Solidariedade e equidade
A situação seria mais deplorável para estes clubes, se retirassem os jogos em que receberam o Benfica, ‘abono bilheteiro de época’
TERMINADA a 1.ª volta, o valor das assistências nos estádios é, infelizmente, elucidativo: 9.374 espectadores por jogo (em 2017/2018, tinham sido de 12.000…). Número que tem associado um enorme e agravado fosso. Benfica, Porto e Sporting representam 75,8% dos espectadores e se lhes juntarmos o Sp. Braga e o Vitória SC são 94%! O Benfica só por si recebeu 32,5% da assistência total (54.989 de média/jogo), ou seja praticamente o total acumulado de outros 12 estádios da Liga. A situação ficaria ainda mais desequilibrada e deplorável se, para estes clubes, se retirassem os jogos em que receberam o SLB, verdadeiro abono bilheteiro de época. Elucidativo é também o facto de no top 10 das partidas com mais espectadores, os jogos na Luz ocuparem os primeiros 8 lugares, sendo que o 9.º foi o jogo em que o SLB jogou no Dragão. Mesmo assim, este clássico ficou atrás dos jogos em que o Benfica recebeu o Arouca, Gil Vicente, Paços de Ferreira, Rio Ave, Marítimo, Chaves e Portimonense!
Associado a este assunto, está o sistema de distribuição das receitas televisivas. Concordo com a sua centralização negocial, da qual é suposto haver ganhos globais e diminuição da disparidade entre os primeiros e os últimos. No entanto, há muita coisa a resolver e melhorar para tornar a Liga mais competitiva, mais procurada e exportável. A começar no modelo da competição, que urge reconsiderar apesar do conservadorismo imobilista mais preocupado com o domingo seguinte do que com a década seguinte. Este assunto foi já aflorado por José Manuel Delgado, em moldes que se me afiguram certeiros. Voltarei, em breve, a este tema. Mas é igualmente necessário investir numa verdadeira cooperação dos intervenientes e não na animosidade que desvaloriza o produto final, assim como nas regras e escrutínio público do modelo societário, na justiça desportiva que, no fim de contas, acaba por favorecer a infracção, na arbitragem que teima em se auto-desvalorizar, etc.
A centralização terá também de ter em conta o princípio da equidade, ou seja, tratar igualmente o que é igual e diferentemente o que é desigual, na justa medida dessa diferença. Por outras palavras, o bolo - desejavelmente maior - tendo embora implícita uma melhor distribuição, tem de respeitar a evidência factual do interesse das transmissões em função das assistências nos estádios.
Benfica, Sporting, FC Porto, SC Braga e V. Guimarães representam 94% dos espectadores
FOLHA SECA
Otávio não Otário
Há jogadores para todos os gostos e desgostos. Por exemplo: os cavadores. Além de outros atributos, são elogiados (!) por cavarem bem penáltis e outras faltas, mandando às malvas a lealdade e honestidade profissionais. Dizem-nos até que, por isso, são jogadores inteligentes. A inteligência que não ousam ter nos jogos europeus. Há também os jogadores manhosos e fiteiros, que se fazem de anjinhos e que passam os jogos a contorcer-se na relva, queixando-se da única parte do corpo em que ninguém lhes tocou. Aldrabões, pois então. E há os jogadores produtores de cartões alheios, que provocam o adversário com a mestria dos cínicos e passam a vida a fazer queixinhas ao árbitro num tom inflamado, justiceiro e intolerável.
Mas, crème de la crème, há quem acumule tais atributos do minuto zero ao último apito. Sempre enaltecidos, com elevadas classificações comentaristas, e com a ressalva de que não têm mau carácter, é antes feitio e fibra. Otávio é um seu exemplo paradigmático. Além disso, o homem refila a todo o momento, apesar de nem sequer ser capitão. O certo é que raramente vê um misericordioso cartão amarelo e, ao que julgo, jamais foi expulso! Notável, sem dúvida… Otávio é tudo menos um otário. Não é tolo, nem lorpa, nem trouxa e muito menos ingénuo. Tem a vantagem de (cá) deparar com certos árbitros, esses sim otários selectivos para Otávios específicos. A final da Taça da Liga e o FCP-SLB no campeonato (curiosamente com o mesmo árbitro) foram tão-só um petit peu da condescendência otária para os Otávios do futebol doméstico.
JOGOS FLORAIS
Empresário próximo do Benfica acusado de subornar jogador
in Correio da Manhã
A propósito do Marítimo-Benfica de 15/16
E então Renato Sanches? Além de achar curiosa a qualificação de próximo, que confere um rigor quase científico à frase, parece-me que a referência a um jogador maritimista em causa é escassa. Num jogo em que era decisiva a vitoria do Benfica para se sagrar campeão, faltou falar de outro jogador subornável. Mas este do Benfica. É que o influentíssimo Renato Sanches foi expulso por dois cartões amarelos aos … 37 minutos do encontro, quando o marcador ainda estava empatado!
FAVAS CONTADAS — 121
Os 121 do negócio, da ganância, do assédio abusivo e da ingratidão. O implacável oligopólio do futebol transformou Portugal (em especial, o Benfica) numa plataforma de passagem. Para Ederson, Witsel, N. Semedo, Bernardo, Renato, Félix, Darwin e Enzo bastou uma época, ou meia-época, ou uns meros jogos avulsos para o salto.
FOTOSSÍNTESE
Coração ou carteira?
Aprecio Grimaldo. Bom jogador, que sabe jogar à Benfica. Percebo as suas exigências contratuais, agora que já tem 27 anos. Compreendo a prudência do Benfica que não deve ultrapassar certos limites. Depois do belo golo em P. Ferreira, gostei da sua manifestação de dedicação ao clube, que me pareceu genuína. Mas o dilema aí está, entre o coração e a carteira. Talvez a carteira possa ceder algo ao coração e o coração encontre outras formas de afagar a carteira. Ou como alguém disse, entre ganhar dinheiro e salvar o mundo (leia-se jogar no Benfica), escolha os dois. Dilema que não teve o ingratíssimo e cata-vento Enzo.