Benfica identifica craques ao ritmo da dança
As atividades que tornam única a iniciação dos encarnados; equipas inscritas nas competições nacionais só a partir dos sub-12
As equipas de iniciação do Benfica só começam a competir, oficialmente, no escalão sub-12. Não é que até lá lhes faltem oportunidades. Ao contrário, o clube proporciona aos jovens um modelo competitivo próprio, metodologia e experiências «diferenciadoras». «A nossa perspetiva vai muito para lá de treinar e ter um enquadramento competitivo ao fim de semana», anuncia Rodrigo Magalhães, coordenador técnico da formação. Reflexão interna que levou à conclusão de que o modelo competitivo tradicional para crianças entre os 6 e os 11 anos «poderá não ser assim tão benéfico».
Porquê? «Imaginemos um encarregado de educação que mora na periferia de Lisboa. Despende, aproximadamente, uma hora para levar o jogador ao jogo. O atleta demora, entre equipar-se, ouvir a palestra, falar com o treinador e aquecimento, uma hora. Depois há um jogo com duas partes de 30 minutos. Vamos supor que é utilizado metade do tempo: 30 minutos. Volta ao balneário, toma banho, volta a falar com o treinador e investe, novamente, uma hora para voltar para casa. Estamos a falar de uma manhã desportiva, na qual jogador e encarregado de educação despenderam quatro a cinco horas. E o tempo de prática foram 30 minutos», responde Rodrigo Magalhães.
O jogador talvez tenha tocado «um bocadinho mais» que cinco vezes na bola, ironiza, «mas é uma atividade reduzida em relação ao tempo investido» e, como tal, «há uma opção do clube em não ter equipas inscritas em campeonatos de idades mais baixas». O Benfica só começa a inscrever equipas no escalão sub-12 de futebol 9. E como rentabiliza, então, o Benfica o tempo? Poderá haver, no fim de semana, um ou dois jogos amigáveis, um torneio ou um triangular, mais uma atividade de futsal, dança ou motricidade infantil. «Olhando para o mesmo espaço temporal, para lá do ecletismo e diversidade multidisciplinar proporcionada, o jogador tem uma prática desportiva diferenciadora do modelo tradicional», sublinha.
O contributo do futsal
A diferença do modelo formativo nestas idades é oferecida «através de um conjunto de atividades complementares». Há uma Liga interna (Benfica League), de que se falará amanhã, e a introdução, por exemplo, de futsal. Porquê futsal? «Pelo contacto com diferentes superfícies do pé com a bola, com as partes interna, externa, plantar e bico, pela velocidade na transição dos momentos de jogo, pela predisposição mental muito mais célere à alternância dos momentos de jogo, pela obrigação da leitura ao meio envolvente num espaço mais reduzido e com número significativo de jogadores, pela necessidade de decisão mais rápida e pela elevação do nível técnico de execução. Essa atividade de futsal é executada de duas a quatro vezes por mês. E é de extrema importância.»
‘Cage football’
O Benfica, no Estádio Universitário, vai requalificar dois espaços para lá os jovens praticarem cage football. «O que habitualmente designados de jaulas», esclarece Rodrigo Magalhães, que justifica a opção desta atividade: «Tem tabelas e apela à criatividade do jogador para, ao usá-las, poder rematar à tabela e, no ressalto, tentar fazer golo, assim como driblar adversários. Há uma exploração da espontaneidade de remate, com interações diversificadas, e um tempo útil de jogo total, porque a bola está permanentemente em jogo. Provoca o caos e aleatoriedade e contribuiu para o desenvolvimento dos nossos jovens.»
Motricidade infantil
O Benfica identificou que os jogadores da iniciação, e de uma forma global, sofrem de iliteracia motora. «As nossas crianças e adolescentes não saltam à corda, não sobem muros, não trepam árvores, alguns não sabem fazer uma cambalhota, passam para o desenvolvimento de uma motricidade fina que é o domínio de qualquer coisa nas extremidades, seja uma bola de basquetebol, andebol ou de futebol antes de terem o domínio do que se designa como motricidade geral», começa por dizer, justificando o recrutamento de dois professores de motricidade infantil, em cuja área André Gonçalves tem um projeto pioneiro: «O nosso plano de motricidade infantil contempla o desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais como agarrar, correr, arremessar, ter conhecimento diferenciado do corpo. Percebemos que jogadores de gerações anteriores driblavam de forma diferente, com plasticidade motora muito mais desenvolvida do que os jogadores de hoje. Porquê? Por vários fatores: atração pelos aparelhos eletrónicos, número de horas em frente à televisão, IPad ou telemóvel, pelo desaparecimento do futebol de rua, pelo número de horas passado sentado numa sala de aulas. Sentimos necessidade de trazer a rua para dentro do clube. Foi, sem dúvida alguma, uma aposta ganha. Começa desde os escalões mais baixos até aos escalões de sub-14 e sub-15. Estamos a tentar transitar ainda para o Benfica Campus a atividade de motricidade infantil.»
Muito mais do que dança
«A outra atividade diferenciadora é a dança, lecionada pela Professora Beatriz Nande, mas é dança, ritmo, equilíbrio, coordenação, postura e flexibilidade. É uma forma camuflada de podermos desenvolver todas essas componentes», conta Rodrigo Magalhães, que identifica craques que todos conhecemos com ritmo marcado pelos ritmos da música: «Aí fomos à base, fomos perceber a importância que o Ronaldinho Gaúcho ou o Ronaldo Fenómeno davam ao samba, eles próprios admitem que têm uma forma diferente de driblar, todo o corpo finta.» A atividade começa nas equipas de petizes e traquinas e já chegou ao Seixal, às equipas sub-14 e sub-15.
Foco no jogador
O somatório das atividades complementares, acredita o Benfica, torna o modelo diferenciador. «Acreditamos que o foco tem de estar no jogador. Não formamos equipas, formamos jogadores. E precisamos do meio adequado para fazê-lo». «Em redor das equipas temos um conjunto de departamentos de apoio: fisiologia, nutrição, psicologia, análise e observação, social, escolar, etc. A nossa atividade é centrada no desenvolvimento do jogador. O nosso long-term player development program tem dado muitos resultados, especialmente pelo conhecimento que temos das especificidades em idades críticas», resume Rodrigo Magalhães.