Depois do turbilhão do mercado, temos equipa!

OPINIÃO02.09.202107:00

O Sporting preservou o essencial e, como se previa, não conseguiu segurar o que era previsto. No meio de toda a agitação, ainda pode ter uma agradável surpresa

L AMENTO imenso, e peço desculpa, por não começar pela seleção e o seu jogo contra a Irlanda. Na verdade, tudo o que está aqui escrito foi-o antes da partida que, por razões pessoais muito fundamentadas, nem sequer vi. Naturalmente, o meu desejo é o mesmo de todos os portugueses, acrescido ainda da esperança de que Ronaldo tenha batido o célebre recorde. Mas, como se diz, o que tem de ser tem muita força e eu, por força maior, nada posso dizer sobre o que é, em si, mais importante: a vitória (espero) da seleção.
Não podendo começar por Portugal, começo pelo Sporting Clube de Portugal, o campeão nacional de várias modalidades, incluindo de futebol sénior, feito que lhe escapava há 19 anos. Temos, os sportinguistas, fundadas esperanças de poder repetir a proeza, pelo que um dos nossos grandes receios era a equipa desfazer-se neste período de mercado aberto, que infelizmente perdura para lá do começo dos principais campeonatos. Esse receio ficou finalmente posto de lado. Passada toda a confusão, os nomes que iam e vinham, ficamos a saber que, de importante, há a saída de Nuno Mendes e a entrada de Sarabia. Em condições diferentes, claro, porque  o jovem lateral foi vendido (num esquema que o PSG já utilizou noutros casos, como o de Danilo, com o Porto), ao passo que o internacional espanhol vem por empréstimo, sendo um extremo consagrado com um valor de mercado que ronda os 25 milhões de euros. É, assim, o jogador mais valioso que chega nesta janela de transferências à nossa Liga.
Os três grandes foram, aliás todos eles muito cautelosos. No cômputo da época (isto é, contando com aqueles que chegaram antes do campeonato começar), o Benfica vendeu mais de 50 milhões, para o que contribuíram sobretudo Pedrinho, Waldschimdt, Nuno Tavares e Cervi; e comprou metade, ‘apenas’ 26 milhões; só Yaremchuk correspondeu a 17 milhões com mais seis de Meité e uns trocos. Lazaro e Radonjic chegaram por empréstimo.
O Sporting vendeu 18 milhões e gastou 12. Mesmo assim, um saldo positivo. Os gastos foram com Esgaio e Ugarte; Sarabia, Vinagre e Virginia são emprestados. Nas vendas, Rosier e Max foram as mais significativas. Claro que isto é contando com os sete milhões de Nuno Mendes, que são pagos agora. Se a estes juntarmos o valor total do jovem lateral, chegamos a números extraordinários no saldo sportinguista (a rondar os 40 milhões).
Já o Porto foi o mais discreto, ficando, aliás, com saldo negativo. Pepê custou 15 milhões, Wendell quatro e no total foram uns bons milhões gastos. As vendas são, sobretudo a entrada do dinheiro correspondente à compra de Danilo pelo PSG.
Como se via pelas equipas prováveis que ontem A Bola avançou, as alterações não são substanciais. E foi o Sporting aquele que melhores resultados terá conseguido.
 

O LUGAR DE SARABIA

NO que diz respeito ao Sporting, temos a alegria de manter intacta a defesa, que tem dado muitas garantias (uma palavra especial para Adán, pelas suas exibições, e outra para Rúben Amorim, por as reconhecer sem dificuldade). Maior alegria, porém, não desfazendo, mas porque parecia improvável, na manutenção de Matheus Nunes, definitivamente português, e de  João Palhinha, que começa a ser um marcador. Pedro Gonçalves, o ‘Pote’, é outra grande manutenção, assim como Pedro Porro.
Rúben Vinagre, que vai quase certamente ocupar o lugar cativo de Nuno Mendes foi uma excelente contratação, logo no início da época, assim como Ricardo Esgaio. Ambos laterais, sendo que Esgaio pode também jogar na esquerda sem dificuldade, são mais-valias seguras.
Restam Nuno Santos e Jovane, dois jogadores com características diferentes, mas ambos com enorme entrega. Serão, porventura, os mais sacrificados como titulares com a entrada de Sarabia. Este internacional espanhol, que é sobretudo extremo direito, pode jogar atrás do ponta-de-lança ou como extremo-esquerdo, onde costuma alinhar ‘Pote’ e também Tabata. Ou seja, Sarabia pode, em teoria, entrar em qualquer lugar do ataque. Quem sabe se mesmo no de Paulino e de Tiago Tomás. Os seus dotes no PSG não puderam ser mostrados, porque jogou dois jogos como suplente na Liga, e um como titular e dois como suplente da Taça de França. Ainda assim, nos 21 minutos que jogou na Liga, marcou um golo; assim como marcou outro na Taça de França. Porém, na seleção espanhola, onde jogou mais no Europeu (253 minutos, dois dos jogos como suplente), marcou dois golos e fez uma assistência. Na equipa nacional de Espanha alinhou sempre no lado direito, pelo que é normal que possa retirar o lugar à dupla Jovane/Nuno Santos, que se iam revezando nos últimos tempos.
Para o meu gosto pessoal (e não tendo de pagar, nem assumir compromissos; não sabendo mesmo que nomes contratar), tendo sido esta uma ‘boa jogada’ do Sporting, faltam-me ainda dois lugares, como já escrevi na semana passada: um defesa central experiente, para não ficarmos apenas com Neto como recurso nessa frente; e um ‘stricker’, um goleador, um daqueles que de pouco precisa para fazer golo. Talvez Rúben Amorim entenda que esse é Paulinho, e talvez seja. Mas não tem sido, e ainda no último jogo o vimos. Tiago Tomás tem muito querer, mas ainda é muito novo para que não cometa os naturais, quase fatais, erros de juventude.


O PROVÉRBIO CHINÊS

NO meio de toda esta agitação, convém não esquecer que perdemos os primeiros pontos deste campeonato no - o termo será infalível? - terreno do Famalicão. Tal como no ano passado, há qualquer coisa naquela equipa que impede o Sporting de lhe ganhar. Concretamente, no último sábado - e como numa ironia própria da ficção, o golo deles foi marcado na própria baliza por Nuno Mendes, iam decorridos 68 minutos. É irónico, porque o lateral, a maior venda do Sporting de há anos, o talentoso Nuno Mendes, involuntariamente cortou um corte para dentro da baliza. Felizmente, Palhinha, que parece ter descoberto a fórmula para marcar golos, empatou o jogo aos 82 minutos, porque de resto, a coisa foi para esquecer.
Da exibição, só mesmo Adán fica isento de culpas, tendo impedido que o Sporting dali saísse com uma derrota humilhante, tal foi o caudal ofensivo que o Famalicão conseguiu. É certo que do lado sportinguista também houve azar: uma bola de Nuno Santos à trave foi o expoente da falta de sorte, mas manda a verdade dizer que o Famalicão não escandalizava se ganhasse.
A meio da partida pensei que aquele Sporting parecia a equipa antes de Rúben ter chegado e mudado o ‘chip’ do conjunto. A defesa parecia relativamente apática; o meio campo não conseguia transpor em condições para o ataque, nem pressionar o adversário com mérito nas suas avançadas. O ataque mostrou um Paulinho a desperdiçar, e não é a primeira vez; um ‘Pote’ que parecia perdido, apesar de uns bons apontamentos aqui e ali (um deles foi pena não ser golo) e um Jovane que pareceu mais desinspirado do que nos jogos anteriores, em que vinha a fazer belas exibições. Curiosamente, a entrada de Nuno Santos para o seu lugar, e depois a aposta arriscada de retirar Feddal e colocar Tiago Tomás, bem como de fazer mexidas no meio-campo e nas faixas, deu novo ímpeto ao Sporting que terminou o jogo melhor do que começou.
Agora, vai o Benfica com avanço de dois pontos, e nós defrontaremos, em Alvalade, o Porto, que está em igualdade pontual connosco. Resta-nos, assim, citar Diogo Faro que no Expresso inventou um provérbio chinês: “Não ganhar em Famalicão, é sinónimo de Sporting campeão”. E, para não ser triunfalista, cito a sua prudência acerca do provérbio - às vezes está certo, outras não.
 

JOGAR FORA

Ronaldo — Fiquei muito contente com o regresso de Ronaldo ao United. Sou como os fãs daquele clube, custava-me vê-lo no City, e até no PSG. A propósito de provérbios chineses, há um que diz que não se deve voltar aos locais onde fomos felizes. Talvez tenham razão, mas o facto de Ronaldo ser lúcido ao ponto de saber que o dinheiro não é tudo; que se tem de trabalhar onde gostam (e não só precisam) de nós, deixa-me feliz e esperançoso que ele cumpra, com o nível a que nos habituou, o contrato até 2023. E que aos 38 anos ainda possa jogar noutro clube que gosta muito dele.

Perder valor — Não sei se não seria um acréscimo no fair-play limitar o número de jogadores que cada equipa pode ter. E limitar, como já foi proposto por pessoas que sabem mais do que eu, os salários dos jogadores. Há aspetos ridículos, e de uma ineficácia total, no mundo do futebol. Jogadores que perdem valor ou salários impossíveis de pagar na maioria dos países e clubes.