Tudo o que não sei, que é muito mais do que sei

OPINIÃO20.05.202107:00

A vitória neste campeonato não pode nem deve ser um oásis em mais um deserto de quase duas décadas. Esta será a preocupação central do Sporting

PENSEI em escrever estas linhas após terminado o jogo do Sporting contra o Marítimo. Porém, fiquei irritado de ter de esperar até quase à meia-noite para trabalhar! Amanhã volto a escrever de manhã e, se a televisão tem motivos para não sobrepor os jogos do Porto, Benfica e Sporting (só o do Benfica tem importância para o Guimarães), eu não tenho motivos assaz interessantes para esperar o desfecho de um jogo que começa 15 minutos antes das 10 da noite, quando muitas vezes já cabeceio de sono. É certo que gostaria de ter visto Tomás Silva e André Paulo (e terei visto, caso não adormeça), mas nada vos posso dizer sobre as suas atuações.
Como escreveu Gonçalo Guimarães ontem nestas páginas, «o jogo do Sporting é tão tarde que quase já o poderíamos incluir na época 2021/2022». Tem toda a razão; e a mim, mais do que a ele, pesa-me a idade.
Assim sendo, presumo que o Sporting tenha ganho o jogo e que Pedro Gonçalves tenha ficado com A BOLA de Prata. Se não for assim, também não me preocupo. Na frente do campeonato já nada mexia até ao 5.º lugar. Nos lugares de descida é outra conversa, e desde já ficam os parabéns para quem conseguiu manter-se e os votos de rápido regresso para os que não alcançaram esse objetivo, designadamente para o Nacional, que ficou em último.
Ainda que jogos sem importância (ou com reduzida importância) para as posições da tabela da Liga, se tornem em grandes jogos. Veja-se o Benfica-Sporting. Com sete golos foi um jogo espetacular, daqueles que estamos habituados a ver no campeonato inglês. Não me custa admitir que o Benfica mereceu ganhar, pela primeira parte que fez, como não me custa estar convicto que, acaso o Sporting precisasse de pontos, teria feito outra abordagem ao jogo. Aliás, na segunda parte, quando a fez, viu-se o resultado. Recordo a Jorge Jesus, que se orgulha de ser campeão da segunda volta da Liga, que o Sporting ganhou ao Benfica na Luz na segunda parte do encontro. É um critério esdrúxulo, mas tem este dom de coerência.
Acima de tudo viu-se que o Sporting, descomprometido e sem nada a perder, salvo a invencibilidade no campeonato, o que, na verdade, não é algo assim tão importante depois de 31 jornadas invicto, mostrou ter um futebol de primeira água, ao passo que a inteligência e diplomacia de Rúben Amorim colocava em evidência como é curta a equipa. Sem Palhinha e João Mário em simultâneo (e não desmerecendo o talento de Daniel Bragança e de Matheus Nunes, que é muito), o nosso meio-campo não tem argumentos de peso para uma equipa do nível do Benfica, sobretudo quando este faz a que foi considerada a melhor primeira parte de toda a época. Ora, nós vamos jogar contra a elite europeia, pelo que será conveniente estudar bem de quem precisamos, para não termos mais do que uma presença fugaz e sem brilho. Penso que, se não temos a estrita obrigação de passar a fase de grupos (dependendo do grupo que nos calhar), temos, pelo menos, a de passar para a Liga Europa, ou seja, não sermos os últimos.
 

Depois da conquista do título, próxima época será novo desafio para Frederico Varandas


VARANDAS

JÁ aqui dei os parabéns ao presidente do clube, mas ele próprio deve saber que, à medida que cresce, aumenta a sua responsabilidade. Ganhar a Liga foi épico, foi extraordinário; ter o palmarés que tem com três anos de liderança é fantástico; ter acertado (com mérito, óbvio, também para Hugo Viana e Amorim) nas contratações e empréstimos, é algo de raro. O problema é que lhe vamos exigir que continue com esta pontaria afinada e critério quase infalível.
O trabalho que está a ser feito parece-me auspicioso. Claro que vai ser difícil manter todos os jogadores, a começar por Nuno Mendes. Mas seria fantástico aguentar a espinha dorsal, o essencial do plantel, sabendo que, como Palhinha, Pedro Gonçalves e Gonçalo Inácio cresceram muito esta época, também Bragança, Jovane, Plata e os dois Matheus, que foram esteios e, por vezes, decisivos, hão de crescer, como os outros, ainda mais na próxima época. A decisão de Rúben Amorim em não sair, aconteça o que acontecer, é uma enorme garantia; a possibilidade de Pote ir à Seleção é mais uma vitória. Se João Mário conseguir ficar, é muito bom.
Admitamos, no entanto, que é possível antever a saída de alguns jogadores influentes - já falei de Nuno Mendes; Feddal pareceu querer experimentar outros ares e, claro, há sempre as tentações e o dinheiro que se pode dar por Pote e outros. Ainda assim, há do meu lado (e penso que de todos os sportinguistas), independentemente da pena de perder quem nos habituámos a gostar de ver jogar, uma confiança de que existem condições para substituir tais talentos por outros iguais, ou, quem sabe em certos casos, melhores.
Neste momento, Frederico Varandas tem o clube com ele. E nestas alturas de glória e unidade se vê quem consegue manter a cabeça no lugar, o espírito de elevação e a busca de unidade - não com quem ia destruindo o clube e vem agora associar-se aos festejos, mas com todos os que querem o bem do clube.
 

MEDIDAS URGENTES

FAZ agora três anos que houve um período negro na história do Sporting. Na sequência desse período, tive por responsabilidade a Comissão de Fiscalização, que graças ao trabalho, também ele dedicado e gratuito, dos meus colegas, organizou os processos contra os prevaricadores, que seriam mais tarde expulsos ou sancionados.
Se agora estamos a salvo de uma época  como a que vivemos, é bom recordar que as estruturas internas que a permitiram se mantêm intactas e vêm desse tempo. Talvez por ter de lidar com os abstrusos estatutos do Sporting há três anos, e por saber que nunca foram alterados, dê tanta importância ao assunto. No entanto, e muito sinceramente, entendo ser em períodos como este que se torna mais simples, ou menos complicado, fazer reformas. E algumas delas reputo-as de essenciais e urgentes.
Em primeiro lugar, separar a eleição da Comissão Fiscal e Disciplinar, da lista a votar para a Direção. Penso que nas próximas eleições essa alteração deveria estar concluída; ninguém que tenha noção do que deve ser uma associação democrática pode concordar com o modelo imposto pela anterior direção.
Em segundo lugar, impedir que as AG’s continuem a ser uma paródia do que deve ser um local de debate. Há vários modelos que podem substituir este, que está manifestamente ultrapassado e é próprio de pequenas agremiações. O Sporting devia seguir o modelo de clubes que não têm dono, como o Real Madrid ou o Barcelona.
Por exemplo, no Real a AG é composta por 33 representantes por cada mil sócios (são organizadas eleições para os representantes). Além disso, participam por inerência, o presidente, a direção, os ex-presidentes que tenham desempenhado o cargo pelo menos um ano e não tenham perdido a condição de associados. Os cinco sócios mais antigos nas diversas categorias que o clube tem (Honra, Mérito, etc) e os 100 associados mais antigos do clube.
O Barcelona tem sócios que designa como compromisários também designados pela generalidade dos sócios. Como no Real, há inerências.
O que permite isto? Reuniões magnas onde cada um está identificado, pluralistas, em se pode falar e onde uma pequena minoria ruidosa não domina os trabalhos.
O Sporting não necessita inventar a pólvora. Basta-lhe seguir boas práticas.
 

JOGAR FORA

EM CASA — Este ano é, de facto, o ano do Leão. Também somos campeões europeus de hóquei em patins; no sábado podemos ganhar, em Alvalade, o campeonato nacional de futebol feminino, ao receber o Benfica; temos mais atletas do que qualquer outra equipa para os Jogos Olímpicos. Como alguém disse por brincadeira, o Sporting vence tanta coisa este ano que ainda ganha o Festival da Canção. Mas o extraordinário é que, agora, jogar fora é como jogar em casa. Estamos em todas. E para onde vai um…