Rúben Amorim, o conquistador
'Mercado de valores', a opinião semanal de Diogo Luís
Rúben Amorim iniciou o seu trajeto no Sporting com uma frase que ficou célebre e que marca o seu percurso enquanto treinador: «e se corre bem?». Num momento de grande instabilidade do clube verde e branco, com lutas constantes entre adeptos e direção, com anos de mudanças sem reflexos práticos nos resultados desportivos e após a invasão de Alcochete, que deixou o Sporting mais frágil e exposto, foram as conquistas de Rúben Amorim que uniram o clube. Essa união permitiu ter espaço e tempo para hoje o Sporting estar muito mais estruturado.
‘All in’
De uma forma racional, ainda hoje não consigo encontrar uma justificação para a decisão de Frederico Varandas de pagar a cláusula de Rúben Amorim e retirá-lo ao SC Braga. O Sporting era um clube instável, com dificuldades financeiras e com muito poucos recursos. A verdade é que gastou o que tinha num jovem treinador. Podem dizer-me que Hugo Viana e Frederico Varandas conheciam bem Rúben Amorim, as suas características e forma de trabalhar. Tudo isto pode ser verdade. A questão é que Rúben tinha apenas três meses de treinador de uma equipa da Primeira Liga. Não havia forma de justificar uma decisão com esta dimensão. Pareceu-me que foi um all in e que, como em tantos outros casos, correu muito bem. O mais engraçado é que foi a partir de uma decisão sem justificação aparente que o Sporting ganhou tempo, paz e recuperou o caminho que estava perdido há muito tempo.
As conquistas de Rúben
Nestes últimos quatro anos e meio RA já conquistou muitos títulos pelo Sporting: duas ligas nacionais, uma Supertaça e duas Taças da Liga. Desportivamente é isto que fica e que valoriza o seu trabalho. Contudo, as conquistas do jovem treinador verde e branco são muito maiores. Numa primeira fase, conseguiu conquistar os jogadores, indicar-lhes o caminho e fazer com que estes o seguissem e acreditassem que era possível alcançar o êxito. Definiu, desde o primeiro jogo, um sistema tático de três centrais e teve o mérito de conseguir fazer com que os jogadores se sentissem confortáveis nesta forma de jogar. A forma como conseguiu passar a mensagem internamente foi fundamental para poder ultrapassar outro obstáculo que tinha pela frente: os adeptos. Na altura em que Rúben foi contratado, os jogos em casa começavam com os adeptos a assobiarem e a insultarem o seu presidente. Além disso, muitos também questionavam a contratação de RA, não por ser muito jovem e ter pouca experiência, mas por ser adepto do rival Benfica. Foi precisamente nesta fase que RA começou a demonstrar a sua capacidade em comunicar. Nunca fugiu aos temas, mesmo os mais incómodos. Respondia com um sorriso na cara e de uma forma natural. Nunca se escondeu em chavões, pelo contrário, teve sempre a capacidade de não fugir das questões e de enfrentá-las de frente. Em simultâneo, soube passar mensagens importantes e criar uma união, cada vez maior, entre todos. Um dos grandes exemplos foi o jogo em Famalicão onde no fim RA, depois de alguma confusão entre jogadores, refere que «onde vai um vão todos». Esta frase, aparentemente inocente, foi o mote para unir o plantel e, indiretamente, para fazer com que os adeptos se juntassem à equipa e se transformassem numa mais-valia.
A evolução
Ao longo destes quatro anos e meio Rúben Amorim tem vindo a evoluir como treinador. A evolução fez-se sentir a vários níveis: nas contratações e na evolução da forma de jogar do Sporting. A contratação de mais uma alternativa para a frente de ataque foi uma das maiores teimosias do jovem treinador. Na quarta temporada cedeu (contratou Gyokeres) e ganhou muito com isso. A evolução na forma de jogar do Sporting também tem sido enorme. Esta época a equipa é muito mais completa. Tem maior variabilidade de movimentos, é mais intensa, é mais agressiva ofensivamente e está equilibrada na retaguarda. Ao longo destes quatro anos e meio, o treinador leonino teve a necessidade de reformular a equipa (em função das vendas), e puxou pela criatividade para criar dinâmicas diferenciadas. Um exemplo foi o pós Pedro Porro. Não era fácil substituir o jogador espanhol e a preponderância que tinha na equipa. Rúben inventou e criou uma forma de jogar diferente: na ala direita colocou um jogador de pé contrário (Catamo) e com isso fez a equipa crescer, tornando-a mais imprevisível e mais objetiva.
Ausência de desgaste
Um dos méritos que temos de atribuir a Rúben Amorim é a capacidade de manter os jogadores focados, frescos e motivados. Por norma, quando um treinador está há alguns anos num clube, existe a tendência para haver desgaste entre todos. No caso do Sporting e de Rúben Amorim, tal não se verifica. O que sentimos, de fora, é que não há cansaço entre atletas, equipa técnica e adeptos, pelo contrário. A imagem que passa é de grande união, ambição e fome de vencer. Claro que as vitórias ajudam e são o combustível para tudo andar à velocidade pretendida. Contudo, é importante termos a noção que, para se conseguir fazer isto após quatro anos no clube, é necessário ter uma enorme capacidade de liderança e comunicação.
A valorizar
HUGO VIANA
O ingresso no Manchester City é um enorme passo na sua carreira e o reconhecimento dos seus méritos. Depois de um longo processo de recrutamento, conforme foi referido no comunicado emitido pelo Sporting, o clube inglês escolheu Hugo Viana como sucessor de Begiristain. Trata-se da recompensa do trabalho invisível, da lealdade, da discrição e da capacidade organizativa do jovem dirigente português.