Há quem não acredite que o céu é o limite
Armand Duplantis
Dia 4 do mês de Fevereiro de 2019. Nesta data sucedeu uma das mais fascinantes e empolgantes proezas jamais testemunhadas numa competição desportiva. E logo na rainha de todas as modalidades - o atletismo, evidentemente. O responsável por tal incrível momento histórico foi um rapaz sueco (nascido nos Estados Unidos, filho de uma sueca e de um americano saltador à vara) que acabou de completar 20 anos. O seu nome é Armand Duplantis. Repitam comigo: Armand Duplantis. Outra vez: Armand Duplantis.
O seu nome não diz nada a quem faz o favor de ler esta crónica? Provavelmente, não. Por isso a pergunta resulta inevitável: o que é que faz na vida este rapaz? Bem, basicamente nasceu para ser o melhor do mundo e de todos os tempos a saltar da terra para o céu. E vai a caminho de, muito em breve, cumprir o seu destino.
Em 2015, com apenas 15 anos de idade, tornou-se campeão mundial sub-18 na disciplina do salto com vara. Na sua primeira época como sénior conquistou a medalha de prata nos Campeonatos do Mundo de Atletismo disputados em Doha (Qatar), sobrevoando a fasquia colocada a 5,70 m do solo. E em 2018, na final do Campeonato Europeu realizado em Berlim, obteve o melhor registo da sua carreira, vencendo a prova com 6,05 m.
Armand Duplantis resolveu começar nesta última terça-feira a temporada de 2020, participando no Meeting Indoor de Dusseldorf. Um salto de 6,00m, realizado com uma absurda e inaudita facilidade, logo lhe garantiu a vitória no torneio. Mas este rapaz não anda nesta vida para coleccionar prémios. Ele parece mesmo não acreditar que o céu seja limite algum. Por isso, assegurada a vitória, em vez de a celebrar partiu para algo quase alucinante: mandou subir a fasquia em 17cm! Porquê? Ora, porque o recorde mundial está nos 6,16 m…
E a multidão que ainda povoava as bancadas, numa altura em que era ele, já há muito tempo, o único atleta em prova, estremeceu, entre atónita e assombrada, quando viu todo o corpo do jovem sueco dobrar-se imaculadamente por cima da altura maior. Até que um cotovelo decidiu arrepender-se e, apenas com um subtil toque, fez despenhar a fasquia, desta sorte, adiando o inevitável mito. Mas todos quantos tiveram o privilégio de testemunhar o sucedido ficaram possuídos da inabalável certeza sobre a identidade daquele que os deuses tinham em mente quando escolheram a palavra Citius (mais alto) como um dos três caminhos para chegar ao Olimpo.
Vítor Ferreira
Por coincidência, que neste caso talvez mereça a presunção de bom augúrio, ao mesmo tempo que, em Dusseldorf, Armand Duplantis dava por finda a sua mostra de magia, em Viseu começava a apresentação pública do recital interpretado por um rapaz ainda mais jovem que o sueco. Em miúdo era chamado por Vitinha, mas agora que se estreou entre os crescidos vai ser conhecido por Vítor Ferreira. Temos então que este miúdo, filho de um antigo futebolista, se estreou a titular dos dragões precisamente nesta última terça-feira venturosa. Não sou oráculo para adivinhar o futuro, nem empresário para vender o presente, mas julgo saber de História o suficiente para comparar passados. Por isso arrisco dizer que faria todo o sentido que, por mérito próprio dele, em benefício da equipa e para alegria do povo portista, o clássico de sábado contasse com o jovem maestro em campo desde o primeiro minuto. Como um verdadeiro joker. Tão imprevisível quão certeiro na geometria do seu jogo, Vítor Ferreira ousa combinar uma precisão de ourives com a exactidão de um mestre-relojoeiro. Em suma: nem sei explicar bem porquê, mas algo me diz que este rapaz, que não é amuleto nem mágico, se for escolhido por Sérgio Conceição como titular contra o Benfica, como creio, será o porta-estandarte anunciador de novos tempos de glória e prosperidade para o Dragão.