Europa para que te quero...
Sentido de Pertença é o espaço de opinião quinzenal de André Coelho Lima, associado do Vitória SC, jurista e empresário
1.Os clubes portugueses participantes em competições europeias — para além dos três mais titulados — foram sendo zurzidos por vários artigos de opinião, neste e noutros jornais desportivos, queixando-se da «fraca imagem» que davam do nosso país por, com as suas prestações, prejudicarem os ditos grandes que assim viram Portugal a ser ultrapassado pelos Países Baixos no ranking da UEFA. Com o empate no longínquo Cazaquistão o Vitória quebrou a série de nove vitórias consecutivas, com que desde a 7.ª vinha batendo um recorde nacional de vitórias consecutivas nas competições europeias. Assinalável! Não sentimos idêntico afã de elogio como sentimos de críticas quando as nossas prestações não correspondiam. O que é pena.
Indiferente aos encómios de terceiros lá vai o Vitória reafirmando o seu estatuto europeu, regressando aos palcos que são seus e contribuindo enormemente para a pontuação de Portugal no tal ranking. Até me pergunto, confessando a minha ignorância: quem é o clube que esta época mais contribuiu para a pontuação de Portugal no ranking da UEFA?
2. Este tema não tem qualquer relevância do ponto de vista dos elogios, mas tem já muita relevância para a discussão sobre que campeonato queremos, após a renegociação dos direitos televisivos. Aí, nesse momento, é que se verá se tudo o que foi sendo dito foram apenas lágrimas de crocodilo ou se os ditos grandes estão disponíveis para fazer como se faz nos outros grandes campeonatos permitindo uma distribuição que favoreça a qualidade do campeonato, e não apenas dos seus clubes mais fortes.
É uma questão de visão. Se tivermos visão estreita, não prospetiva, cada qual olhando apenas para o seu umbigo, assistiremos a mais um desfilar de inconsequência e o campeonato português continuará com a miserável competitividade que tem. Se tivermos visão alargada, se percebermos que do crescimento dos nossos adversários resulta o nosso próprio crescimento, poderemos aspirar a ter um campeonato verdadeiramente competitivo e não apenas um sorteio anual entre três clubes. Só para perceber porque uso a expressão miserável competitividade, basta ver que a Bundesliga — de que foi vencedor Bayer Leverkusen — tem treze campeões diferentes, 13! E se virmos o campeonato alemão, antes da sua constituição como Bundesliga, o número de campeões nacionais ascende a 28. Qualquer comparação com a nossa realidade é mera coincidência.
3. Referi-me aqui, no meu último artigo, à influência do erro de arbitragem em Braga pugnando, então, por que as conversas entre árbitro da partida e VAR não fossem divulgadas apenas alguns dias depois, mas pudessem ser acompanhadas em direto, no momento em que a conversa está a decorrer. Afinal, se essa troca de impressões busca a descoberta da verdade material, não há porque não a tornar acompanhável por quem assiste ao espetáculo, no estádio ou em casa. Os jogos de râguebi decorrem sobre esse princípio, todas as conversas dos árbitros, uns com os outros ou com os jogadores, são acompanhadores pelos espetadores que dessa forma são as primeiras testemunhas da justeza das avaliações. É um processo que torna a decisão mais respeitável, porque compreensível (ainda que dela se possa discordar). Sempre a transparência em detrimento da opacidade.
Vem isto a propósito do jogo V. Guimarães-UD Leiria, para a Taça de Portugal, que durante o jogo teve um penalti mal assinalado, que o árbitro reverteu após ouvir os seus auxiliares. Numa decisão que desconheço se é permitida pelos regulamentos, mas que queria assinalar e elogiar, o árbitro da partida veio à flash interview no final, explicar as razões pelas quais, apesar de ter assinalado penalti, entendeu dever recuar nessa sua decisão. Transparência. Franqueza. Verdade. Podemos gostar mais ou menos da decisão, mas passámos imediatamente a respeitá-la quando compreendemos o processo intelectual subjacente. Um enorme aplauso para o árbitro Miguel Fonseca que, creio, de iniciativa espontânea, deu um exemplo que merece ser visto e analisado pelos dirigentes do futebol.
4. No plano doméstico, lá vai o Vitória fazendo o seu papel, de modo bastante assinalável, sobretudo se virmos que é a equipa portuguesa com maior carga de jogos internacionais. Ontem, uma vitória por expressivos 4-0 sobre o Gil Vicente mantém o Vitória na luta pelos lugares europeus, mantendo um campeonato tranquilo e competente.
Uma grande instituição faz-se também do seu ecletismo. O Vitória sagrou-se campeão nacional de Boxe e Kickboxing, tendo dois dos seus atletas destas modalidades de combate conseguido feitos internacionais assinaláveis: Gonçalo Ferreira Campeão Mundial de Kickboxing e Uisma Lima Campeão Intercontinental de Boxe. Feitos que colocam o Vitória como relevante contribuinte para o desempenho desportivo nacional.