Lugar estranho

OPINIÃO04.03.202205:30

Como a maturidade pode ainda pesar tanto num jogo entre grandes equipas

Ojogo de futebol é, por vezes, um lugar tão estranho que esta semana, imagine-se, quase se pode dizer que o fabuloso golo do espanhol Pablo Sarabia fez mal ao Sporting no confronto, em Alvalade, com o FC Porto, primeira mão das meias-finais da Taça de Portugal. E para que melhor compreendamos que no futebol nem tudo se explica com estatísticas, depois de chegar ao golo e à vantagem no jogo, os leões deixaram de ser tão bons como tinham sido até aí. É estranho, não é?! Lugar, pois, por vezes tão difícil de explicar e de compreender, mas, ao mesmo tempo, tão simples de ver, um jogo de futebol tem razões que até a razão desconhece, e basta um deslize, uma má decisão, uma escorregadela, uma desatenção, um toque mal dado, um choque inadvertido e involuntário, para o alterar significativamente.

Claro que é possível perceber o que levou o jogo da última quarta-feira a estar, até dada altura, tão favorável ao Sporting e a passar, a dada altura, a ficar tão favorável ao FC Porto. A desastrada intervenção do jovem Pedro Porro no lance em que derrubou Evanilson para penálti, e as substituições, que tão bom resultado deram para os azuis e brancos e tão ineficaz resultado deram para os leões, ajudam a explicar muita coisa. Mas nunca explicam tudo.

Os fatores emocionais, ou seja, a ligação mental ao jogo e o comportamento dos jogadores perante as diferentes situações que o jogo vai colocando, fazem mesmo muita diferença no rumo que os jogos tomam. Assim como a compreensão mais ou menos imediata, mais ou menos trabalhada e preparada, mais ou menos amadurecida, com que os jogadores absorvem as decisões que vão sendo tomadas pelos treinadores.
No caso, enquanto sentiu a equipa do Sporting dificuldades em se adaptar às alterações feitas por Amorim, o FC Porto só ganhou com as mexidas preparadas por Conceição. Foi o jogo decidido, assim, a partir dos bancos? Talvez. Certa parece-me, porém, a diferença de maturidade que ainda existe entre as duas equipas. E a maturidade, acreditem, ajuda muito a ganhar jogos, sobretudo entre grandes equipas.

Peguemos no exemplo, apenas um exemplo, de Pedro Porro no lado do leão, e de Taremi no lado do dragão. O jovem espanhol Porro é um talento, uma espécie de puro-sangue; mas, e perdoem-me a expressão, comporta-se e reage ainda, em muitos momentos, como um potro, sim, puro-sangue, sim, mas selvagem - impetuoso, rabugento, refilão, impulsivo, naturalmente mais irreverente, o que é, em parte, normal, pela idade, pela inexperiência, pela imaturidade. Se ganhar mais controlo, mais domínio, mais e melhor equilíbrio, será um caso muito sério no futebol europeu. Mas não ainda.

Já Taremi, porventura até pela cultura, é, no campo de jogo, um exemplo de maturidade, alguém que nunca ferve em pouca água, que, pelo contrário, parece um bloco de gelo mesmo quando parece pender sobre ele a suspeita (justificada ou não) de estar a tentar ludibriar o adversário ou, sobretudo, o árbitro.
O meu querido Vítor Manuel, de quem absorvo tanta experiência e conhecimento, costuma dizer-me do inglês Harry Kane que é «o melhor defesa-central, o melhor médio centro e o melhor avançado do Tottenham!», tal a qualidade e o espaço de intervenção do fantástico número 10 da equipa londrina.
Com Taremi, com as devidas diferenças, quase se passa mais ou menos o mesmo, e, portanto, quase podemos ver Taremi como uma espécie de «bom defesa, bom médio e bom avançado» do FC Porto, tal a qualidade e também o espaço de intervenção do número 9 dos dragões.

Ainda agora, em Alvalade, Taremi marcou um golo na irrepreensível execução de um penálti, fez brilhante assistência para outro e ainda aliviou, de bicicleta, a bola na sua grande área (competente, pois, a defender nos lances de bola parada) depois de o guarda-redes Marchesín ter evitado, de forma absolutamente soberba, o golo do empate, na sequência de um também magnífico golpe de cabeça de  Coates. Porro e Taremi podem, assim, exemplificar, de algum modo, as diferenças, não de talento ou de qualidade, mas de maturidade das duas equipas, e talvez também por isso, não apenas por isso, evidentemente, mas também por isso, sublinho, na época em que o leão está mais tempo nas provas europeias e mais tempo na Taça de Portugal, com um desgaste e uma exigência muito superiores à da última época, acabe por pagar preço mais elevado e, muito provavelmente, se veja, por fim da temporada, por ter de se contentar desta vez com… a Taça da Liga e a Supertaça.

COM toda a franqueza, não sei se Artur Soares Dias é o melhor árbitro português, até porque isso de nomear o melhor, seja em que área profissional for, terá sempre muito que se lhe diga. Sabemos que há sempre, estatisticamente, muitas formas de se indicar o melhor, o primeiro, o mais bem-sucedido, mas mesmo a estatística, sempre tão infalível, nem sempre será suficiente para definir o melhor.
Compreendo porque será Soares Dias olhado como o melhor se considerarmos o reconhecimento internacional, porque, na verdade, é hoje Artur Soares Dias o nome mais forte da arbitragem portuguesa além-fronteiras. Terei, como a maioria, a minha forma própria de olhar para os melhores, e, no caso da arbitragem portuguesa, continuo a olhar para João Pinheiro como o melhor dos árbitros portugueses que apitam na Primeira Liga. Posso, evidentemente, não compreender em pleno o que faz de um árbitro um grande árbitro, mas, perdoem-me a opinião, julgo saber identificar, pelo menos, o que não deverá fazer um grande árbitro, e, do ponto e vista técnico, dou já o exemplo da chamada lei da vantagem como um dos instrumentos ao dispor de um árbitro que melhor me parecem definir a qualidade do respetivo trabalho em campo.

Muito criticado pelo desempenho num controverso lance que impediu golo do Benfica no jogo com o Gil Vicente, no início de fevereiro, numa decisão que não me parece de um grande árbitro, também agora, no Sporting-FC Porto, vi Artur Soares Dias - e esteve longe de ser a primeira vez - agir como não deve agir um grande árbitro nas tais situações de lei da vantagem que considero (talvez exageradamente, admito) muito importantes na qualificação mais ou menos positiva do respetivo trabalho. Compreende-se que o árbitro assinale uma falta sobre o leão Paulinho quando o Sporting ficou com a bola e prosseguia promissor contra-ataque? Não, não se compreende. No trabalho de um árbitro, é essencial o contributo para a qualidade do espetáculo. E onde mais pode contribuir o árbitro para a qualidade do espetáculo senão no uso da lei da vantagem, deixando jogar e, ao mesmo tempo, permitindo bom ritmo ao jogo?
Apitando como tantas vezes apita, Artur Soares Dias não poderia apitar na Premier League, onde a aplicação da lei da vantagem é, creio, um dos critérios do trabalho dos árbitros com maior e mais positivo impacto no jogo.

Em Portugal apita-se muito, apita-se demasiado, pune-se demasiado o contacto num jogo de contacto, e, mais ou menos erradamente, dá-se demasiado a ideia (péssima para o espetáculo e para o espectador) de se usar o apito para conduzir o jogo e não apenas para o dirigir. Não falharão os árbitros ingleses? Claro que falham! Mas adoro ver como dirigem os jogos da Premier League. Enfim, talvez não tenham assim tanta qualidade e o defeito seja meu!...

NÃO era preciso ouvir Rúben Amorim (que está do lado de dentro) para todos (do lado de fora) percebermos que tão depressa não se conhecerão os castigos ao leão Tabata e ao dragão Pepe, na sequência dos inquéritos disciplinares instaurados pelo comportamento de ambos nos lamentáveis incidentes após o FC Porto-Sporting da Liga, jogado a 11 de fevereiro.

Pela forma como falou, afirmando contar com Tabata por não acreditar na revelação dos castigos antes dos jogos da Seleção do play-off do Mundial… parece claro que Rúben Amorim terá querido dar a sua alfinetada na Federação e respetivo Conselho de Disciplina. Será, porém, uma forma mais azeda do que propriamente razoável de ver o problema, porque sendo lamentável que no futebol português, em matéria de disciplina, quase tudo demore muito tempo a ser resolvido, a verdade é que, mesmo sem qualquer play-off, mesmo sem Seleção, e mesmo sem ser português, o médio do Benfica Adel Taarabt esteve o ano passado três meses para conhecer o castigo por incidentes ocorridos nos últimos instantes da final da última edição da Taça de Portugal, que opôs as águias ao SC Braga. O jogo foi a 23 de maio e o castigo apenas foi tornado público a 28 agosto.

Assim se exemplifica o que vai certamente suceder com Tabata e Pepe, que, como se vê, pelo habitual andar da carruagem, só conhecerão em definitivo a consequência do inquérito disciplinar, na melhor das hipóteses, lá para a primeira quinzena de maio, quem sabe, já resvés Campo de Ourique com a última jornada da Primeira Liga, que se jogará a 15 de maio, e já com o campeão conhecido.
Se o futebol português fosse um bocadinho menos complexo não lhe faria nada mal!...