«Se tivesse de abdicar do currículo por eles [filhos] era fácil, sem pensar duas vezes»
Após o nascimento de Margarida, Fernando marcou a subida ao pódio para receber o bronze nos Jogos de Tóquio, em 2021, com uma chucha Sven Simon/Imago

ENTREVISTA A BOLA «Se tivesse de abdicar do currículo por eles [filhos] era fácil, sem pensar duas vezes»

MODALIDADES13.07.202409:12

PARTE 2 - No ano passado, no apuramento olímpico, Fernando Pimenta dividiu o quarto com a mulher, mas em camas separadas, e os filhos. Resultou e não afasta a hipótese de voltar a repetir

— Os miúdos são o seu outro mundo?

— Sim, é completamente diferente. Venha quem vier, não há nada em comparação. Se tivesse de abdicar do currículo por eles [filhos] era fácil, sem pensar duas vezes. Quando fui para os Jogos de Tóquio, sempre disse que a minha maior medalha tinha nascido nesse ano, 2020. E é verdade. Foi a minha filhota. E agora, mais recentemente, no ano passado, o Santiago. É a minha segunda grande medalha [risos].

— É a outra fase do atleta. A paternidade é diferente da maternidade?

— Mas custa igual. Chegar a casa, após duas semanas e meia de estágio e ver o crescimento deles, pergunto-me: o que estive aqui [em Avis, Portalegre] a fazer?

Chegar aos Jogos Olímpicos e a probabilidade de não conseguir uma medalha é muito alta e acabamos, se calhar, por pensar, porque é que abdiquei da minha vida pessoal, dos meus filhos e da família.

— São as privações olímpicas?

— Mas chegar aos Jogos Olímpicos e a probabilidade de não conseguir uma medalha é muito alta e acabamos, se calhar, por pensar, porque é que abdiquei da minha vida pessoal, dos meus filhos e da família.

— Mete tudo na mesma balança? Jogos Olímpicos, a medalha e a família.

— Em Tóquio, a primeira coisa que disse quando terminámos, aliás, antes de sairmos daqui, foi que queria entrar no primeiro voo de regresso a Portugal, logo a seguir à prova. Seis horas depois da final, já estava no avião e nem deu para festejar a medalha.

Fotografia Bruno de Carvalho/Imago

— Paris é mais perto? Será diferente, uma força extra ter mulher e filhos presentes?

— Sim, Paris é mais perto. E tendo lá a família, é diferente e vai ser giro. A Margarida já capta bem. E o Santiago também. Ajuda bastante. Até porque, no ano passado, antes do Mundial decisivo do apuramento olímpico, acabei por fazer algo que não é muito comum. Fiquei no mesmo quarto com os meus filhos e a minha mulher. Eu dormia numa cama à parte, mas ficámos os quatro e as coisas correram bem. A família, sabendo o papel que tem neste processo, só nos dá a ganhar e nunca a perder. Infelizmente, neste estágio [em Avis] não consegui ter cá a família, mas no estágio de Montemor-o-Velho, o último antes dos Jogos Olímpicos, espero tê-los por perto.

Faz agora 20 anos que conheci a minha mulher, éramos miúdos, ela tinha 13 anos, eu, 15. Começámos a namorar, estava eu no zero, no zero. Não é aquela coisa gostou de ti, porque já tinhas medalhas, já ganhavas...

—Há esse bom precedente? Estes anos na alta competição permitiram essa decisão?

—Sim, claro. Se sentir que me está a interferir na recuperação e no meu descanso, é uma coisa, agora, se não. Se, emocionalmente, não estiver bem, acho que é escusado estar a forçar uma coisa que não é natural. Faz agora 20 anos que conheci a minha mulher, éramos miúdos, ela tinha 13 anos, eu, 15. Começámos a namorar, estava eu no zero, no zero. Não é aquela coisa gostou de ti, porque já tinhas medalhas, já ganhavas... Não era sequer o Fernando Pimenta. Não. Era o Fernandinho, o Pimenta.

Quando a minha filha nasceu recebi às seis e meia da manhã uma chamada da minha mulher a chorar, a dizer que as águas tinham rebentado, e que estava a caminho do hospital. Concluí o meu compromisso nestes lados, treinei, já que não podia assistir, e só depois à noite fui e estive com elas.

—Tudo isto parece uma história normal de um desportista, da família e dos filhos?

—Sou um ser humano, sim, e acabo por ter sentimentos. Estava aqui neste mesmo local [Avis] quando a minha filha nasceu. Recebi às seis e meia da manhã uma chamada da minha mulher a chorar, a dizer que as águas tinham rebentado, e que estava a caminho do hospital. Concluí o meu compromisso nestes lados, treinei, já que não podia assistir, e só depois à noite fui e estive com elas.

«O desporto não é matemática, não é 1+1=2»

13 julho 2024, 08:12

«O desporto não é matemática, não é 1+1=2»

PARTE 1 - Fernando Pimenta tem duas medalhas olímpicas e tentará a terceira em Paris-2024 ou até mesmo Los Angeles-2028. Contará com a família na capital francesa e espera terminar a carreira em Ponte de Lima, aos 40 anos

—Última questão. Nesta vida de desportista o que é gosta menos?

—Estar longe da família. E as malas. É uma cena ... Por mim, preferia mudar-me com a família e estar aqui sossegadinho. E ter alguém para fazer a mala [gargalhada].

O porta-estandarte que tremeu das pernas no Palácio de Belém

O canoísta Fernando Pimenta, de 34 anos, na quarta participação olímpica, e a marchadora Ana Cabecinha (atletismo), uma mão-cheia de Jogos Olímpicos, irão ser os porta-estandartes de Portugal na cerimónia de abertura em Paris-2024. Sucedem a Nelson Évora e Telma Monteiro em Tóquio-2020.

Fotografia Instragram Fernando Pimenta

O anúncio feito pelo presidente do Comité Olímpico de Portugal, José Manuel Constantino, e a entrega da bandeira nacional pela mão do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, não deixou Fernando Pimenta indiferente durante a apresentação da delegação da Missão Portugal nos Jardins do Palácio de Belém, na segunda-feira.

«A responsabilidade é sempre a mesma, mas sem dúvida que receber a nossa bandeira, o nosso símbolo maior, das mãos do Presidente da República foi um momento bastante marcante.»

«A responsabilidade é sempre a mesma, mas sem dúvida que receber a nossa bandeira, o nosso símbolo maior, das mãos do Presidente da República foi um momento bastante marcante. Como estava a confidenciar com o chefe de Missão, já não me tremiam as pernas há algum tempo e hoje senti uma vibração diferente quando recebi a bandeira», assumiu o canoísta do Benfica depois da cerimónia.

António Cotrim/Lusa

Assumiu estar numa «fase boa» e «feliz na canoagem», mas não quis antecipar a cor da medalha que tentará trazer ao pescoço. «Quero ir passo a passo, sem pressão», disse.

«A responsabilidade é sempre a mesma, porque ponho sempre a máxima responsabilidade nos momentos em que represento Portugal», garantiu. «Normalmente não faço promessas, mas podem contar com a minha melhor versão», frisou Pimenta igualmente durante a receção aos atletas qualificados para Paris-2024.

«Será brutal se Fernando Pimenta conquistar o ouro»

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PARTE 3 - Hélio Lucas, Treinador de uma vida de Fernando Pimenta esvazia a pressão da conquista do ouro olímpico em Paris-2024. Afirma que o canoísta vai para a luta pelas medalhas e pede-lhe sobretudo para desfrutar