Gracias, merci, obrigado

NACIONAL11.08.202407:30

Os guardiões da chamada 'portugalidade' andam aí, a espumar-se com o sucesso e as proezas de quem nasceu fora do país e levanta bem alto a nossa bandeira. 'Estádio do Bolhão' é o espaço de opinião semanal do jornalista Pascoal Sousa

Não nasci em Portugal. Cheguei de França com 8 anos sem dominar a língua. Nos primeiros cinco anos senti-me, e fizeram-me sentir, um estrangeiro no meu país, quando a globalização não existia e as fronteiras estavam fechadas. Ainda mais mal tratados foram os chamados ‘retornados’, que fugiram com o pouco que tinham das antigas colónias para serem recebidos como estranhos. Foi com estes que travei as melhores amizades na infância e adolescência.

Claro que ser filho de emigrantes portugueses altera a perceção das pessoas, mas para os meus amigos e menos amigos fui ‘franciú’ até o tempo dissipar esse passado. Sou, em parte, e com orgulho, produto do sistema de educação francês, e isso teve o seu preço na escola, na faculdade, até na vida.

Portugal avançou muito desde 1980, mas há quem acha ser guardião da portugalidade e não aceite a ideia de que alguém de fora, tenha ou não raízes lusas, ame o país que o acolheu com a mesma alma com que deixou o seu pelas mais diversas razões – políticas, financeiras, ou por vontade própria. Um país que tem milhões de emigrantes e lusodescendentes!

Há um perigo dissimulado nestas discussões de tasco que se propagam pelo esgoto em que se tornaram as redes sociais. Obrigado, Pichardo, pela medalha de prata. Nasceste cubano, sei que és português com orgulho. Obrigado Pepe. Nasceste brasileiro, sei que amas a pátria que te acolheu. Obrigado, Patrícia Sampaio, pelo bronze. Obrigado, Iúri Leitão e Rui Oliveira pela prata e ouro. Obrigado a todos os que nos engrandecem, tenham eles nascido em Viana do Castelo, Maceió ou Hanói.