Desnorte

OPINIÃO16.02.202305:30

A questão é que estamos em Portugal, país aonde se fala muito para as nuvens e pouco se faz no concreto

E M todas as áreas, quem triunfa fintando as regras, acaba por ser sancionado. O assalto ao poder, nos clubes, tem sempre o reverso da medalha. O futebol inglês atingiu o topo de audiências, eventualmente escondendo estratégias económicas que pulverizaram o fair play financeiro, com eventuais soluções que estão a alarmar o futebol. Em Inglaterra, onde nasceu o futebol moderno, o jogo ocupa as preferências, embora surjam sinais que revelam fraturas e risco de desabamento. A tradição já não é o que era… os donos dos clubes também surgem das Arábias e dos Estados Unidos da América. As transmissões televisivas atingiram valores muito elevados e talvez se tenham esquecido de que tudo o que sobe, atinge um ponto máximo e depois inicia a queda. Há investigações em vários clubes, com eventuais irregularidades na circulação de milhões, como foi denunciado pela comunicação social alemã. A violação do fair play financeiro atingiu limites impensáveis. Aguardam-se decisões, incluindo exclusão da Liga Inglesa. Também se aguarda o desenrolar das investigações em França, particularmente no PSG, com receitas muito inferiores às despesas. A estratégia de privilegiar provas internacionais de várias modalidades, incluindo a contratação de Cristiano Ronaldo, poderá ser mais um passo para deslocar o centro das competições para a vontade de organizar grandes eventos desportivos na Arábia Saudita (por exemplo, os Jogos Olímpicos de Inverno), e depois, tudo o que for possível e prestigie os detentores das fontes energéticas que permitem usufruir de financiamentos fantásticos. Raramente se ouve uma palavra sobre direitos humanos! Mais países embarcam nessa viagem de engenharias financeiras, com possíveis habilidades específicas, que poderão ter um desfecho desastroso. As vacinas foram uma evolução incrível que, inclusive em pouco tempo, conseguiram armas para o Covid e salvaram muitos milhões de pessoas. O futebol, como herança ancestral e mais um poderoso alicerce do desporto, pode integrar dimensão financeira, mas sem apanhar o vírus que desgraça e destrói. A globalização, com muitas vantagens, aportou também sérios riscos de destruição. Portugal não poderia apresentar às instâncias superiores, um conjunto de princípios inovadores e prestigiantes? Pep Guardiola deu a entender que também se trata de uma cabala para prejudicar o City e garante que não abandona o clube, deixando no ar que este ataque ao clube tem origem nos adversários «com telhados de vidro».  


ARTE DE COMPLICAR

E M vez de criar legislação específica com competência e eficácia, o secretário de Estado da Juventude e do Desporto (SEJD) revela um secreto prazer em produzir legislação, a cada dia que passa, com o apoio do governo a que pertence. «Regular mais» é o desígnio obrigatório. Por isso, aí vem novo Regime Jurídico, a caminho das escadas da Assembleia da República (AR). Foi afirmado que mais de 20% das sociedades desportivas em Portugal ou já se extinguiram ou caminham para isso. E desconheciam só agora esse facto? Assim, com a garra sem fim de legislar para o momento e não para tempo alargado, pensam que a solução está na regulação. Sendo o futebol um exemplo de inteligência em movimento, pretende-se equilibrar o clube fundador e a sociedade desportiva (como se fosse possível, nesta altura, cativar bons investidores e investimentos). Com frases comuns, com a renovada esperança no novo regime jurídico, espera-se um regime de sanções intermitentes, fiscalizador, que consiga que se cumpram as regras. E para o pacote final ficar mais ambicioso, vão ser apresentadas novas medidas contra a violência no desporto. Desde a criminalização dos apoios ilegais aos grupos organizados de adeptos (claques), procurando criar mecanismos que permitam agir sem demora: uma utopia simpática, mas para já longínqua. A questão é que estamos em Portugal, país aonde se fala muito para as nuvens e pouco se faz no concreto. Mudar é fácil e cativa leitores da imprensa e das redes sociais, contudo, fazer o que já prometeram tantas vezes (com o hábito de repetir com novas frases e terminologia inovadora) vai acabar por banalizar, sem nunca mudar. Não seria vantajoso analisar o que fizeram outros países, ou mesmo aprender com quem tem conhecimento profundo destes assuntos, evitando futuros mais perigosos, porque há ainda quem possa ser um exemplo positivo e frutuoso! Temos de acreditar que em Portugal se podem construir modelos pensados, testados e não um impulso decisivo, sem divulgações mediáticas ocas, que nos coloque na frente de um grande pelotão que vai caminhando para uma realidade estruturada e nunca para a miragem do poço dos milhões que uns pretendem transformar o futebol num mero casino, onde circulam verbas astronómicas que ninguém controla. Se não travarmos o ritmo sem regras, o futebol poderá afundar-se no poço do qual não se volta atrás. Todos sabemos como começou; mas ninguém consegue identificar como vai acabar. Não haverá já risco de sobrevivência para a grande maioria dos clubes? Por isso, as eleições para federações nacionais, UEFA e FIFA podem ser vitais, para impedir que se criem fracos líderes que não passarão de marionetas dos maiores tubarões.


TAÇA DE PORTUGAL

PARA as meias-finais, nos oito clubes integram-se três da Liga 2. Trata-se da competição com maior tradição, porquanto os apuramentos são feitos diretamente e não por pontos ao longo da competição. O ambiente é diferente pois os jogos são disputados com intensidade e todos lutam para vencer, independentemente da Liga ou da posição que ocupam: o futebol é que decide! Meias-finais em duas mãos: FC Porto x Famalicão e Nacional x Braga. Dia 4 de junho, final da Taça de Portugal. Destaque para o Académico de Viseu, que lutou até ao fim pelo apuramento com o FC Porto, para o Nacional que goleou o Casa Pia, para o Famalicão que se apurou tranquilo e para o SC Braga que eliminou o Benfica.


LIGA

C OMO se previa, o calendário competitivo que incluiu paragem longa por causa do Mundial do Catar, teve influência decisiva nas prestações dos jogadores e também nas quebras de forma e lesões, particularmente no recomeço. O FC Porto com sete jogadores a recuperar e alguns até nem se lesionaram num jogo: a densidade competitiva tem sido menosprezada por quem tutela o futebol nacional e internacional, com objetivos prioritários nas diversas fontes de receitas.
O avançado Paulinho, do Sporting, viu a sua providência cautelar deferida por um juiz do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS) e, por isso, jogou com o FC Porto (depois de cumprir apenas dois jogos), evitando, para já, o terceiro jogo de castigo. Além dos cartões amarelos que deram lugar a cartão vermelho, aguarda-se a sanção a atribuir pelos graves insultos à equipa de arbitragem e registados no relatório do árbitro. Fica mais um golo na própria baliza que empobrece e desprestigia o nosso futebol. Para além de tudo, foi um jogo com dignidade e sem as polémicas que sempre surgem e potenciam situações de violência. O Intendente da PSP afirmou categoricamente que «Virem para os estádios e continuarem com desordens não é o caminho. Esse caminho vai chegar ao fim (…) a pirotecnia é perigosa para quem a usa e para o adepto que está ao lado.» O Clássico não foi um grande jogo, mas uma enorme emoção do princípio ao fim. Os leões tentaram ter mais posse e jogar no meio-campo adversário. Os dragões, muito mais competitivos, cumpriram a estratégia definida, fechando espaços e procurando saídas rápidas para ataque. O FC Porto continua a ser eficaz, em função da disponibilidade do plantel para superar lesões, com coesão e confiança, num envolvimento coletivo muito forte. Os azuis e brancos ultrapassaram um grande obstáculo, vencendo em Alvalade.


A TRANSPARÊNCIA

QUANDO Sérgio Conceição e um dirigente do FC Porto no banco se insurgem contra grandes erros e injustiças sistemáticas, os adversários diretos dizem TUDO E MUITO MAIS sobre o treinador do FC Porto. Porém, nos quartos de final da Taça de Portugal, o Benfica enfrentou, na cidade dos Arcebispos, o SC Braga e o treinador alemão das águias perdeu a fleuma, o equilíbrio emocional e revelou uma faceta desconhecida, não aceitável e com distorção do olhar para os lances. Por diversas vezes o treinador do Benfica pressionou o árbitro, que o tentou acalmar e sem o advertir como deveria ter feito. No passado dia 14 de janeiro, afirmou que os árbitros «estão a fazer um trabalho muito bom, em Portugal (…) Estou surpreendido com a qualidade. Confio nos árbitros, não tenho problemas». Como humano, afinal também muda na forma e no conteúdo, para comentar, intensamente, as falhas que surgem em qualquer jogo. O próprio Presidente do Benfica deveria ter mantido um comportamento adequado e não deitar lenha para aumentar a fogueira. A pisadela em Pizzi poderia ter consequências muito graves. Saber ganhar é sempre mais fácil, mas quando se pensa que o campeonato é uma viagem sem riscos, acontecem situações que revelam atitudes desconhecidas.
O futebol será sempre um universo de imprevisibilidade e, por isso, tentar aperfeiçoar comportamentos é tarefa complexa e urgente. Roger Schmidt afirmou: «Houve penálti claro, não entendo e não aceito. Grande erro!» Aceita sim, porque os azuis e brancos e todos os outros clubes aceitam, porque sabem que há erros, embora uns sejam mais penalizados do que outros. Respeitar todos os clubes é tarefa dos árbitros, que embora seja exigente, tem de ser a todo o momento e não unicamente quando nos toca na pele. E só para realçar o que deve ser valorizado, não foi o jogador do Benfica que errou, mas antes o guarda-redes do SC Braga que brilhou. Quando uma falha nos favorece ou um jogador adversário faz asneira decisiva para mais uma vitória, tudo está muito bem, porém, quando o jogo corre de outra feição, não deteto diferença com nenhum treinador.


REMATE FINAL 

– «Basta ter 11 jogadores em campo, o objetivo é sempre ganhar», afirmou Sérgio Conceição horas antes do jogo em Alvalade. E concretizou esse objetivo.

– No jogo inicial dos oitavos de final da Champions, entre o Club Brugge e o Benfica, a primeira parte foi equilibrada; no reinício, o Benfica marcou de grande penalidade e no final reforçou com novo golo.