na ‘Adega do Olho’ e só de lá saía quando o mandavam embora e com a ‘vasilha cheia’, ficando a vaguear na cidade e só na segunda-feira rumava a Paranhos.
Quando os encarnados de Paranhos visitavam os vizinhos leixonenses, a festa era ainda mais rija, dada a rivalidade com um.
O Leixões esteve 19 anos na I Divisão, ganhou uma Taça de Portugal e teve uma saga europeia de realce, mas há um bom par de anos também sofreu a despromoção e hoje está aflito para não acontecer pior.
Batemos palmas ao Macarrão, ao Nelito, ao Adão e Paulo, ao Costa Pereira e mais tarde os bebés que foram muito adultos no escalão maior e ao serviço dos três grandes como Tibi, Teixeira, Albertino, Fonseca, Barros, Praia, Chico e Praia, entre muitos outros. Tudo gente capaz de alindar as festas do futebol como se fossem grinaldas dos ornamentadores de Ponte do Lima.
Mas a grande festa será mais logo, na Luz, com milhares de benfiquistas e outros milhares de azuis e brancos. Uma festa que vem desde os tempos do Valadas, Francisco Ferreira, Arsénio, Rogério, Águas, Santana, Coluna, Germano e Eusébio, enquanto os nortenhos desde o Barrigana, Virgilio, Joaquim Machado, Carlos Duarte, Perdigão e Teixeira, mais tarde com António Oliveira, Miguel Arcanjo, Américo, Acúrsio, Madjer, Futre, Cubillas e agora Otávio, Taremi, Diogo Costa e tantos outros, comandados pelo Sérgio Conceição lançador de fogo de artifício do seu banco.
Do outro lado estará um Benfica a falar alemão no seu jogo guerreiro de Roger Schmidt e que terá como drones sobre o relvado da Luz desde uma defesa antoniana, um meio campo com um novo Enzo (Chiquinho), criado num lance de ilusionismo do treinador germânico, enquanto mais à frente Gonçalo Ramos será a seta apontada ao perigo para ,a defesa da honra de Pepe e companhia...
É assim o futebol: uma festa. Pena que muitos só o queiram ver como poço da morte. Muita pena!