13 fevereiro 2024, 13:06
Goleada por 41-1 em jogo de infantis que ninguém queria jogar
Resultado reabre discussão em torno do futebol de formação
União 1919, histórico da cidade dos estudantes, dá lição sem paralelo em Portugal no futebol de formação: tira um jogador quando as suas equipas estão a ganhar por 5-0; Iniciativa é para manter, mesmo que isso signifique perder campeonatos
Golos são sinónimo de festa, euforia, felicidade. Na dose certa, dão vitórias e embalam para títulos. Mas nem sempre é assim. Na realidade dos escalões jovens, os golos fazem sonhar mas também podem ser um pesadelo, quando a desigualdade ameaça a sua principal missão, como revela Márcio Serra, coordenador de formação do União 1919, nome por que é designado, desde os últimos anos, o histórico União de Coimbra.
«Sempre houve discrepância de resultados nestas fases iniciais, tem sido visível e vamos deixando andar. O clube já sofreu mais de 10, já deu mais de 10, e isso não serve a formação, porque a ideia é que os atletas sintam que evoluem e se superam», disse o responsável, apontando para mais de uma centena de jogos com desigualdade superior à dezena de golos.
Por isso, à falta de regulamentação, o União 1919 arregaçou as mangas e decidiu assumir as despesas de um marcador demasiado vantajoso para as suas equipas, nos jogos de futebol 7 e 9: «A ganhar por 5-0, retiramos um jogador, por 10-0 outro. Ganhar por 10 ou 20 não vale a ninguém. Queremos manter a metodologia e ao mesmo tempo dar a oportunidade ao adversário, que só de marcar um golo festeja e cria objetivos.»
A iniciativa «Menos por Mais» não belisca as ambições do grupo de trabalho. «Trouxe um espírito de entreajuda maior, há uma maior atitude, e o adversário cria mais oportunidades», sublinhou, falando numa boa recetividade. «Temos uma equipa em que esta iniciativa tem sido mais vezes aplicada, os sub-12 (2012), infantis. A iniciativa teve bastante recetividade por parte dos pais, para quem também é difícil pô-los para cima. Todos eles apoiam, um destes pais é que partilhou o artigo da Marta comigo. Achamos que estamos no rumo certo», sublinhou.
13 fevereiro 2024, 13:06
Resultado reabre discussão em torno do futebol de formação
A propósito do episódio de uma goleada por 41-1 vindo de Espanha, foi taxativo: «Tiveram a frustração de sofrer 41 golos. Vai chegar a um ponto em que vai haver um abandono da modalidade e fim da vontade de fazer desporto, ninguém quer estar sempre a perder. Perder faz parte, mas o mais difícil é a gestão de expectativas e de frustração.»
E quanto aos adversários? As reações são diversas em relação ao método adotado, de subtrair jogadores. «Já tivemos situações em que não sabiam o que estávamos a fazer e acharam uma ofensa. Passámos a divulgar a iniciativa, acharam interessante. Já houve pessoas a aplaudir, já houve indiferença. Queremos também combater a campeonite, porque também já nos perguntaram como faríamos na iminência de sermos campeões em virtude do número de golos: sim, manteríamos a iniciativa», garantiu.
Houve um jogo em que o árbitro alertou o nosso treinador para o facto de estarmos a jogar com menos um, enviámos uma mensagem ao Conselho de Arbitragem da AF Coimbra a explicar a situação e deram-nos os parabéns
O reconhecimento, para já, é feito na sombra. «Depois de um jogo em que o árbitro alertou o nosso treinador para o facto de estarmos a jogar com menos um, enviámos uma mensagem ao Conselho de Arbitragem da AF Coimbra a explicar a situação e houve reconhecimento interno. Não foi de forma pública, mas deram-nos os parabéns. Algumas pessoas têm-no feito, vamos continuar. Resultados não valem tudo, não servem de nada, é urgente fazer-se algo», defendeu o mesmo responsável.
Este trilho, para já, é feito sem companhia. «Ainda estamos sozinhos na caminhada, que eu saiba. Não é a fórmula secreta que vai mudar a formação, mas era importante que quem tenha autoridade faça alguma coisa. Só 1 por cento chega às ligas profissionais, as associações e as federações têm de preocupar-se com os outros 99, e não estão», notou, pedindo mais incentivos. «Criou-se o cartão branco, não chega, porque se chega a banalizar, entregar cartão porque se apertou a sapatilha…», observou.
«Apresentámos a ideia à Associação de Futebol de Coimbra, para colocarem nos próximos regulamentos, mas com os campeonatos a decorrer não poderiam fazer. O nosso objetivo não é promover o União de Coimbra, é combater a deformação das equipas, dos resultados, dos atletas. Só chegando à FPF e Associações distritais é mais fácil de acolher. É uma questão de ética. Até então, todos olhamos para o ar, ninguém gosta, os atletas sofrem, os pais sofrem, mas ninguém faz nada.»
«É urgente fazer-se algo, sendo o futebol o desporto rei, atletas passam mais tempo connosco, cabe-nos a nós ajudá-los a superar as adversidades», reforçou.
Sublinhe-se que esta é apenas mais uma luta do clube, que também já lançou outras iniciativas com vista a contribuir por um desporto melhor, incluindo a intitulada «Juntos podemos mudar», na qual saiu em defesa da arbitragem. O respeito pelo papel dos árbitros também ficou à vista na homenagem ao juiz Pinto Nunes, quando pedurou o apito.