Sérgio Conceição: não basta ter contrato
Acabou uma era no FC Porto, mas poucos esperariam que o treinador saísse a mal...
A frase foi repetida pelo agora ex-treinador do FC Porto. Sempre que alguém não dava tudo, que alguém errava, ou que algum jogador (ou quatro) era(m) afastado(s) por castigo, Sérgio Conceição sublinhava: «Não basta ter contrato para jogar no FC Porto». A ideia era simples: acima de qualquer assinatura, nome ou estatuto, estava sempre o clube. E, para estar nele, era preciso não só perceber isso, mas fazer por isso constantemente.
Até aqui, nada de estranho. Conceição, o treinador, não é muito diferente nisso de Conceição, o ex-jogador: trabalhador incansável, obcecado até, e dedicado à camisola que veste até ao último minuto, atravessando alguns limites na defesa desta. Juntando a isso o ADN do FC Porto, o resultado deu muitas vezes a tal raça que Sérgio prometeu desde o primeiro dia não ser o seu único segredo. E não foi, de facto, porque a raça pode ganhar jogos nos descontos e clássicos muito disputados aos rivais, mas não ganha 11 títulos em 7 anos.
Chegados aqui, e no fim da época mais conturbada no universo azul e branco, Conceição sabia - desde que renovou contrato por 4 anos, a dois dias das eleições mais participadas e, na altura, que pensávamos mais disputadas de sempre - o que lhe podia acontecer. Tanto sabia que assegurou que podia sair sem deixar rasto. A razão para a renovação ainda está por revelar, segundo o próprio, mas parece muito claro que foi mais emocional, de gratidão com a figura de Pinto da Costa, do que no interesse do clube, ou até de Sérgio Conceição.
A partir daí, e da vitória esclarecedora de André Villas-Boas, o treinador não precisou de sentar-se à mesa com o novo presidente para saber que o seu futuro no FC Porto estava pelo menos em dúvida. Trabalhou até ao fim, ainda ganhou uma Taça de Portugal, e nada lhe poderão apontar quanto a isso, mas terá começado a pensar no que ia fazer a seguir, tendo até anunciado que a decisão estava tomada e retirado relevância à conversa que ainda estava por acontecer - e ao respetivo poder de intervenção de AVB.
Ora, é por isto tudo surpreendente o que se tem passado nos últimos dias. Com as informações que são públicas é impossível concluir quem traiu quem, mas posso constatar que o mais prejudicado é de certeza o FC Porto. Uma figura histórica como Sérgio Conceição sair a mal já seria um abalo, mas disparar comunicados, publicações familiares, gritos de desespero e traição a toda a hora e promessas de vir a dizer toda a verdade não está ao nível de um funcionário tão aclamado no clube e que sempre avisou que não basta ter contrato para estar no FC Porto.
Os portistas ainda agora se despediram do presidente de décadas e já têm de digerir a saída do treinador que segurou o clube em anos muito difíceis. Não precisam de mais novelas.