Alô Corunha? É do inimigo?

Alô Corunha? É do inimigo?

OPINIÃO07.04.202306:30

Conceição na pele de Nuno Álvares Pereira, o primeiro grande ‘treinador’ português

AINDA sou do tempo em que, na esmagadora maioria do País, se preguntava às crianças: «És do Benfica ou do Sporting?» A pergunta foi caindo em desuso e a partir de meados da década de 80, quando o FC Porto começou a reivindicar espaço com vitórias, foi sendo substituída por «de que clubes és?». 

Uma ou outra pergunta incomodavam o meu avô Adelino, que antes de responder já tinha lançado, fulminante, um olhar que combinava deceção com irritação. «Se eu sou de Terras de Bouro, distrito de Braga, de que clube acham que sou?», atirava. Claro, do SC Braga. Por isso, nunca entendeu como é que a mulher e a filha (minha mãe) diziam que eram do Benfica. O genro (meu pai) era do Sporting e o filho João (meu tio) do FC Porto, com uma veneração inquebrável a Pinto da Costa, tanta que ainda hoje me comovo por, com ajuda de um amigo, ter conseguido que o presidente do FC Porto desse o último momento de felicidade ao meu tio João, semanas antes de nos deixar. 

Durante um largo período vivemos todos na mesma casa. Família grande com pais, filhos, avós e um tio. E depressa se chegou a um acordo: o meu avô não censurava a mulher, filho, filha e  genro, o resto da família comprometia-se a elogiar-lhe a escolha do SC Braga como prova do amor às raízes. E ninguém se podia chatear.

Nesta casa arco-iris tive em criança as primeiras lições da arte da diplomacia, já que tinha mais a ganhar - chocolates por exemplo - em manter todas portas abertas. E apendi a arte da tolerância. 

A vida levou-me também a viver e estudar em Lisboa, Anadia e Porto. Fiz amigos entre os Diabos Vermelhos, a Juventude Leonina e os Super Dragões. Vi muitos jogos na Luz, em Alvalade e nas Antas. Percebi que ser «anti» não tem piada, dá muito trabalho e eu sou preguiçoso. O futebol, como a vida, é mais divertido quando celebrado em festa e desportivismo.

PS - Se Pinto da Costa for como eu, deve ter-lhe custado muito revelar que «os inimigos do FC Porto estão a cerca de 300 quilómetros». Juro que não tinha noção de o FC Porto ser considerado inimigo pelo Deportivo da Corunha. Deve ser ainda por causa das meias finais daquela Champions de 2004. Contrate-se a padeira de Aljubarrota. E o Sérgio bem pode ser o novo Nuno Álvares Pereira, o primeiro grande treinador português, o inventor da célebre tática do quadrado.