Não há grandes jogadores estúpidos!

OPINIÃO05.11.202205:30

A entrevista com Luís Figo, que A Bola publicou ontem, entusiasmou os sportinguistas. Seria bom. O futebol precisa de pessoas inteligentes

N UMA daquelas conversas preciosas que eu tive a sorte de ter tido com António Lobo Antunes, o escritor que adora futebol, mais do que o Benfica, interrompeu uma qualquer linha de previsibilidade do pensamento pa- ra dizer, como se refletisse: «Vítor, já reparou que não há grandes jogadores estúpidos?» Apresentou-me, precisamente, o exemplo do Eusébio, que considerava de uma excecional  inteligência na decisão espontânea, em movimento. Em pouco tempo e em pouco espaço decidia quase sempre bem.
Vem esta recordação a propósito da excelente entrevista concedida por Luís Figo ao RogérioAzevedo e que A BOLA, na linha da sua melhor tradição, publicou ontem para deleite dos seus leitores.
Uma vez, em Madrid, numa das entrevistas que me concedeu, Luís Figo confessava-me que nunca sentira ter sido o melhor jogador do mundo, mas que tinha merecido inteiramente a Bola da Ouro e, no ano seguinte, o Prémio da FIFA porque sendo ele um dos melhores era, manifestamente, o que mais trabalhava. Figo tinha a consciência de que tinha de trabalhar mais e melhor do que todos os seus concorrentes para ser o melhor e, de facto, conseguiu o seu objetivo.
Também havia outro fator decisivo e que desequilibrava a seu favor: a inteligência. Figo sempre teve uma personalidade muito vincada, capaz de suportar as maiores pressões psicológicas e uma lucidez de raciocínio, uma extraordinária bússula mental que o faz sempre saber para onde vai e por onde vai.
A sua vida empresarial tem sido, felizmente, um sucesso e do futebol mantém um contacto sempre próximo, embora, nunca demasiado íntimo, porque muitas vezes queima. Agora, continua a admitir, embora de uma forma quase desinteressada, que um dia até po- de vir a ser presidente da FIFA , da UEFA ou até do Sporting ao qual se mantém ligado por trinta anos de sócio efetivo.
Calculo que muitos milhares de sportinguistas se tenham sentido entusiasmados com esta afirmação de Luís Figo. Admitir que poderá vir viver para Portugal já no próximo ano e poder vir a ter, mesmo como mera hipótese, vontade de se candidatar à presidência do Sporting deixará, entre os sportinguistas, mais do que um sonho, uma convicção numa esperança que se torna ainda mais legítima.
Não deixaria de ser curioso ver o Benfica presidido por Rui Costa e o Sporting por Luís Figo. Quem sabe, até, no futuro, o FC Porto por Vítor Baía. Todos eles foram grandes nos seus clubes e na Seleção. Todos eles são respeitados pelo povo do futebol. Todos eles têm evoluído na internacionalização. Todos eles foram grandes profissionais e são inteligentes.
Num tempo em que muito se fa- la na modernidade da inteligência virtual, a verdade é que o futebol português continua a ter muito a ganhar com a inteligência real dos homens e das mulheres que a ele se querem dedicar.
Como se esperava da personalidade invulgar de Luís Figo, não foi uma entrevista revivalista, apesar de estar a comemorar o seus cinquenta anos de idade. Como Figo dizia, não irá acordar amnhã a pensar na idade. Nem no passado. Pensará, como sempre no futuro e nu- ma ideia de ser um português, cidadão do mundo e que vive, por enquanto, em Madrid. Figo é um homem dos tempos modernos e pode muito bem vir a ser, mais do que um presidente do Sporting, um líder com um projeto especial para o seu clube, algo que seria interessante conhecer, mas que Luís Figo, razoavelmente, mantém reservado e apenas tornará disponível se e quando essa oportunidade se tornar real. Figo é bem mais um homem de realismos do que de sonhos e nunca arriscaria promessas apenas para se tornar mais popular.


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