E se corre mal?
Há pelo menos meio ano que estava prevista a venda de Matheus, tempo suficiente para uma alternativa já estar a trabalhar com o plantel
A pergunta foi feita por Rúben Amorim a 5 de março de 2020, dia em que tendo a antiga Porta 10A como pano de fundo foi apresentado treinador do Sporting, all in de Frederico Varandas após duas apostas falhadas para comandar a equipa de futebol. Tudo ou nada de uma administração contestada, porque até então nunca reunira a simpatia da massa adepta leonina, heranças do passado e, convenhamos, devido a muitos tiros nos pés por falta de visão, estratégia e de rumo para o futebol - o verão de 2019 é claro exemplo de como não proceder no defeso e na pré-temporada: um mercado falhado, contratações à última hora de pré-reformados e até de um lesionado que veio a Portugal tratar das maleitas e voltou à procedência sem um minuto jogado na equipa principal.
«E se corre bem»? Amorim apresentou-se para mudar o paradigma em Alvalade. O mundo entretanto parou, o treinador começou uma pré-época ainda com o que restava de temporada para jogar, promoveu jovens e devolveu à origem quem só esperava pelo cheque ao fim do mês enquanto gozava um ano de aposentadoria precoce. Implementou aí os alicerces do título da época seguinte, com pilares robustos edificados num verão em que contratou cirurgicamente dentro das possibilidades do clube. E correu muito bem.
Passaram mais de dois anos sobre o dia 5 de março de 2020. Um novo Sporting, sem dúvida, reside em Alvalade. O treinador tem muitos créditos junto da massa leonina e a administração conquistou - por mérito próprio a partir da cartada Amorim - a paz que precisava para exercícios fundamentais de gestão - ainda agora resolveu a questão das VMOC, que no futuro lhe ia bater à porta neste segundo mandato. O leão, que usou o símbolo de campeão na camisola, viveu momentos de paz como há muito não tinha memória e chegou ao final de uma época em que não renovou o título (mas com dois troféus conquistados) não apenas sem sobressaltos, mas com uma administração elogiada, interna e externamente, por ter a próxima época preparada a tempo e horas: o dossiê do central destro há tanto tempo reclamado começou a ser trabalhado ainda em 2021 e chegou St. Juste; Morita foi oportunidade reservada logo em março; Trincão pedido logo satisfeito; Rochinha foi questão de atenção redobrada ao que acontecia por outras paragens. A antítese do verão de 2019 (ou pelo menos assim parecia). E até as saídas estavam estipuladas no plano €100 milhões que A BOLA revelou em abril: vender os passes de Palhinha e de Matheus Nunes por e juntar-lhes o dinheiro já garantido da Champions. Na mouche. O que não se percebe é que se Palhinha tinha substituto natural no plantel e não tendo Matheus Nunes alternativa, esteja agora o Sporting em processo de recrutamento, já com o vento a fechar a janela de transferências… Sim, Matheus terá demorado mais do que previsto a dizer o adeus - e nem coloco em causa o facto de ter sido antes do clássico, porque o mercado não espera, porque 40 milhões não são 40 cêntimos e 400 mil euros de ordenado anual não são dois milhões e meio… -, mas há pelo menos meio ano que a saída do motor da equipa estava programada - e desejada pelo ministro das finanças do Sporting. Tempo mais do que suficiente para já ter o alvo definido, contratado até - e até a lesão de Daniel Bragança deveria ter sido tomada em conta para acelerar um processo que já devia estar concluído.
E num ápice, a pergunta que muitos sportinguistas passaram a fazer é outra vez a que faziam antes de Amorim: e se corre mal? Se corre mal - e já correu o clássico, ainda que bem vistas as coisas tenha o leão, a espaços, conseguido dar um ar da sua graça - é a administração que mais tem a perder: porque Amorim vai poder argumentar que lhe faltaram os trunfos (pelo menos a tempo e horas). E na arte da comunicação é o treinador quem dá cartas e não Varandas…