A linha da água
Gremio e Internacional com muitos problemas na sua zona (Foto Imago)
Foto: IMAGO

A linha da água

OPINIÃO31.08.202408:30

'JAM Sessions' é um espaço de opinião semanal de João de Almeida Moreira

No dia 20, o Grêmio foi eliminado pelo Fluminense da Taça dos Libertadores da América. Duas semanas antes caíra para o Corinthians na Copa do Brasil. Já o Internacional disse adeus às duas provas num intervalo de 10 dias, afastado de uma pelo Rosario Central e de outra pelo Juventude, ainda no mês de julho. Na metade de baixo da tabela do Brasileirão, resta-lhes a ingrata tarefa de lutar, até ao fim do ano, pela permanência na Série A. Uma vergonha para os dois gigantes de Porto Alegre? Nem tanto.

Grêmio e Internacional, com torcidas fanáticas que se estendem a todos os cantos do estado do Rio Grande do Sul, cruzam as fronteiras de Santa Catarina e Paraná e chegam ao Mato Grosso e ao Mato Grosso do Sul, são protagonistas daquela que é considerada a maior rivalidade do país, o popular Grenal, já vocábulo na maioria dos dicionários.

Os adeptos de Atlético Mineiro e Cruzeiro, em Belo Horizonte, até podem discordar mas é pacífico que Grenal é Grenal – e vice versa. Os antagonismos entre paulistas e cariocas podem, por sua vez, ser mais mediáticos mas estão dispersos em rivalidades cruzadas entre os quatro grandes das megalópoles São Paulo e Rio de Janeiro e não concentrados numa dupla.

E o Grenal é mais relevante, claro, do que o Ba-Vi baiano, do que o Atletiba paranaense e do qualquer outra das outras rivalidades Brasil afora pelo impressionante palmarés de ambos: o tricolor foi campeão intercontinental uma vez e da Liberta três, campeão brasileiro num par de oportunidades e da Copa do Brasil em cinco, fora 43 edições do Gauchão; já o colorado, vencedor do mundial de clubes numa ocasião e da América Sul em duas, ganhou por três vezes o Brasileirão, a Copa por uma e soma 45 estaduais gaúchos.

Mas este ano sobra-lhes então lutar, como se diz (ou dizia) em Portugal, por «ficar acima da linha de água». Uma expressão que ganha, entretanto, um dramático duplo sentido: por mais que a época medíocre se deva, também, a erros próprios da dupla, a imponente Arena Grêmio e o grandioso Beira-Rio estavam, literalmente, abaixo da linha de água há meros três meses.

Enquanto os rivais se preparavam, se reforçavam, se treinavam, atletas do Grêmio e do Inter circulavam em barcos de borracha por Porto Alegre, entre os estádios submersos e as zonas de doação de alimentos, de balde – e coração – na mão, durante a tragédia das enchentes do Rio Grande do Sul que matou 173 pessoas, deixou 38 desaparecidas, feriu 806 e desalojou perto de 500 mil.

Não, este ano, para a dupla Grenal lutar apenas para ficar acima da linha de água não é vergonha – é proeza.