A derrapagem emocional

OPINIÃO27.04.202306:30

Perder tempo com pormenores é prejudicar o jogo, a alma do futebol

Ofutebol é um universo de emoções e até alienações. Por vezes, superam-se limites e entra-se na derrocada dos princípios. Quando os líderes não conseguem manter o controlo racional em público, ou nas entrevistas, cresce o risco de prejudicar o futebol e a possibilidade de entendimento indispensável dos presidentes de clubes, pelo menos em termos institucional. É urgente parar para pensar. As consequências podem ser catastróficas. O bom-senso é uma herança que nunca pode ser desbaratada. Presidentes são referências máximas dos clubes, o que implica relacionamento exemplar em termos de representação e de indicações para a evolução.

Assim, quem está ao lado da figura máxima do clube, deve deitar água na fervura para se manter a posição pública com dignidade. Com o avançar do campeonato até às últimas jornadas, com resultados imprevistos que criam ansiedades profundas, não é útil para ninguém acicatar ódios e suspeições constantes, comprovadamente irreais, que acabam por ajudar o vulcão a explodir. Desse modo, o nosso futebol acaba por ficar desprestigiado. Antes de dar entrevistas, seria conveniente manter o racional sobre o emocional. Afirmar situações que não corresponderão à verdade, manter visão parcial, fomentar suspeições, é sempre caminho para violência que tem de ser evitado e esclarecido, nas instâncias devidas.

Quando se reage sem tempo de análise, esses momentos poderão ser prejudiciais. Para protestar, há instituições específicas para averiguar e decidir. De outra forma, estaremos a incendiar a rua para fazer justiça por próprias mãos, potenciando conflitos, com consequências que podem atingir limites extremos! Os presidentes têm responsabilidades acrescidas e nunca devem acusar com desrespeito situações que podem criar risco público. Todos sabemos que, por vezes, quando tudo está a correr bem, surgem momentos infelizes, imprevisíveis e parece que tudo se desmorona. A paixão pelo sucesso não pode levar ninguém para a utopia, mas antes para o apoio ao clube em todas as circunstâncias.

Situações de guerra de palavras e eventuais casos polémicos, inundam órgãos federativos com queixas e participações que deveriam ser resolvidas com sustentabilidade. Uma exigência que todos os presidentes devem apoiar, será a necessidade de qualificar a arbitragem, para manter prestações competentes, conseguindo acompanhar o ritmo de jogo, penalizando com acerto e a consulta ao VAR ser praticamente imediata, caso contrário ficam sempre muitas dúvidas. Os árbitros são essenciais para o ritmo e intensidade do jogo, reduzindo as pausas que castigam com pouco tempo de jogo útil. Há mudanças imprescindíveis, a começar pelo respeito das decisões certas dos árbitros, procurando um jogo fluído e entusiasmante. Perder tempo com pormenores que não merecem atenção, é prejudicar o jogo, a alma do futebol. 


LIGA

SÓ quem sabe e conhece o contexto emocional e comportamental dos participantes num jogo, pode avaliar o desgaste provocado, nos intervenientes, em especial nos jogadores e no treinador. Os últimos jogos, até ao final da competição, são disputados com maior intensidade, atingindo limites de grande exigência. O Braga continuou a vencer com mais um golo de Ricardo Horta. O FC Porto foi a Paços de Ferreira vencer num jogo intenso. O Famalicão continua a somar pontos, assim como o Boavista e o Portimonense. O Benfica, num jogo pobre, teve um golo salvador e um esquecimento da arbitragem: pisão de Otamendi que merecia o segundo amarelo. O tempo de compensação foi totalmente gasto na consulta ao VAR! Quanta ansiedade paira na Luz? O Arouca, consistente, continua com pontuação para prova europeia. O Santa Clara, ao empatar em casa com o Chaves, mantém a última posição. Em Guimarães, o Sporting regressou às vitórias.


TAÇA DE PORTUGAL

NA primeira mão, da meia final da Taça de Portugal, o Nacional, em casa, perdeu por 5-0 com o Braga. No dia 25 de abril, disputou-se a segunda mão e o resultado foi um empate a 2 golos. Primeiro apurado para a final: Braga. No dia 26 de abril, o FC Porto venceu em Famalicão por 2-1. Sobre arbitragem nem se comenta. A segunda mão será disputada no Dragão no dia 4 de maio.


JOGOS EUROPEUS

OSporting teve tudo para eliminar com mérito a Juventus, mas faltou um pouco de sorte. E se Rúben Amorim taticamente colocou o Sporting muito forte, só por grande infelicidade não venceu, como seria mais justo e com o treinador italiano a elogiar a equipa do Sporting pelo excelente futebol praticado. O Benfica alterou o comportamento do seu treinador, porque já defende o contrário do que afirmava: «Se for para continuar assim, podem acabar com o VAR». Teria ficado melhor na fotografia, com silêncio. O que tem faltado ao futebol português para atingir finais europeias, talvez seja a falta de rigor a todos os níveis, incluindo a baixa qualidade das arbitragens, com inúmeras pausas e as guerrilhas clubísticas que envolvem instituições que têm de ser imparciais.


VELHA JUSTIÇA

RÚBEN AMORIM, foi castigado com um jogo de suspensão, por ter sido expulso no jogo com o Arouca, pelo Conselho de Disciplina (CD) da FPF. O castigo fica a dever-se ao tipo de linguagem usada para com um elemento da equipa técnica adversária, no minuto 97 do jogo em Alvalade. Esse castigo impediu presença no banco, no jogo com o Guimarães e ainda multa avultada superior a 4 mil euros. O elemento, do clube que defrontou o Sporting, que discutiu com o treinador dos leões, também foi suspenso por um jogo e multa, mas com desconto: cerca de mil euros. Só quem desconhece a invasão de emoções e alteração de comportamentos, provocados por sensações muito fortes, algumas vezes acrescidas pelo desempenho dos árbitros (isentos de multas), pode confundir a justiça. A dúvida persistente é sempre a mesma: será que o CD não consegue prever esses momentos mais intensos e antecipar estratégias, para manter o jogo nos limites do aceitável? Por que será que estes castigos nas últimas jornadas já são habituais? Desse modo, nunca mais poderemos subir posições no ranking da UEFA, quando temos equipas capazes de fazer bem melhor, contudo, internamente, fica a impressão que há mais adversários do que união, para prejudicar alguns clubes.


REFLEXÃO

COM o reinício da fase final do nosso campeonato, surgem as críticas, as ameaças e mesmo as sanções, mas sem a coerência necessária que permita valorizar o nosso futebol e não as sistemáticas queixas e queixinhas para tentar as conquistas por meios que não deveriam fazer parte do jogo. O Benfica, líder do campeonato, ao fim de três derrotas, conseguiu um empate em Itália e regressou à nossa Liga com apresentação de participações ao Conselho de Justiça contra o FC Porto, na tentativa de conquistar pontos de forma eventualmente mais fácil. Ler com atenção os comentários de Del Piero, o antigo craque italiano, ajuda a perceber: «Benfica estava exausto, jogam sempre os mesmos (…) o Inter teve todo o mérito porque mostrou máxima concentração, principalmente no jogo da primeira mão, em Lisboa». O Sporting, em Alvalade, dominou o jogo, encheu o campo com exibição fantástica, criou muitas oportunidades, mas não as concretizou e, nestas provas, o desperdício sai muito caro.  


A DISCIPLINA

DEIXEM os artistas da bola jogarem, sem inventarem problemas que nunca serão importantes, mas que podem destruir a credibilidade do futebol, inclusivamente além-fronteiras. Processos disciplinares constantes, acabam por se tornar um grande problema por falta de diálogo e porque valorizam o acessório, julgando perturbar adversários. O presidente do Benfica foi um excelente jogador a nível mundial e, por isso, deveria ser o primeiro a dar exemplo e a não perder tempo com ninharias desprestigiantes. Além disso, esse clima de conflito pode ter consequências graves. Valorizem os resultados dentro das quatro linhas e convençam-se que a este nível, os jogadores só pensam no jogo. Quando Rui Costa foi eleito presidente do Benfica, ficou a convicção de que poderia contribuir para uma nova mentalidade... O que poderia ser um tempo de relacionamento entre clubes, com maior cooperação, nem chegou a ser projeto. Os factos e os resultados voltaram a ser o busílis da questão, porque impedem evolução na convivência, quando poderiam ter efeitos de grande utilidade para o futebol nacional, se houvesse uma valorização exemplar do nosso campeonato. Em vez de uma análise integrada, regressou-se ao passado e reduziu-se o jogo apenas aos resultados do Benfica, em maré menos famosa. O clube da Luz perdeu três jogos sucessivos e não sendo habitual, tornou-se um facto. Se o presidente dos encarnados não tivesse sido um jogador com prestígio internacional, ainda se poderia tolerar, mas não é o caso. Fazer das participações disciplinares um hábito e não uma exceção, é sintoma de perda do controlo das emoções. 


GRANDE EXEMPLO

OPepe, o central do FC Porto, figura imprescindível do clube, com 40 anos de idade, foi convidado a renovar, num exemplo único até ao momento. O seu profissionalismo tornou-o reconhecido por todos e até imprescindível na Seleção. Destacou o clube, assim como os valores que se adquirem nos azuis e brancos, mas também a exigência ao limite como ato natural.
Pepe, além dos títulos, é indispensável como motivação e liderança, para cumprir no relvado as decisões do Sérgio Conceição. O presidente não teve dúvidas pela renovação, pela importância na formação dos mais jovens, A comunicação social foi unânime no reconhecimento da sua capacidade. 


REMATE FINAL 

A minha deslocação à freguesia de Sarilhos Grandes, concelho do Montijo, foi um prazer e um privilégio, por voltar a estar com o meu grande amigo e companheiro Manuel Fernandes, que no Sporting foi e continua a ser uma referência fantástica, e um goleador de nível internacional, sempre humilde. Reencontrar o Manel numa merecida e feliz homenagem, pela sua brilhante carreira no futebol, com a presença de muitos e bons amigos, transportou-nos para um tempo em que fizemos ‘coisas muito bonitas’. A festa foi excelente, com centenas de amigos e tu mereces muitas mais distinções. Ensinou-me o meu avô que a amizade não se agradece, mas isso não impede que se agradeçam as gentilezas, os favores e as lições. Já em Miami, faço questão de te enviar um abraço de profunda amizade, extensível à tua família, do companheiro António Oliveira.