E lá perdemos para a Taça...
Depois de ter desistido de entender as altas considerações feitas pelas elevadas personalidades do país, estou a deixar de entender as feitas pelos adeptos
O mundo, e Portugal em particular, nunca foge aos mitos do seu tempo. Sejam os que forem - da existência de duendes e bruxas, à casualidade matemática de tudo o que nos ocorre na vida (se morre muita gente de um vírus, a culpa há de ser de alguém, por exemplo), os mitos, o pensamento mais ou menos mágico, está sempre presente. Por muito, que nunca ninguém visse uma bruxa a voar na sua vassoura, um elfo ou um duende; ou por muito que se saiba que ao longo da História existiram centenas de pandemias que mataram milhões de seres humanos (quando a população do mundo era muito menor), o bicho homem acredita mais nas suas crenças do que na realidade.
Isto parece nada ter a ver com o futebol, mas deixem-me explicar de que forma relaciono as coisas. Há exatamente oito dias, descrevendo o calendário deste mês terrível para o Sporting (e não só, convenhamos), escrevi: «Não quero com isto dizer que não possamos perder; essa hipótese existe sempre, em todos e quaisquer jogos.» Esta parece-me a visão racional. Curiosamente, quando vejo fóruns sportinguistas, põe-se a questão de saber se a culpa de termos perdido 0-2 contra o Marítimo, e assim afastados precocemente e uma vez mais da Taça de Portugal, é do treinador, dos jogadores ou do excesso de esforço no jogo, quatro dias antes contra o Nacional. 700 metros acima do Estádio dos Barreiros, jogámos num lamaçal onde só a raça e a alma nos levou a ganhar, também por 2-0. O FC Porto ainda anteontem se viu e desejou para lhe ganhar (para Taça) apenas o conseguindo no prolongamento…
A culpa é algo que hoje se torna indispensável. Ou foi a Liga que nos obrigou a aterrar na Madeira quando o tempo era instável e, apesar de ter adiado um dia o jogo, porque o campo estava impraticável, permitiu que depois de uma partida que, em boa verdade, nem deveria ter existido com tais condições de terreno, houvesse outra, três dias depois, apesar das deficientes condições de treino; se não foi a Liga, foi Rúben Amorim que arriscou de mais ao colocar em campo uma equipa totalmente remodelada. É óbvio que os adeptos em Lisboa ou em qualquer lugar do país, sabem melhor do que o treinador, e melhor do que os próprios jogadores, as condições físicas em que se encontravam, depois do lamaçal. Por isso é fácil dizer que Rúben arriscou de mais. Porém, se Tiago Tomás tem chutado um centímetro mais abaixo, fazendo a bola entrar, em vez de bater com estrondo na barra, estaríamos aqui a celebrar a argúcia do técnico. Por último, há quem considere que a culpa é dos próprios jogadores, como se Tomás fizesse pontaria à trave…
O nosso veneno
O que pretendo dizer é que há coisas que não têm necessariamente culpados; coisas que, inesperadamente, acontecem. Temo-las visto por toda a Europa e também em Portugal. O Sporting que costuma ser (e espera-se que continue) eficaz, não foi eficaz. Contra o SC Braga, com quem tínhamos jogado na jornada anterior, precisámos de duas oportunidades claras para marcar dois golos. O Marítimo teve a mesma ventura contra nós; o primeiro, deve-se ao facto de um mau passe de Neto, e de Feddal ter escorregado (pareceu-me), a possibilidade da abertura para Rodrigo Pinho fazer o 1-0 para o Marítimo, aos 68 minutos. Repare-se como os defesas envolvidos têm sido titulares indiscutíveis, e como também não se deve ao experiente Max (que tem sido suplente) qualquer responsabilidade no golo.
Um dia haveríamos de perder, e foi nesta segunda-feira. Não há equipas que nunca percam, nem as melhores do mundo… Ou melhor, pode haver na PlayStation e, mesmo assim, quando se joga com níveis de dificuldade baixa. O que me interessa mais é o facto de o Sporting ter entrado bem no jogo e poder ter resolvido a questão na primeira parte. Claro que as substituições surgiram tarde, e claro que o Marítimo sabe defender - aliás, é como joga, na defesa com saídas rápidas. Ainda poderíamos ter reduzido depois do 0-2, mas tudo saiu mal. Espécie de lei de Murphy. O segundo golo do Marítimo, aliás, espelha esse balanceamento atacante do Sporting, que o treinador tentou aumentar quando colocou Coates a ponta de lança, sabendo do seu talento para cabecear.
Não tendo uma boa exibição, nem o mínimo de felicidade necessária, o Sporting pode queixar-se apenas do excesso de expectativas que criara, desde o jogo de má memória com o LASK. Nunca perdera… mas perdeu. É escusado culpar a Liga, o treinador, os jogadores. É, pelo contrário, preciso dar a resposta frente ao Rio Ave, equipa de valia semelhante ao Marítimo, já amanhã, na 14ª Jornada da Liga, não esquecendo que os dois rivais maiores (FC Porto e Benfica) entram em campo depois do apito final do nosso encontro, espero que a sete pontos do líder… No fim, ainda podemos dar graças por essa derrota que surgiria, mais cedo ou mais tarde, ter ocorrido na Taça. Mantém intactas as nossas pretensões na Liga. E eu, que não sou fanático, nem exijo o que sei não poder ser dado, apenas digo que as nossas pretensões, para continuarmos ainda com melhores resultados, são entrarmos na Champions.
A deputada Cláudia
N ÃO falei da arbitragem do Marítimo, porque na realidade não teve influência direta no resultado, mas poderia falar da minudência com que o árbitro apita. Apita, apita, apita, tudo é falta; tudo! No entanto, no discutido lance em que Neto teria jogado a bola com o braço sobre a linha da grande área, sendo portanto penálti, não viu a falta de Tagueu sobre Plata. É assim, quem demasiado apita, não acerta, e ficam estas más impressões acerca de Manuel Oliveira, que tendo nome de cineasta, não realizou bem a coisa.
Mas se também não culpo o árbitro, permito-me falar da deputada Cláudia Santos, ou melhor, da presidente do Conselho de Disciplina da Federação, Cláudia Santos. Sim, é a mesma Cláudia, que teve a devida autorização do Parlamento para acumular o seu lugar na bancada do PS com o de presidente do CD. O problema não está apenas na promiscuidade futebol/política que deveria ser evitada, tanto de um lado como do outro; o problema, e aqui confesso que me impactou o que ontem escreveu António Oliveira, é também a Dr.ª Cláudia ser de um benfiquismo à prova de bala. Talvez por isso, o organismo a que preside tenha instaurado processos a Rúben Amorim e a Sérgio Conceição. Tenho de concluir que o escrúpulo deste CD e desta senhora é grande, porque ainda não vi nada de grave da parte destes treinadores; ao mesmo tempo que compreendo que, por exemplo, Jorge Jesus é um exemplo de sobriedade que deve, por todos, ser seguido.
Há coisas que não se explicam, comecei por escrever. Mas outras explicam-se facilmente.
Paços de Ferreira
A equipa da chamada capital do móvel chegou a um lugar europeu, atrás do SC Braga, mas com a ameaça de o V. Guimarães passar à frente, quando realizar o jogo em atraso que tem. De qualquer modo, saliente-se a carreira já com sete ou mais pontos de avanço sobre aqueles que seriam os mais diretos competidores.
Confinamento
Agora que voltamos ao confinamento apertado, ainda bem que o futebol vai continuar. Na verdade, o esforço e o prejuízo que têm aguentado as SAD e os clubes já é gigantesco; se não jogassem, seria a ruína. Em França, já se corre o risco de não haver quem transmita pela televisão o campeonato gaulês (informava ontem o Le Figaro). Congratulemo-nos que, por cá, ao menos na televisão, possamos continuar a ver futebol.
Despedimentos
Não é difícil acreditar que os clubes e as SAD se vejam obrigados a reduzir custos fixos. Mas quando se chega ao ponto de ter de haver despedimentos, o pior é não levar em conta o que cada trabalhador deu, e o que o clube lhe deve. Olhar apenas para um folha de Excel, não é próprio de instituições onde alguns funcionários são adeptos e trabalhadores incansáveis, fantásticos, sempre disponíveis. Espero que os responsáveis do Sporting o saibam.