Inexperiência e responsabilidade
Roger Schmidt e Rui Costa (Foto: André Alves)

OPINIÃO Inexperiência e responsabilidade

OPINIÃO07.05.202411:00

«Setor desportivo profissional não tolera a falta de experiência». 'Cortar a direito', por João Diogo Manteigas

A derrota em Famalicão no domingo passado é uma consequência de algo maior que se tem vindo a propalar nos últimos anos no universo vermelho e branco. Em concreto desde outubro de 2020, mas com maior destaque para a linhagem de continuidade que os sócios, soberanamente, traçaram em outubro de 2021.

Esta derrota produz um efeito transcendentemente superior e muito mais profundo que a mera antecipação da atribuição da faixa de campeão ao Sporting. Traduz-se num constatar factual de que existe uma ferida aberta e que a conquista do 38.º título em 2022/23 jamais a iria sarar minimamente, tal é a impotência de quem tem poder para a higienizar e estancar.

Fiquem cientes: a gestão do universo Sport Lisboa e Benfica, com particular incidência no futebol, não é mais do que uma vulgar continuidade daquilo a que já se assistiu com anteriores direções. Tal se prova pela percentagem de 66,6% de manutenção dos membros que compõem os órgãos sociais que transitaram do mandato de Vieira em 2020 para o de Rui Costa em 2021. Embora não me seja permitido desconfiar da vontade de ação das (muito poucas) mentalidades novas que entraram para o Clube e para a SAD, é factual que as mesmas são curtas e insuficientes para se juntarem na liderança de uma gigante multinacional, quanto mais de uma marca que tarda em ser protegida, acarinhada e desenvolvida e que, se cuidadosamente direcionada, tem uma potencialidade enorme de fazer tremer o mercado onde se insere.

O setor desportivo profissional não tolera a falta de experiência, nem dá tempo a quem não a tem para a conquistar. Neste mesmo setor onde me integro intensamente há 17 anos, aprende-se que a falta de transparência, adaptação e pulso forte significa uma morte lenta em que só se desconhece a hora da sua consumação. E não esqueçamos que o líder tem que agradar e manter vivo o imperioso associativismo. Este mesmo que permitiu Rui Costa aceder ao cargo sobre o qual não se poderia furtar, tal era a sua responsabilidade. Palavras dele após Vieira ser detido em Julho de 2021.

De facto, este tem vindo a declarar, envergonhadamente aqui e ali, que assumirá a resposta em relação aos atos que praticou, o que engloba a incompetência. Tomo nota que já se anda a debater o investimento de 97 milhões feitos só esta época em contratações (Rollheiser contabiliza apenas 1 milhão pelo seu empréstimo dado que a ativação da sua compra obrigatória de 9,5 milhões foi empurrada para o próximo exercício financeiro). Então e as épocas anteriores, desde 2021? Espero que não se esqueçam da contabilização do que virá em 2024/25! Tal como não se deve olvidar as vendas onde temos que incluir a antecipação da verba de Gonçalo Ramos, cujo negócio não faz sentido como empréstimo inicial com compra obrigatória. Mas porque raio é que o SLB tem que colaborar com o PSG na sustentabilidade financeira deste ou porque é que os qatari franceses (que estão carregados) têm que ser sensibilizados a pagar na altura em que o SLB determinar? Laboral e financeiramente, o mercado de transferências deve ser trabalhado de forma simples: só se abre a porta a quem estiver comprovadamente disposto a pagar o valor pretendido pelo atleta nos termos e condições fixados contratualmente ou, então, a FIFA está sempre aberta a receber queixas em relação a clubes e agentes que perturbam a paz do jogador e do clube onde ele foi influentíssimo e um marco da formação.

Resta saber se Rui Costa também assume a responsabilidade pelos atos daqueles que a si se encontram conectados no universo aqui retratado, sejam assalariados de topo, diretores ou administradores. Seria útil perceber a sua visão sobre as palavras do atual capitão de equipa Otamendi após o desastre final de domingo passado. Em bom e percetível argentino, referiu que só não falou por outras vezes em «momentos mais difíceis» como nunca teve oportunidade de se «defender nesse sentido» e «dar a cara quando as coisas correm mal» devido a uma decisão da comunicação interna. Mas a entidade empregadora impede os seus assalariados de dar a cara? De se organizarem numa defesa mútua e antecipada, seja dos jogadores ou da entidade que representam, pois um iluminado ou um grupo deles, que nada percebe de futebol e menos de Benfica, entende que era prejudicial?