O menino que queria ser peixe

OPINIÃO28.07.202306:30

Diogo sonhou ser Marlim, Francis ousou ser chita. Trocaram as horas de todos os dias por centésimos de segundo

ERA uma vez um menino que queria ser peixe. Mas não um peixe qualquer. Ele queria ser um marlim. Um marlim preto. Atingir a velocidade de 129 quilómetros por hora. O menino queria mesmo ser o peixe mais rápido do mundo… 

Este podia bem ser o primeiro parágrafo de um livro infantil. O herói da história tem um nome: Diogo Ribeiro, medalha de prata nos 50 metros mariposa dos mundiais de natação. O primeiro português medalhado na história. Um livro que nos remete para «O menino que queria ser chita». A história de Francis Obikwelu, inimaginável prata nos 100 metros dos Jogos de 2004.

Se alguém me perguntar a que distância fica o céu eu respondo que fica a quatro centésimos de segundo… Os quatro centésimos que separaram Diogo Ribeiro de Jacob Peters. O Diogo recebeu a medalha e subiu ao pódio, o britânico ficou em quarto. E se alguém me perguntar a distância para o Inferno, eu respondo que fica também a quatro centésimos de segundo. Há dois anos, Diogo Ribeiro foi abalroado por um pesado e projetado da moto. Nem teve tempo para piscar os olhos, quando os abriu estava numa ambulância sem parte do dedo indicador da mão direita, uma fratura no pé, hematomas e queimaduras. E se alguém me perguntar a que distância fica o Inferno do Céu, respondo que não, não são oito centésimos de segundo. No caso do Diogo, são milhares de horas. Reconstrução do dedo, cura das mazelas físicas e psicológicas, treino, acompanhamento, sacrifício, ambição e paixão sem limites. Porque o Diogo queria muito ser um Marlim. E encher de orgulho a mãe, que o incentivou sempre a fazer desporto como parte da terapia para superar ter perdido o pai aos quatro anos.

Diogo Ribeiro não precisou de ir para uma qualquer universidade norte-americana. «Acho que não preciso de sair de Portugal para chegar ao topo», chegou a dizer. E não saiu. O talento associado a muito trabalho e paixão podem dar resultados de excelência quando enquadrados num projeto de carreira, condições de treino e uma competente equipa multidisciplinar de apoio permanente. Do treino técnico à biomecânica, passando pela psicologia. Porque também temos bons exemplos, Portugal soube criar condições para o Diogo Ribeiro. Mas o grande mérito é dele e da forma como ele encara a vida. Sim, a vida.

O Diogo tem apenas 18 anos, eu tenho 53. E ele é um dos meus ídolos. Porque ganha? Não. Porque não hesita em trocar as 24 horas de cada dia por quatro centésimos de segundo.