Intercâmbio de árbitros
Se é para desenvolver, cooperar e formar, sim: venham daí e venham já
EM 2004 (há 17 anos, portanto), a UEFA sugeriu às suas federações que aderissem a programas de intercâmbio de árbitros. A ideia era tão boa como é hoje: a de permitir que os mais novos pudessem conhecer outras realidades competitivas, partilhando experiências e desenvolvendo competências em ambiente diferente do seu.
Esse espírito, o da aprendizagem e colaboração mútuas, validam esta iniciativa como muito pertinente. No entanto, e desde então, contam-se pelos dedos de uma só mão as entidades que responderam afirmativamente a esse repto.
Em fevereiro de 2020, Conmebol e UEFA assinaram em Nyon um contrato que previa, entre outras, a possibilidade de árbitros europeus dirigirem jogos da fase de grupos da Copa América. Em troca, juízes sul-americanos poderiam ser chamados a arbitrar algumas partidas da Liga Europa e Liga dos Campeões. Mas para além desse acordo, a esmagadora maioria das permutas que ocorreram na arbitragem mundial não se deveram a questões formativas, mas a imperativos que nada têm a ver com educação ou partilha de vivências.
Na Grécia, por exemplo, árbitros estrangeiros são chamados a dirigir jogos da primeira liga porque a federação helénica está intervencionada por FIFA e UEFA desde 2016. O fenómeno de violência nos estádios e as alegadas manipulações de resultados não deixaram alternativa. Embora por motivos diferentes, acontece o mesmo em países como Arábia Saudita, China ou Catar: os juízes de outras nacionalidades são convidados porque as federações locais assumem que os seus juízes são incompetentes ou inexperientes (?).
Uma das premissas que o organismo europeu vincou logo em 2004 é que estes intercâmbios devem excluir liminarmente a direção de jogos decisivos ou de forte impacto mediático: dérbis, clássicos e partidas de risco não podem entrar nas contas, por «ferirem de morte» o espírito pedagógico ali subjacente. Além disso, a opção passaria para o exterior mensagens negativas. Mais, muito mais do que positivas.
E é precisamente aqui que aterramos na nossa realidade. A ideia de fazermos intercâmbio com árbitros de outros países está regulamentada desde 2012. Será sempre bem-vinda, se alinhada com aquela premissa didática.
Se assim não for, o que estaremos a dizer ao futebol português é que os nossos árbitros não aguentam a pressão, têm que ser protegidos ou que são apenas incompetentes. Pior. A utilização de juízes estrangeiros em jogos a doer jamais resolveria questões de fundo, questões estruturais. Talvez as críticas pontuais tivessem outros destinatários (isso é solução?), talvez se percebesse que o erro é transversal (ainda não se percebeu?), mas a verdade é que o nosso quadro de árbitros seria o mesmo depois disso. Estariam todos cá, prontos para arbitrar os jogos que viessem a seguir.
Não se resolvem problemas com pensos rápidos. Se é para desenvolver, cooperar e formar, sim: venham daí e venham já. Se é para ceder a pressões, para evitar desconfianças ou para tapar o sol com a peneira (e eu sei que não será)... não. A Grécia está na Grécia.