O Benfica merece respeito

OPINIÃO21.12.202105:30

O que se tem registado nos últimos dias ou semanas é reprovável, da parte dos representantes do Flamengo e também de Jorge Jesus

O S dirigentes do Flamengo que vieram a Portugal, alegadamente para levarem Jorge Jesus de volta, assistiram à goleada de Natal num camarote do Estádio da Luz, discretos, de modo a protegerem-se de alguma reação destemperada por parte de adeptos mais exaltados e cansados de assistirem a esta novela, mais uma, muito parecida com as anteriores em que a figura central é o artista do costume.
Noticia o jornal A BOLA, na sua edição de ontem, que, apesar da presença de tão ilustres figuras, ninguém conseguiu avistar Jorge Jesus. No banco já se sabia que não  iria sentar-se, por estar em cumprimento de castigo, mas talvez fosse possível enxergá-lo em camarote vizinho dos amigos brasileiros, igualmente escondido da curiosidade jornalística, sobretudo dos repórteres de imagem, mas parece que não. Provavelmente, até estaria no estádio em local de acesso reservado, na área de trabalho, com os cuidados necessários para a sua presença não ser denunciada.
Provavelmente, insisto, por ser pormenor de pouca relevância na medida em que tudo quanto quis dizer aos jogadores pôde fazê-lo no recato da academia do Seixal. Quanto ao resto, as modernas tecnologias de comunicação solucionam e João de Deus, uma pessoa educada e sensata, de certeza que sabe escutar e transmitir sem ruído as instruções do chefe, estando eu convencido de que, confrontados com o massacrante folhetim acerca do sai-não-sai, os próprios jogadores ter-se-ão sentido aliviados por não descortinarem a presença do seu treinador junto ao relvado. Calma!, não se indignem os fiéis de Jesus, nem se deem ao incómodo de reconhecerem que se calhar até tenho razão.

Énatural que os jogadores estejam fartinhos desta história, que os atinge também, na medida em que deveriam ser conduzidos por um líder a tempo inteiro, nas horas boas e más, nas vitórias e nas derrotas, sempre, e não por alguém com uma estratégia contorcionista que tanto promete fidelidade à águia como diz ter a mala pronta e a porta de saída entreaberta ou, no caso concreto, dá a entender não ser nada com ele, mas se tiver de acontecer, paciência, desde que alguém lhe ponha na mão a indemnização correspondente.
Pode ser legal, mas não é bonito. É mais uma questão de querer ou não querer. Rúben Amorim não quis, e quando foi divulgada a hipótese de trocar o Sporting pelo RB Leipzig imediatamente colocou um ponto final no assunto, afirmando que só estará disponível para ouvir o que seu representante terá para lhe dizer no próximo defeso, mas a Jorge Jesus parece dar-lhe gozo este falatório, até para alimentar a sua personalidade megalómana, como prestigiado especialista a definiu.    
 O Benfica merece respeito. O que se tem registado nos últimos dias ou semanas é reprovável, da parte dos representantes do Flamengo, com discurso feirante e comportamento insolente, e também de Jorge Jesus, o qual, recordando situações anteriores, apenas dá valor ao seu interesse profissional e à sua vontade. O que sobra não existe, é para deitar fora. Tanto assim que nem sequer revelou o mínimo de cuidado no encontro recente com o seu presumível empresário, tratando-se de quem é. Mas isso só a ele diz respeito, que escolhe com quem fala e de quem se quer rodear.

DOMINGOS Soares Oliveira, CEO do Benfica, afirmou recentemente que não faz sentido discutir o futuro do treinador a meio da temporada e alicerçou o seu ponto de vista em argumentação convincente e irrepreensível que apenas mereceu a reprovação de uns tantos por não ter dito o que pretendiam que dissesse além do que disse, e que foi o seguinte: «Até à data, o que tínhamos para cumprir, cumprimos […]. Não vejo razão para andar a discutir isto [o futuro de Jorge Jesus] em dezembro, quando ainda temos pela frente seis meses de competições.»
Creio que toda a gente que quer o bem estar do clube corroborou o significado da mensagem, sendo certo, no entanto, que Rui Costa terá de ser arguto e diligente para não se deixar apanhar no colete de forças que lhe querem colocar, tornando-o refém de decisões que não deseja nem trazem progresso. Neste sentido, é uma imprudência cair no erro de fazer depender o futuro imediato dos resultados dos dois próximos jogos com o FC Porto, quer sejam positivos ou negativos. Primeiro, porque ganhar é uma obrigação, ninguém contrata um treinador principescamente pago para perder, depois porque dois jogos apenas, independentemente do nome do opositor, são de menos para interferirem em projeto desportivo de três/quatro anos, que ainda não existe ou, existindo, não foi anunciado.  
O Benfica continua a navegar à vista da praia, motivo pelo qual talvez não fosse má ideia Rui Costa, com a brevidade possível, cortar o mal pela raiz e iniciar novo ciclo, o ciclo da sua presidência, que presumo ser o que todos os adeptos mais esperam dele. Deve respeitar o contrato com Jesus e partir para nova etapa, numa decisão amadurecida e assumida, independentemente de fazer sol ou trovejar na altura. É urgente higienizar o ambiente, apagar as sequelas do passado recente e oferecer um futuro de esperança ao emblema da águia. Um futuro que honre o Benfica bicampeão europeu.