O que está em jogo no Dragão?
Clássico pode ter influência na corrida pelo primeiro, segundo, terceiro e quarto. As equipas têm muito a perder e muito a ganhar. 'Mercado de valores', por Diogo Luís
Hoje joga-se um dos mais apaixonantes clássicos do futebol português. Por norma, além dos três pontos, estes jogos têm uma importância anímica e sentimental que extravasa o contexto desportivo. Nos últimos anos estas duas equipas têm sido aquelas que têm lutado mais vezes, entre si, por títulos. Este ano o cenário mudou. Por culpa própria, o FC Porto está arredado da luta pelo título, com o segundo lugar a uma distância pontual considerável e com o quarto classificado (SC Braga) a apenas três pontos de distância. Já o Benfica está na luta direta com o Sporting pelo campeonato. Desportivamente, o jogo de hoje pode ter influência na corrida pelo primeiro, segundo, terceiro e quarto classificados. As duas equipas têm muito a perder e muito a ganhar.
A abordagem estratégica
Estes são os jogos que todos querem ganhar. A preparação, análise e definição da estratégia são pensadas ao detalhe. É nos pormenores que, muitas vezes, estes jogos se resolvem. Neste campo temos dois treinadores distintos. Sérgio Conceição sente-se como peixe na água nestes duelos. Os melhores jogos do FC Porto nesta época foram frente a equipas de maior qualidade e que não obrigavam os azuis e bancos a terem constantemente a iniciativa de jogo. O treinador portista tem a capacidade de analisar muito bem os adversários e de surpreender, estrategicamente, com alguns posicionamentos que tentam limitar os pontos fortes dos adversários. Em simultâneo, tenta criar condições para potenciar as suas mais-valias. Do lado do Benfica, Roger Schmidt tem um perfil diferente. Não prepara o jogo para tentar limitar os pontos fortes dos adversários e pensa apenas na forma como quer que a sua equipa jogue. A sua atuação prende-se mais com mudanças no onze do que propriamente com surpresas relativas a movimentações ou posicionamentos táticos.
A parte anímica
Tendo em conta o calendário apertado que as duas equipas têm, a vertente anímica ganha uma dimensão especial devido a dois fatores determinantes. O primeiro tem a ver com a força e confiança que uma vitória pode produzir na equipa que consiga vencer o jogo de hoje. O contexto (impacto) do jogo, em si, acaba por ultrapassar o contexto desportivo que ambas atravessam. No caso do FC Porto, uma vitória permite recuperar a confiança e a energia que se sentiu depois da vitória frente ao Arsenal e que caiu por terra no jogo com o Gil Vicente. No contexto atual é fundamental que os adeptos sintam que, apesar de estarem longe da luta pelo título, a equipa tem capacidade para continuar a lutar pela passagem aos quartos da Liga dos Campeões, Taça de Portugal e segundo lugar. Para o Benfica, uma vitória significará a reafirmação da equipa no campo do maior rival dos últimos anos. A confiança que trará a toda a estrutura e adeptos poderá ser fundamental para a caminhada até ao fim da época. Por outro lado, uma derrota, de qualquer um dos lados, irá agudizar a falta de confiança, crítica e instabilidade que se fazem sentir de diferentes formas: no FC Porto por todo o contexto de convulsão interna; no Benfica pela insatisfação dos adeptos face às exibições muito pouco conseguidas.
Importância desportiva
Conforme mencionei anteriormente, desportivamente este jogo tem uma enorme importância. Para o FC Porto vencer é o único caminho. Uma vitória permitirá ficar a seis pontos do Benfica e continuar a olhar para a possibilidade de alcançar o segundo lugar e, consequentemente, uma vaga nas pré-eliminatórias da Liga dos Campeões. Uma derrota ditará o adeus ao segundo lugar e, em caso de vitória do SC Braga, colocará em risco a terceira posição. No caso do Benfica, depois de (mais) uma exibição pouco conseguida frente ao Sporting, uma vitória passará uma imagem de força rumo ao objetivo da renovação da conquista do título. Se o fizer, irá conseguir manter a liderança da Liga e, à 24.ª jornada, garantirá que os dois primeiros lugares irão ser ocupados por Benfica e Sporting. Já uma derrota fará com que o Sporting ganhe avanço e com que o FC Porto se motive na perseguição ao segundo.
Importância financeira
Por termos perdido um lugar no ranking da UEFA, este ano, teremos apenas uma equipa com entrada direta na Liga dos Campeões e o segundo classificado irá jogar as pré-eliminatórias da Liga dos Campeões. Este fator tem uma importância fundamental, porque a prova milionária é responsável por cerca de 30% dos proveitos operacionais (excluindo vendas de jogadores), tanto do FC Porto como do Benfica. Ora, tendo em atenção a situação financeira dos dois clubes, percebemos que estamos perante diferentes dimensões. No caso do FC Porto, a não entrada na Liga dos Campeões irá ter um impacto muito significativo, tendo em conta a alavancagem e o facto de grande parte das receitas do futuro já estarem antecipadas no presente. A ausência dos milhões associados à liga milionária irá obrigar os azuis e brancos a um enorme ajustamento e racionalidade nos custos operacionais e a limitar, de uma forma considerável, o investimento na principal atividade - a equipa de futebol profissional. Do lado dos encarnados, a situação é mais estável. Contudo, o último Relatório e Contas semestral vem confirmar o que tenho vindo a referir: um descontrolo dos custos face aos rendimentos obtidos. Conforme foi referido no comunicado enviado à CMVM, este foi o segundo melhor semestre de sempre no que respeita a proveitos operacionais (excluindo vendas de atletas). O que o comunicado omitiu é que os custos operacionais (€110 M) foram superiores aos proveitos operacionais (€106 M), ou seja, o Benfica gasta mais do que recebe… Apesar de ter vendido Gonçalo Ramos por €65 M, o resultado líquido semestral é de apenas €18 M. Se fizermos uma previsão para os resultados do segundo semestre, tendo em conta os números apresentados, rapidamente percebemos que, se tudo se mantiver como até aqui, o resultado anual será negativo entre €40 M e €50 M. Nestas contas já estou a incluir as vendas de Lucas Veríssimo, João Victor, Musa e Chiquinho. Assim, para que as contas no ano fiscal estejam positivas, o Benfica terá de vender mais uma das suas joias. O aumento descontrolado de custos faz com que sejam necessárias duas vendas anuais e não apenas uma, como era norma no passado. Estes números são fundamentais para percebermos a dimensão que a presença na Liga dos Campeões tem para o Benfica. Se o clube da Luz falhar a entrada na fase de grupos da próxima época, a diferença entre proveitos operacionais e custos operacionais ficará ainda mais descontrolada e poderá obrigar a um desinvestimento no futebol profissional ou a uma maior pressão para que se vendam os melhores ativos, para reequilibrar as contas. É fundamental que o Benfica comece a inverter a tendência dos últimos dois anos, caraterizada por aumento constante e elevado dos custos operacionais e do endividamento que passou de €98 M em 2020 para €193 M em 2023!
A valorizar
Coates. Há imagens que valem por mil palavras. Os verdadeiros líderes são discretos e fazem o que têm de ser feito. No final do jogo, Coates dirigiu-se a João Neves e deu-lhe força num momento delicado da vida do jovem jogador português. Coates foi líder, demonstrou respeito e solidariedade por um companheiro de profissão. Rivais dentro do relvado, unidos fora das quatro linhas.
A desvalorizar
Chaves. A derrota pesada em casa frente ao Arouca foi mais uma oportunidade perdida de ganhar algum fôlego na tabela classificativa.