Custos de contexto e ranking da UEFA

OPINIÃO03.04.202306:30

Adiscussão, na Assembleia da República, sobre o regime específico relativo à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais mostrou o peso dos encargos dos Clubes com os seguros dos atletas.

A Liga Portugal, pelo Presidente Pedro Proença, mostrou que, na última época, as Sociedades Desportivas gastaram 25 milhões de euros para cumprirem essas obrigações. Nas últimas oito temporadas, o valor acumulado foi de 140 milhões de euros, num aumento de 272 por cento, motivado por um quadro legislativo que desprotegeu as seguradoras e transferiu o risco para os Clubes. E sem seguradoras não há proteção para os jogadores.

Um quadro injusto quando comparado com o panorama internacional e que coloca os Clubes portugueses em desvantagem em relação a outras ligas europeias.

Esta discussão insere-se num cenário macro, o dos custos de contexto da atividade, e por aqui se constata o caderno de encargos que uma Sociedade Desportiva enfrenta em cada temporada. Aos seguros adicionamos um enquadramento fiscal pouco convidativo, a diminuição do IVA nos bilhetes para os espetáculos desportivos, ou a redução de IRC e IRS, que, na globalidade, afastam um ambiente propício ao investimento.

Apesar de todos os condicionalismos, os Clubes criaram e desenvolveram um modelo de negócio, assente na criação e valorização de Talento, que nos permitiu colmatar desigualdades competitivas e alcançar um sexto lugar no ranking europeu.

Discutir o ranking da UEFA é urgente quando Portugal corre o risco de perder uma vaga na Champions League a partir de 2024-25. Vamos por partes.

Por um lado, temos de ser frontais. Não podemos exigir aos Clubes que mantenham ou melhorem a posição de Portugal no ranking europeu se não lhes dermos condições para se baterem em igualdade com os seus concorrentes diretos. Sobretudo se esses concorrentes competem em quadros fiscais mais favoráveis, que potenciam a captação e retenção de talento, com governos que reconhecem a importância estratégica do Futebol para a notoriedade do país. Discrepâncias mais acentuadas se, dentro do próprio país, outros setores de atividade considerados estratégicos gozarem de incentivos para se manterem competitivos contra concorrentes internacionais, sem o Futebol gozar de idêntico estatuto.

Por outro lado, o modelo do ranking da UEFA merece reflexão. Uma vitória na Champions League tem a mesma pontuação de um triunfo na Conference League. Só diferem os bónus de apuramento. Portugal está em luta pelo sexto lugar com os Países Baixos. Em 2021-22 - única temporada em que os Países Baixos conseguiram melhor pontuação do que Portugal -, 65 por cento dos pontos neerlandeses foram na Conference League, enquanto 61 por cento dos nossos pontos vieram da Champions League. Nesta época, 17 por cento dos pontos dos Países Baixos foram na Champions League, todos pelo Ajax, enquanto 77 por cento dos nossos pontos foram obtidos nessa prova, por três equipas. O ranking confere a mesma pontuação a uma vitória do Benfica sobre a Juventus, do Sporting diante do Tottenham ou FC Porto com o Atlético Madrid, na Champions League, a um triunfo do AZ Alkmaar contra o Vaduz, do Liechtenstein, na Conference League.

Em 2024-25 a UEFA vai reformular as provas e duplicar prémios. Estes prémios estão diretamente ligados ao ranking da UEFA.  A maior fatia dos rendimentos dos principais Clubes está nas receitas da UEFA, com um impacto maior no orçamento das Sociedades Desportivas do que os direitos audiovisuais.

94 por cento dos nossos pontos foram conquistados por apenas quatro Clubes e a nossa competitividade na Europa passa por dotar os Clubes médios de mais condições para se baterem noutros contextos, caso contrário todos ficarão a perder. A Centralização dos Direitos Audiovisuais será ‘game changer’, não lhe retiramos importância, mas os custos de contexto têm um impacto enorme na sustentabilidade dos Clubes. E nunca é de mais insistir: sem as mesmas condições dos concorrentes diretos, não podemos exigir aos Clubes que mantenham ou melhorem a posição de Portugal no ranking europeu.