I. A maioria conhece a regra, mas nunca é demais repeti-la: os árbitros não devem aplicar a vantagem em lances passíveis de pontapé de penálti. Mas essa recomendação não anula a possibilidade de tentarem fazer um compasso de espera para verem o desfecho do lance. Uma espécie de retardar da decisão, como se o braço estivesse pesado e demorasse algum tempo a levar o apito à boca. Esse delay é sugerido porque, às vezes, acontece um golo imediatamente a seguir à infração do defesa. E assinalar um castigo máximo quando a bola entrou ou está na iminência de entrar na baliza do infrator é mau para todos. É mau para o jogo, é mau para a equipa lesada, é mau para o jogador que marcou e é mau para o próprio árbitro, que percebe que foi infeliz no tempo de intervenção. A questão é que, lá dentro, no calor do jogo e perante lance tão determinante, é muito difícil conter esse impulso, o de querer fazer justiça com celeridade. Ou seja, não é fácil evitar a decisão quando há a perceção clara (ainda que errada) que um defesa comete falta sobre um atacante na sua área. Não se trata de arranjar desculpas ou explicações. É mesmo assim. É aliás quase certo que a maioria dos árbitros mais experientes, aqueles que têm muitos jogos no currículo, já passaram por essa desagrável experiência.Este esclarecimento surge na sequência do lance da jornada passada, entre Rúben Fernandes e Debast (Gil Vicente-Sporting CP).Como se recordarão, o árbitro da partida assinalou erradamente um pontapé de penálti, na presunção que o capitão dos visitados tinha derrubado o adversário, de forma irregular. Confesso que, à primeira vista, fiquei exatamente com a mesma impressão. Quando apitou, André Narciso não percebeu que Francisco Trincão tinha ficado de posse de bola e com clara possibilidade de marcar para o Sporting. A boa vontade em tomar a decisão correta o mais rapidamente possível retirou-lhe o nervo necessário para aguentar só mais um bocadinho. Não se pode falar em erro, apenas em precipitação.Há algo que importa sublinhar a este propósito: assim que o árbitro de Setúbal assinalou o penálti, vários jogadores do Gil Vicente pararam e desfocaram do seguimento do lance (em particular Gbane e Andrew, ambos na zona de ação). A bola entrou sim, mas sem qualquer esboço de reação da equipa defensora. É muito provável que, mesmo assim, a bola entrasse. Só não é certo nem garantido que isso acontecesse. Na verdade, não houve golo anulado, porque o árbitro parou o jogo antes.Mas estes pormenores não anulam o essencial da jogada que aqui se pretende demonstrar: Debast ganhou o lance a Mutombo sem cometer carga sobre o costa-marfinense; Rúben Fernandes não derrubou o belga na sua área; e o árbitro não esteve bem ao apitar de imediato. De resto, mérito adicional para o VAR, por ter cumprido muito bem o seu papel.II. No mesmo jogo e em momento menos mediático, bola rematada por um jogador da equipa da casa bateu nas costas do árbitro e saiu diretamente pela linha de baliza do adversário. A este propósito, convém aqui recordar que, quando a bola toca/desvia em algum elemento da equipa de arbitragem (que esteja dentro das quatro linhas) só deve haver lançamento de bola ao solo em três situações: quando, depois desse contacto, há golo numa das balizas; quando, depois desse contacto, é iniciado um ataque prometedor; e quando, depois desse contacto, a equipa que detinha a posse de bola perde-a para os opositores. Em todas as outras situações — nomeadamente nesta, em que a bola saiu do terreno de jogo —, a partida deve recomeçar em conformidade. Neste caso, com pontapé de baliza para o Sporting.A todos os meus amigos um Santo e Feliz Natal. Boas Festas com muita saúde, amor e alegria.