Gerard Garriga, adversário do Benfica no Mundial de Clubes fala da vida do Auckland City, em que os jogadores têm outros trabalhos. Treinam quatro vezes por semana, mas, mesmo assim, venceram 10 das últimas 12 edições da Liga dos Campeões da Oceânia. Ainda que não seja «mesmo difícil», diz
Gerard Garriga, médio espanhol do Auckland City, explica como é a vida de um futebolista semi-profissional. Diz o jogador do adversário do Benfica no Mundial de Clubes que muitos colegas «trabalham em escritórios, em gestão ou na construção» e que o sucesso continental é muito difícil, também devido às condições dos clubes adversários.
— Como se vive o futebol na Nova Zelândia comparado com a paixão de Espanha, onde nasceu?
— É totalmente diferente da paixão com que se vive em Espanha, Portugal, no resto da Europa. Na Nova Zelândia, diria que há outros desportos mais importantes. O râguebi é o desporto mais importante, toda a gente fala dos All Blacks [seleção neozelandesa], mas o futebol está a crescer. A maioria das crianças joga mais futebol do que râguebi. Mas, claro, o futebol ainda não é como na Europa. As pessoas vêm aos jogos, seguem o futebol, mas ainda em número reduzido. Muitas pessoas veem futebol, mais a Premier League, o futebol europeu. A maioria não acompanha tanto o nosso campeonato nacional. Vemos a liga da Austrália também. Esperamos que continue a crescer, mas temos de ter noção de que se trata de uma liga não profissional. Diria que o interesse é o mesmo que há em algumas terceiras divisões, como a de Espanha. Algumas pessoas vão aos jogos, mas não são milhares de pessoas, às vezes são centenas. Um jogo importante pode ter duas mil, mas não mais que isso.
Gerard Garriga, que vai defrontar as águias no Mundial de Clubes, mostra a felicidade por enfrentar as águias, com jogadores que «há dois anos, estavam a celebrar a conquista». Pode é não dar para trocar camisolas: «Só temos duas para jogar o torneio inteiro»
— Que mestrado tirou e o que pensa fazer?
— Tirei o curso de Ciências do Desporto e o mestrado foi em ensino. Tirei o curso para poder ensinar, ser professor de educação física. Quando acabar a carreira, posso ser professor do ensino secundário. Agora estou muito feliz, porque o clube deu-me a oportunidade de trabalhar na academia. Também temos um programa que ajuda a levar o futebol a escolas. Ensinamo-los a jogar e jogamos com eles, para, espero, inspirá-los a jogar e a tornarem-se jogadores do futuro. Nunca se sabe o que pode acontecer. De manhã, vamos a algumas escolas. À tarde, trabalhamos com a formação do clube.
Não estamos acostumados a jogar com 35 graus e 90 por cento de humidade. É mesmo difícil.
— O que fazem os seus companheiros de equipa?
— Alguns trabalham em escritórios de serviços, outros trabalham para a Coca-Cola, outros em gestão, outros na construção. Também temos professores, alguns pintam casas. Alguns deles não estão sequer a trabalhar, porque estão a estudar e moram com os pais. É tudo tão diferente.
— Quantas vezes se treinam por semana?
— Quando estamos a disputar o campeonato nacional, treinamos quatro vezes por semana, além do jogo. Temos dois dias de descanso, normalmente é terça-feira e sexta-feira. Em todos os outros dias, treinamos. Durante a pré-época, podemos treinar todos os dias.
— Como funciona a Liga da Nova Zelândia?
— A Liga de Nova Zelândia tem um formato diferente daquele a que estamos normalmente acostumados na Europa, porque o país é muito grande e nem todas as equipas têm dinheiro para pagar voos e deslocações. O país está dividido em três ligas. A primeira parte da temporada é com as ligas norte, centro e sul. Cada uma tem, penso, 12 equipas. Em cada conferência, quatro equipas passam à fase nacional, duas descem e as outras acabam mais cedo a temporada. A fase nacional é a última parte do campeonato. Os dois melhores da Liga Nacional jogam a final e o vencedor é o campeão da Nova Zelândia. É uma longa competição quando nos apuramos, mas uma liga curta se não o fizermos.
— A nível continental, o Auckland City conquistou 10 das últimas 12 Ligas dos Campeões. O que é que leva a este domínio tão grande também na Oceânia?
— Não é fácil. As equipas da Oceânia são fortes tecnicamente e muito rápidas. As condições que normalmente enfrentamos quando jogamos nas ilhas são mesmo difíceis. Não estamos acostumados a jogar com 35 graus e 90 por cento de humidade. As condições dos campos são muito pobres nesses países. É mesmo difícil. Quando vamos lá, nem sempre podemos jogar o futebol que gostamos, segurar a bola, movimentá-la, jogar futebol posicional. Tornamo-nos mais pragmáticos, mais diretos, porque o relvado está seco, dá para sentir que está cheio de buracos. É como se estivéssemos a jogar nas duas divisões mais baixas de Espanha. Mas é algo a que temos de nos adaptar. Temos vencido tudo porque somos da Nova Zelândia, é um país maior, é mais fácil. Mas, na realidade, é também difícil. Todos os anos temos momentos de sorte. Pode ser nas meias-finais, na fase de grupos… No ano passado, na segunda ronda, ganhámos aos 90+5 minutos e conseguimos a qualificação para a fase seguinte. No ano anterior, fomos a penáltis nas meias-finais. Nas ilhas, o futebol é o desporto número um, eles amam futebol. Todos querem vencer. Ganhámos sucessivamente, mas não foi fácil.
Gerard Garriga, médio do Auckland City, adversário do Benfica no Campeonato do Mundo do próximo verão, fala a A BOLA sobre como foi parar à Nova Zelândia e revela as reações da equipa da Oceânia ao novo torneio